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Nova ferramenta de inteligência artificial diagnostica tumores cerebrais na mesa de cirurgia

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Um novo estudo, publicado na revista Nature, descreve um método para diagnósticos mais rápidos e precisos, que pode ajudar os cirurgiões a decidir com que agressividade operar.

Quando seus bisturis atingem a borda de um tumor1 cerebral, os cirurgiões se deparam com uma decisão angustiante: cortar algum tecido2 cerebral saudável para garantir que todo o tumor1 seja removido, ou dar um amplo espaço ao tecido2 saudável e correr o risco de deixar algumas das células3 ameaçadoras para trás.

Agora, cientistas na Holanda relatam o uso de inteligência artificial para munir os cirurgiões com conhecimentos sobre o tumor1, que podem ajudá-los a fazer essa escolha.

O método envolve um computador escaneando segmentos do DNA de um tumor1 e descobrindo certas modificações químicas que podem produzir um diagnóstico4 detalhado do tipo e até mesmo do subtipo do tumor1 cerebral.

Esse diagnóstico4, gerado durante os estágios iniciais de uma cirurgia de horas de duração, pode ajudar os cirurgiões a decidir quão agressivamente operar, disseram os pesquisadores. No futuro, o método também poderá ajudar a orientar os médicos em direção a tratamentos adaptados para um subtipo específico de tumor1.

“É imperativo que o subtipo do tumor1 seja conhecido no momento da cirurgia”, disse Jeroen de Ridder, professor associado do Centro de Medicina Molecular do UMC Utrecht, um hospital holandês, que ajudou a liderar o estudo. “O que agora possibilitamos de forma única é permitir que esse diagnóstico4 muito refinado, robusto e detalhado seja realizado já durante a cirurgia.”

Seu sistema de aprendizagem profunda (deep learning), chamado Sturgeon, foi testado pela primeira vez em amostras congeladas de tumores de operações anteriores de câncer5 no cérebro6. Ele diagnosticou com precisão 45 dos 50 casos, 40 minutos após o início do sequenciamento genético. Nos outros cinco casos, absteve-se de oferecer um diagnóstico4 porque a informação não era clara.

O sistema foi então testado durante 25 cirurgias cerebrais ao vivo, a maioria delas em crianças, juntamente com o método padrão de exame de amostras de tumores ao microscópio. A nova abordagem forneceu 18 diagnósticos corretos e não conseguiu atingir o limiar de confiança necessário nos outros sete casos. O diagnóstico4 foi oferecido em menos de 90 minutos, informou o estudo – tempo suficiente para informar decisões durante uma operação.

Atualmente, além de examinar amostras de tumores cerebrais ao microscópio, os médicos podem enviá-las para um sequenciamento genético mais completo.

Mas nem todos os hospitais têm acesso a essa tecnologia. E mesmo para aqueles que o fazem, pode levar várias semanas para receber os resultados, disse o Dr. Alan Cohen, diretor da Divisão de Neurocirurgia Pediátrica da Johns Hopkins e especialista em câncer5.

“Temos que iniciar o tratamento sem saber o que estamos tratando”, disse Cohen.

Saiba mais sobre "Tumores cerebrais", "Genética - conceitos básicos" e "Exame genético".

O novo método utiliza uma técnica de sequenciamento genético mais rápida e aplica-a apenas a uma pequena fatia do genoma celular, permitindo retornar resultados antes que o cirurgião comece a operar nas bordas de um tumor1.

De Ridder disse que o modelo era poderoso o suficiente para fornecer um diagnóstico4 com dados genéticos esparsos, semelhante a alguém que reconhece uma imagem com base em apenas um por cento de seus pixels e a partir de uma parte desconhecida da imagem.

“Ele pode descobrir por si mesmo o que está observando e fazer uma classificação robusta”, disse o Dr. de Ridder, que também é investigador principal do Oncode Institute, um centro de pesquisa do câncer5 na Holanda.

Mas alguns tumores ainda são difíceis de diagnosticar. As amostras colhidas durante a cirurgia têm aproximadamente o tamanho de um grão de milho e, se incluírem algum tecido2 cerebral saudável, o sistema de aprendizagem profunda pode ter dificuldade em identificar marcadores específicos do tumor1 suficientes.

No estudo, os médicos lidaram com isso pedindo aos patologistas que examinavam amostras ao microscópio para assinalarem aquelas com mais tumor1 para sequenciação, disse Marc Pagès-Gallego, bioinformático da UMC Utrecht e co-autor do estudo.

Também pode haver diferenças nas células3 tumorais de um único paciente, o que significa que o pequeno segmento sequenciado pode não ser representativo de todo o tumor1. Alguns tumores menos comuns podem não corresponder àqueles que foram previamente classificados. E alguns tipos de tumores são mais fáceis de classificar do que outros.

Outros centros médicos já começaram a aplicar o novo método em amostras cirúrgicas, disseram os autores do estudo, sugerindo que ele pode funcionar nas mãos7 de outras pessoas.

