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Cirurgia de bypass gástrico pode reduzir o risco de câncer de intestino

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Uma forma comum de cirurgia para perda de peso pode reduzir o risco de câncer1 colorretal ao alterar o local de entrada dos ácidos biliares no intestino delgado2 e consequentemente os níveis dessas moléculas no sangue3 e no intestino. As descobertas, que foram publicadas na revista Science Translational Medicine, podem levar a novos tratamentos para o câncer1 de intestino.

A cirurgia de bypass gástrico envolve o grampeamento do estômago4 para formar uma pequena bolsa superior e uma bolsa inferior maior. O intestino delgado2 é então conectado à bolsa superior, de modo que os alimentos e os sucos digestivos não passam pela parte maior do estômago4 e pelo início do intestino delgado2. Após a cirurgia, as pessoas geralmente se sentem saciadas mais rapidamente e perdem peso.

Saiba mais sobre "Cirurgia bariátrica5 - o que é" e "Câncer1 Colorretal".

Estudos anteriores também relacionaram o procedimento a um risco reduzido de câncer1 colorretal, mas não estava claro o porquê. Para descobrir, Rebecca Kesselring, da Universidade de Freiburg, na Alemanha, e seus colegas alimentaram camundongos com uma dieta rica em gordura6 até que eles ganhassem cerca de 50% do seu peso corporal inicial, em média. Em seguida, eles submeteram um terço dos camundongos à cirurgia de bypass gástrico, enquanto o restante foi submetido a uma cirurgia simulada que não reorganizou seus órgãos digestivos.

Com o objetivo de isolar o efeito da cirurgia de bypass gástrico do efeito da perda de peso, a equipe submeteu o grupo que passou pela cirurgia de bypass gástrico e metade dos camundongos restantes a uma dieta que os fez perder cerca de um quinto do peso, em média, ao longo de seis semanas.

Os pesquisadores então implantaram células7 de câncer1 colorretal no cólon8 dos camundongos. Após outras seis semanas, eles descobriram que os tumores de cólon8 no grupo submetido à cirurgia de bypass gástrico eram dois terços menores do que os dos camundongos que continuaram ganhando peso ou dos camundongos que perderam peso apenas com dieta.

Além disso, os tumores se espalharam para o fígado9 em apenas um camundongo em cada 20 no grupo submetido à cirurgia de bypass gástrico, enquanto isso ocorreu na maioria dos animais nos grupos simulados.

“Como ambos os grupos simulados tinham níveis tumorais semelhantes, mas pesos diferentes, a perda de peso em si não foi responsável pela redução do risco de câncer1 – havia algo mais na cirurgia de bypass”, diz Kesselring.

A equipe se perguntou se alterações nos ácidos biliares, uma mistura de moléculas que digerem gorduras, poderiam ser responsáveis. Geralmente, eles são produzidos pelo fígado9 e passam pela vesícula biliar10, estômago4 e intestino delgado2 antes de retornar ao fígado9 pelo sangue3.

“Com a cirurgia de bypass gástrico, os ácidos biliares são introduzidos posteriormente no intestino delgado”, diz Kesselring. Isso significa que eles podem encontrar uma mistura diferente de bactérias intestinais, que alteram quimicamente as moléculas.

Os camundongos submetidos à cirurgia de bypass gástrico apresentaram níveis reduzidos de alguns ácidos biliares, chamados ácidos biliares primários, no cólon8 e no sangue3, em comparação com os camundongos dos grupos simulados.

Para testar se as alterações nos ácidos biliares realmente alteravam o risco de câncer1, a equipe submeteu outro grupo de camundongos ao mesmo experimento, mas, em vez da cirurgia de bypass gástrico, esses camundongos foram submetidos a uma operação que simplesmente desviou seus ácidos biliares para uma parte posterior do intestino delgado2, sem alterar o estômago4.

Crucialmente, a equipe descobriu que isso reduziu os níveis de ácidos biliares primários no sangue3 e reduziu o tamanho e a disseminação de tumores colorretais nesses camundongos com a mesma eficácia da cirurgia de bypass gástrico. Isso foi corroborado por outro experimento, no qual a equipe descobriu que os ácidos biliares primários estimulam o crescimento de células7 de câncer1 colorretal em uma placa11 de laboratório.

