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Ruído de aeronaves representa uma ameaça à saúde do coração

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A exposição a altos níveis de ruído de aeronaves, especialmente à noite, está associada à remodelação cardíaca adversa na forma de hipertrofia1 concêntrica do ventrículo esquerdo (VE) e redução da função sistólica do VE, levando a um risco aumentado de eventos cardiovasculares adversos maiores, de acordo com um novo estudo publicado no JACC.

Pesquisadores analisaram dados de ressonância magnética2 cardiovascular de 3.635 participantes do UK Biobank sem dificuldades auditivas autodeclaradas, residentes próximos a quatro grandes aeroportos no Reino Unido. Os níveis de ruído de aeronaves noturnos (N-noite) e os níveis ponderados de ruído de aeronaves durante 24 horas (dia-tarde-noite) (N-dtn) foram fornecidos pela Autoridade de Aviação Civil do Reino Unido e utilizados com modelos lineares generalizados para investigar as associações entre a exposição ao ruído e as métricas de ressonância magnética2 cardiovascular. As ressonâncias magnéticas foram realizadas pelo menos três anos após as estimativas de ruído de aeronaves nas vizinhanças dos participantes.

Dos mais de 3.000 participantes da coorte3 primária, 3% experimentaram níveis mais altos de ruído de aeronaves à noite e 8% foram expostos a níveis de ruído mais altos ao longo do dia. Os resultados do estudo mostraram que os participantes expostos a níveis mais altos de ruído noturno (N-noite) apresentaram massa do ventrículo esquerdo (VE) 7% maior e paredes do VE 4% mais espessas, com uma relação normal entre a espessura do septo e da parede lateral. Além disso, aqueles expostos a níveis mais altos de ruído noturno apresentaram pior dinâmica miocárdica do VE.

Leia sobre "Doenças cardiovasculares4" e "Protetores auditivos - quando usar".

“Nosso estudo é observacional, portanto, não podemos afirmar com certeza que altos níveis de ruído de aeronaves causaram essas diferenças na estrutura e função cardíacas”, disse a autora sênior5 Gabriella Captur, MD. “No entanto, nossas descobertas contribuem para um crescente conjunto de evidências de que o ruído de aeronaves pode afetar negativamente a saúde6 do coração7 e nossa saúde6 de forma mais geral. São necessários esforços conjuntos do governo e da indústria para reduzir nossa exposição ao ruído de aeronaves e mitigar8 seu impacto na saúde6 de milhões de pessoas que vivem perto de aeroportos ou sob rotas de voo.”

De acordo com Captur e seus colegas, as descobertas do estudo foram mais claras para o nível de ruído noturno (N-noite), mas foram amplamente semelhantes nas análises que utilizaram o nível de ruído de 24h (N-dtn). Além disso, o IMC9 e a hipertensão10 pareceram mediar de 10% a 50% das associações observadas.

Uma possível explicação do mecanismo seria que a poluição sonora causada pelo tráfego aéreo pode aumentar o risco cardiovascular devido ao estresse crônico11 que induz. O ruído constante ativa o sistema nervoso12 simpático13, elevando os níveis de cortisol e adrenalina14, o que resulta em aumento da pressão e da frequência cardíaca. Esses efeitos, associados a quadros de insônia, gerados pelo barulho constante, aumentam consideravelmente a chance do indivíduo desenvolver doenças graves.

“Outros fatores que podem ser desencadeados pela resposta ao estresse causado pelo ruído de aeronaves incluem distúrbios do sono, inflamação15 e aterosclerose”, afirmou o autor Cristian Topriceanu, MD.

Em uma subcoorte separada de 21.360 pessoas do UK Biobank, pesquisadores concluíram que os tipos de anormalidades cardíacas observadas no estudo podem resultar em um aumento de duas a quatro vezes no risco de um evento cardíaco grave, como ataque cardíaco, arritmias16 cardíacas com risco de vida ou acidente vascular cerebral17, em comparação com indivíduos que vivem fora de áreas com altos níveis de ruído.

Comentando o estudo, Thomas Münzel, MD, Marin Kuntic, PhD, e outros autores escreveram que “altos decibéis significam maiores riscos, uma fórmula simples para as consequências cardiovasculares do ruído de aeronaves”. De acordo com Münzel e seus colegas, as descobertas “enfatizam a necessidade de implementação imediata de políticas de redução de ruído para proteger a todos e, em particular, as populações vulneráveis dos efeitos nocivos da exposição crônica ao ruído de aeronaves.”

No artigo publicado, os pesquisadores descrevem como a maior exposição ao ruído de aeronaves está associada a pior estrutura e função cardíaca, conforme demonstrado por ressonância magnética2 cardiovascular.