Mas o Dr. Sebastian Brandner, professor de neuropatologia da University College London, disse que o sequenciamento e a classificação de células3 tumorais muitas vezes ainda exigem experiência significativa em bioinformática, bem como trabalhadores capazes de operar, solucionar problemas e reparar a tecnologia.

“A implementação em si é menos simples do que muitas vezes se sugere”, disse ele.

Os tumores cerebrais também são os mais adequados para serem classificados pelas modificações químicas que o novo método analisa; nem todos os cânceres podem ser diagnosticados dessa forma.

O novo método faz parte de um amplo movimento que visa trazer precisão molecular ao diagnóstico4 de tumores, permitindo potencialmente aos cientistas desenvolver tratamentos direcionados que sejam menos prejudiciais ao sistema nervoso8. Mas traduzir um conhecimento mais profundo dos tumores em novas terapias revelou-se difícil.

“Obtivemos alguns ganhos”, disse Cohen, “mas não tantos no tratamento como na compreensão do perfil molecular dos tumores”.

Confira a seguir o resumo do estudo.

Classificação ultrarrápida de tumores do SNC9 com aprendizagem profunda durante a cirurgia

Os tumores do sistema nervoso central10 representam um dos tipos de câncer5 mais letais, principalmente em crianças. O tratamento primário inclui a ressecção neurocirúrgica do tumor1, na qual deve ser alcançado um delicado equilíbrio entre maximizar a extensão da ressecção e minimizar o risco de danos neurológicos e comorbidades11. No entanto, os cirurgiões têm conhecimento limitado do tipo preciso de tumor1 antes da cirurgia.

A prática padrão atual depende de imagens pré-operatórias e análises histológicas12 intraoperatórias, mas estas nem sempre são conclusivas e ocasionalmente erradas. Usando o sequenciamento rápido de nanoporos, um perfil de metilação esparso pode ser obtido durante a cirurgia.

Neste estudo, desenvolveu-se o Sturgeon, uma rede neural agnóstica do paciente de aprendizado por transferência, para permitir a subclassificação molecular de tumores do sistema nervoso central10 com base em tais perfis esparsos.

O Sturgeon entregou um diagnóstico4 preciso dentro de 40 minutos após o início do sequenciamento em 45 das 50 amostras sequenciadas retrospectivamente (abstendo-se do diagnóstico4 das outras 5 amostras).

Além disso, demonstrou-se sua aplicabilidade em tempo real durante 25 cirurgias, alcançando um tempo de resposta diagnóstica inferior a 90 minutos. Destas respostas, 18 (72%) diagnósticos estavam corretos e 7 não atingiram o limite de confiança exigido.

Concluiu-se que o diagnóstico4 por aprendizado de máquina baseado em sequenciamento intraoperatório de baixo custo pode auxiliar na tomada de decisões neurocirúrgicas, potencialmente prevenindo comorbidades11 neurológicas e evitando cirurgias adicionais.

Leia sobre "Glioma", "Meduloblastoma" e "Astrocitoma".

 

Fontes:
Nature, publicação em 11 de outubro de 2023.
The New York Times, notícia publicada em 11 de outubro de 2023.

 

NEWS.MED.BR, 2023. Nova ferramenta de inteligência artificial diagnostica tumores cerebrais na mesa de cirurgia. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1460755/nova-ferramenta-de-inteligencia-artificial-diagnostica-tumores-cerebrais-na-mesa-de-cirurgia.htm>. Acesso em: 27 abr. 2024.

Complementos

1 Tumor: Termo que literalmente significa massa ou formação de tecido. É utilizado em geral para referir-se a uma formação neoplásica.
2 Tecido: Conjunto de células de características semelhantes, organizadas em estruturas complexas para cumprir uma determinada função. Exemplo de tecido: o tecido ósseo encontra-se formado por osteócitos dispostos em uma matriz mineral para cumprir funções de sustentação.
3 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
4 Diagnóstico: Determinação de uma doença a partir dos seus sinais e sintomas.
5 Câncer: Crescimento anormal de um tecido celular capaz de invadir outros órgãos localmente ou à distância (metástases).
6 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
7 Mãos: Articulação entre os ossos do metacarpo e as falanges.
8 Sistema nervoso: O sistema nervoso é dividido em sistema nervoso central (SNC) e o sistema nervoso periférico (SNP). O SNC é formado pelo encéfalo e pela medula espinhal e a porção periférica está constituída pelos nervos cranianos e espinhais, pelos gânglios e pelas terminações nervosas.
9 SNC: Principais órgãos processadores de informação do sistema nervoso, compreendendo cérebro, medula espinhal e meninges.
10 Sistema Nervoso Central: Principais órgãos processadores de informação do sistema nervoso, compreendendo cérebro, medula espinhal e meninges.
11 Comorbidades: Coexistência de transtornos ou doenças.
12 Histológicas: Relativo à histologia, ou seja, relativo à disciplina biomédica que estuda a estrutura microscópica, composição e função dos tecidos vivos.
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