As descobertas sugerem que os ácidos biliares primários podem ser alvos terapêuticos promissores para ajudar a tratar o câncer1. “Talvez possamos descobrir algum medicamento oral que reduza esses ácidos biliares, que possamos administrar a pessoas com câncer1, para simular alguns desses efeitos benéficos da cirurgia de bypass gástrico”, diz Vance Albaugh, da Universidade Estadual da Louisiana, EUA.

Leia sobre "Tipos de cirurgia bariátrica5", "Prevenção do câncer1" e "Microbioma12 intestinal humano".

No artigo publicado, os pesquisadores descrevem como a cirurgia metabólica reduz a progressão da doença no câncer1 colorretal (CCR) por meio do desvio de ácido biliar circulante.

Eles relatam que a obesidade13 é uma epidemia global caracterizada por desequilíbrio energético, distúrbios metabólicos e desenvolvimento de massa gorda14 que afetam significativamente o estado de saúde15 dos indivíduos. Há evidências de que a ingestão de uma dieta rica em gordura6 e o sobrepeso16 estão associados à incidência17 de câncer1 colorretal (CCR).

A cirurgia metabólica tem sido associada a melhorias nas comorbidades18 relacionadas à obesidade13 e à redução do risco geral de câncer1. No entanto, o mecanismo subjacente pelo qual a cirurgia metabólica reduz o risco de CCR permanece desconhecido.

Para compreender o mecanismo antitumoral da cirurgia bariátrica5, analisou-se o desenvolvimento de CCR após a cirurgia de bypass gástrico em Y de Roux (BGYR) em um modelo murino de CCR-BGYR.

Neste estudo, mostrou-se que a cirurgia de BGYR reduziu substancialmente a tumorigênese primária e preveniu metástases19, e que esse efeito protetor contra o câncer1 estava associado ao desvio de ácido biliar (AB), e não a alterações nas células7 imunes, no microbioma12 ou na perda de peso em si.

Os achados apontam que o efeito protetor foi mediado pela exclusão do AB do intestino delgado2 proximal20, levando ao desvio do AB nas partes precedentes do trato gastrointestinal e na circulação21. O perfil de AB desviado em camundongos com BGYR apresentou efeitos antitumorais e antimetastáticos, que foram verificados pela exclusão de AB do intestino delgado2 proximal20 sem as instalações metabólicas sistêmicas da cirurgia de BGYR, por meio de uma cirurgia de desvio colecisto-intestinal.

A cirurgia de BGYR, portanto, leva à redução de AB primários e ao aumento de AB secundários na circulação21. Em um estudo translacional envolvendo pacientes com CCR com metástases19 hepáticas22 metacrônicas, confirmou-se que concentrações reduzidas de AB primário no soro23 estavam associadas a um tempo prolongado até a metástase24, ressaltando o papel crítico dos AB na progressão do CCR e no desenvolvimento metastático.

Resta saber agora quais espécies específicas de ácidos biliares protegem contra o CCR, se esse mecanismo se aplica a outras formas de cirurgia bariátrica5 e se esse conhecimento pode ser traduzido em novas terapias.

 

Fontes:
Science Translational Medicine, Vol 17, N° 804, em 25 de junho de 2025.
New Scientist, notícia publicada em 25 de junho de 2025.

 

NEWS.MED.BR, 2025. Cirurgia de bypass gástrico pode reduzir o risco de câncer de intestino. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1492485/cirurgia-de-bypass-gastrico-pode-reduzir-o-risco-de-cancer-de-intestino.htm>. Acesso em: 31 jul. 2025.