Eles relatam que o ruído de aeronaves é uma preocupação crescente para as comunidades que vivem perto de aeroportos. Neste contexto, o estudo teve como objetivo explorar o impacto do ruído de aeronaves na estrutura e função cardíacas.

Os níveis de ruído de aeronaves noturnos (N-noite) e os níveis ponderados de ruído de aeronaves em 24 horas (dia-tarde-noite) (N-dtn) foram fornecidos pela Autoridade de Aviação Civil do Reino Unido para 2011. Os dados de saúde6 foram obtidos de participantes do UK Biobank (UKB) que residem perto de 4 grandes aeroportos do Reino Unido (Londres Heathrow, Londres Gatwick, Manchester e Birmingham) e que realizaram ressonância magnética2 cardiovascular (RMC) a partir de 2014, relatando não apresentar dificuldades auditivas.

Modelos lineares generalizados investigaram as associações entre a exposição ao ruído de aeronaves e as métricas de RMC (derivadas usando uma rede neural convolucional validada para garantir segmentações de imagem consistentes), após ajuste para fatores de confusão demográficos, socioeconômicos, de estilo de vida e ambientais. A mediação por fatores de risco cardiovascular também foi explorada.

Associações subsequentes entre métricas de RMC e eventos cardíacos adversos maiores (ECAM) foram testadas em uma subcoorte prospectiva separada do UKB (n = 21.360), para entender o potencial impacto clínico de qualquer remodelamento cardíaco associado ao ruído.

Dos 3.635 participantes do UKB incluídos, 3% experimentaram N-noite mais altos (≥45 dB) e 8% N-dtn mais altos (≥50 dB). Os participantes expostos a N-noite mais altos apresentaram massa ventricular esquerda (VE) 7% maior (IC 95%: 4%-10%) e paredes do VE 4% mais espessas (IC 95%: 2%-5%), com uma relação normal entre a espessura da parede septal e lateral.

Esse remodelamento concêntrico do VE é relevante porque uma massa do VE 7% maior está associada a um risco 32% maior de ECAM.

Os participantes também apresentaram pior dinâmica miocárdica do VE (por exemplo, uma deformação circunferencial global 8% [IC 95%: 4%-12%] menor, que está associada a um risco 27% maior de ECAM).

No geral, um indivíduo hipotético que apresenta as anormalidades típicas de RMC associadas a uma maior exposição a N-noite pode ter um risco 4 vezes maior de eventos cardiovasculares adversos maiores.

Os resultados foram mais claros para N-noite, mas foram amplamente semelhantes nas análises que utilizaram N-dtn. O índice de massa corporal18 e a hipertensão10 pareceram mediar de 10% a 50% das associações observadas.

Os participantes que não mudaram de residência durante o acompanhamento e que foram continuamente expostos a níveis mais altos de ruído de aeronaves apresentaram o pior fenótipo19 de RMC.

O estudo concluiu que a maior exposição ao ruído de aeronaves está associada à remodelação adversa do VE, potencialmente devido ao ruído aumentar o risco de obesidade20 e hipertensão10. Os resultados são consistentes com a literatura existente sobre ruído de aeronaves e doenças cardiovasculares4 e precisam ser considerados pelos formuladores de políticas e pela indústria da aviação.

Veja também sobre "Estresse", "Inflamação15" e "Tipos de insônia".

 

Fontes:
JACC, Vol. 85, N° 5, em janeiro de 2025.
American College of Cardiology, notícia publicada em 09 de janeiro de 2025.

 

NEWS.MED.BR, 2025. Ruído de aeronaves representa uma ameaça à saúde do coração. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1497075/ruido-de-aeronaves-representa-uma-ameaca-a-saude-do-coracao.htm>. Acesso em: 10 nov. 2025.