Complementos

1 Câncer: Crescimento anormal de um tecido celular capaz de invadir outros órgãos localmente ou à distância (metástases).
2 Intestino delgado: O intestino delgado é constituído por três partes: duodeno, jejuno e íleo. A partir do intestino delgado, o bolo alimentar é transformado em um líquido pastoso chamado quimo. Com os movimentos desta porção do intestino e com a ação dos sucos pancreático e intestinal, o quimo é transformado em quilo, que é o produto final da digestão. Depois do alimento estar transformado em quilo, os produtos úteis para o nosso organismo são absorvidos pelas vilosidades intestinais, passando para os vasos sanguíneos.
3 Sangue: O sangue é uma substância líquida que circula pelas artérias e veias do organismo. Em um adulto sadio, cerca de 45% do volume de seu sangue é composto por células (a maioria glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). O sangue é vermelho brilhante, quando oxigenado nos pulmões (nos alvéolos pulmonares). Ele adquire uma tonalidade mais azulada, quando perde seu oxigênio, através das veias e dos pequenos vasos denominados capilares.
4 Estômago: Órgão da digestão, localizado no quadrante superior esquerdo do abdome, entre o final do ESÔFAGO e o início do DUODENO.
5 Cirurgia Bariátrica:
6 Gordura: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Os alimentos que fornecem gordura são: manteiga, margarina, óleos, nozes, carnes vermelhas, peixes, frango e alguns derivados do leite. O excesso de calorias é estocado no organismo na forma de gordura, fornecendo uma reserva de energia ao organismo.
7 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
8 Cólon:
9 Fígado: Órgão que transforma alimento em energia, remove álcool e toxinas do sangue e fabrica bile. A bile, produzida pelo fígado, é importante na digestão, especialmente das gorduras. Após secretada pelas células hepáticas ela é recolhida por canalículos progressivamente maiores que a levam para dois canais que se juntam na saída do fígado e a conduzem intermitentemente até o duodeno, que é a primeira porção do intestino delgado. Com esse canal biliar comum, chamado ducto hepático, comunica-se a vesícula biliar através de um canal sinuoso, chamado ducto cístico. Quando recebe esse canal de drenagem da vesícula biliar, o canal hepático comum muda de nome para colédoco. Este, ao entrar na parede do duodeno, tem um músculo circular, designado esfíncter de Oddi, que controla o seu esvaziamento para o intestino.
10 Vesícula Biliar: Reservatório para armazenar secreção da BILE. Através do DUCTO CÍSTICO, a vesícula libera para o DUODENO ácidos biliares em alta concentração (e de maneira controlada), que degradam os lipídeos da dieta.
11 Placa: 1. Lesão achatada, semelhante à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
12 Microbioma: Comunidade ecológica de microrganismos comensais, simbióticos e patogênicos que compartilham nosso espaço corporal. Microbioma humano é o conjunto de microrganismos que reside no corpo do Homo sapiens, mantendo uma relação simbiótica com o hospedeiro. O conceito vai além do termo microbiota, incluindo também a relação entre as células microbianas e as células e sistemas humanos, por meio de seus genomas, transcriptomas, proteomas e metabolomas.
13 Obesidade: Condição em que há acúmulo de gorduras no organismo além do normal, mais severo que o sobrepeso. O índice de massa corporal é igual ou maior que 30.
14 Massa gorda: É a porção de massa do organismo constituída de gordura armazenada (encontrada no tecido subcutâneo) e gordura essencial (encontrada nas vísceras, responsável pelo funcionamento fisiológico normal). A massa gorda é o resultado em quilos do percentual de gordura existente no organismo. Por exemplo, um indivíduo de 100 quilos e com percentual de gordura de 38%, pode ter o valor da massa gorda calculado em 38 quilos.
15 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
16 Sobrepeso: Peso acima do normal, índice de massa corporal entre 25 e 29,9.
17 Incidência: Medida da freqüência em que uma doença ocorre. Número de casos novos de uma doença em um certo grupo de pessoas por um certo período de tempo.
18 Comorbidades: Coexistência de transtornos ou doenças.
19 Metástases: Formação de tecido tumoral, localizada em um lugar distante do sítio de origem. Por exemplo, pode se formar uma metástase no cérebro originário de um câncer no pulmão. Sua gravidade depende da localização e da resposta ao tratamento instaurado.
20 Proximal: 1. Que se localiza próximo do centro, do ponto de origem ou do ponto de união. 2. Em anatomia geral, significa o mais próximo do tronco (no caso dos membros) ou do ponto de origem (no caso de vasos e nervos). Ou também o que fica voltado para a cabeça (diz-se de qualquer formação). 3. Em botânica, o que fica próximo ao ponto de origem ou à base. 4. Em odontologia, é o mais próximo do ponto médio do arco dental.
21 Circulação: 1. Ato ou efeito de circular. 2. Facilidade de se mover usando as vias de comunicação; giro, curso, trânsito. 3. Movimento do sangue, fluxo de sangue através dos vasos sanguíneos do corpo e do coração.
22 Hepáticas: Relativas a ou que forma, constitui ou faz parte do fígado.
23 Soro: Chama-se assim qualquer líquido de características cristalinas e incolor.
24 Metástase: Formação de tecido tumoral, localizada em um lugar distante do sítio de origem. Por exemplo, pode se formar uma metástase no cérebro originário de um câncer no pulmão. Sua gravidade depende da localização e da resposta ao tratamento instaurado.
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