Complementos

1 Hipertrofia: 1. Desenvolvimento ou crescimento excessivo de um órgão ou de parte dele devido a um aumento do tamanho de suas células constituintes. 2. Desenvolvimento ou crescimento excessivo, em tamanho ou em complexidade (de alguma coisa). 3. Em medicina, é aumento do tamanho (mas não da quantidade) de células que compõem um tecido. Pode ser acompanhada pelo aumento do tamanho do órgão do qual faz parte.
2 Ressonância magnética: Exame que fornece imagens em alta definição dos órgãos internos do corpo através da utilização de um campo magnético.
3 Coorte: Grupo de indivíduos que têm algo em comum ao serem reunidos e que são observados por um determinado período de tempo para que se possa avaliar o que ocorre com eles. É importante que todos os indivíduos sejam observados por todo o período de seguimento, já que informações de uma coorte incompleta podem distorcer o verdadeiro estado das coisas. Por outro lado, o período de tempo em que os indivíduos serão observados deve ser significativo na história natural da doença em questão, para que haja tempo suficiente do risco se manifestar.
4 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
5 Sênior: 1. Que é o mais velho. 2. Diz-se de desportistas que já ganharam primeiros prêmios: um piloto sênior. 3. Diz-se de profissionais experientes que já exercem, há algum tempo, determinada atividade.
6 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
7 Coração: Órgão muscular, oco, que mantém a circulação sangüínea.
8 Mitigar: Tornar mais brando, mais suave, menos intenso (geralmente referindo-se à dor ou ao sofrimento); aliviar, suavizar, aplacar.
9 IMC: Medida usada para avaliar se uma pessoa está abaixo do peso, com peso normal, com sobrepeso ou obesa. É a medida mais usada na prática para saber se você é considerado obeso ou não. Também conhecido como IMC. É calculado dividindo-se o peso corporal em quilogramas pelo quadrado da altura em metros. Existe uma tabela da Organização Mundial de Saúde que classifica as medidas de acordo com o resultado encontrado.
10 Hipertensão: Condição presente quando o sangue flui através dos vasos com força maior que a normal. Também chamada de pressão alta. Hipertensão pode causar esforço cardíaco, dano aos vasos sangüíneos e aumento do risco de um ataque cardíaco, derrame ou acidente vascular cerebral, além de problemas renais e morte.
11 Crônico: Descreve algo que existe por longo período de tempo. O oposto de agudo.
12 Sistema nervoso: O sistema nervoso é dividido em sistema nervoso central (SNC) e o sistema nervoso periférico (SNP). O SNC é formado pelo encéfalo e pela medula espinhal e a porção periférica está constituída pelos nervos cranianos e espinhais, pelos gânglios e pelas terminações nervosas.
13 Simpático: 1. Relativo à simpatia. 2. Que agrada aos sentidos; aprazível, atraente. 3. Em fisiologia, diz-se da parte do sistema nervoso vegetativo que põe o corpo em estado de alerta e o prepara para a ação.
14 Adrenalina: 1. Hormônio secretado pela medula das glândulas suprarrenais. Atua no mecanismo da elevação da pressão sanguínea, é importante na produção de respostas fisiológicas rápidas do organismo aos estímulos externos. Usualmente utilizado como estimulante cardíaco, como vasoconstritor nas hemorragias da pele, para prolongar os efeitos de anestésicos locais e como relaxante muscular na asma brônquica. 2. No sentido informal significa disposição física, emocional e mental na realização de tarefas, projetos, etc. Energia, força, vigor.
15 Inflamação: Conjunto de processos que se desenvolvem em um tecido em resposta a uma agressão externa. Incluem fenômenos vasculares como vasodilatação, edema, desencadeamento da resposta imunológica, ativação do sistema de coagulação, etc.Quando se produz em um tecido superficial (pele, tecido celular subcutâneo) pode apresentar tumefação, aumento da temperatura local, coloração avermelhada e dor (tétrade de Celso, o cientista que primeiro descreveu as características clínicas da inflamação).
16 Arritmias: Arritmia cardíaca é o nome dado a diversas perturbações que alteram a frequência ou o ritmo dos batimentos cardíacos.
17 Acidente vascular cerebral: Conhecido popularmente como derrame cerebral, o acidente vascular cerebral (AVC) ou encefálico é uma doença que consiste na interrupção súbita do suprimento de sangue com oxigênio e nutrientes para o cérebro, lesando células nervosas, o que pode resultar em graves conseqüências, como inabilidade para falar ou mover partes do corpo. Há dois tipos de derrame, o isquêmico e o hemorrágico.
18 Índice de massa corporal: Medida usada para avaliar se uma pessoa está abaixo do peso, com peso normal, com sobrepeso ou obesa. É a medida mais usada na prática para saber se você é considerado obeso ou não. Também conhecido como IMC. É calculado dividindo-se o peso corporal em quilogramas pelo quadrado da altura em metros. Existe uma tabela da Organização Mundial de Saúde que classifica as medidas de acordo com o resultado encontrado.
19 Fenótipo: Características apresentadas por um indivíduo sejam elas morfológicas, fisiológicas ou comportamentais. Também fazem parte do fenótipo as características microscópicas e de natureza bioquímica, que necessitam de testes especiais para a sua identificação, como, por exemplo, o tipo sanguíneo do indivíduo.
20 Obesidade: Condição em que há acúmulo de gorduras no organismo além do normal, mais severo que o sobrepeso. O índice de massa corporal é igual ou maior que 30.

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