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Uma causa comum e tratável de ataques cardíacos está sendo negligenciada

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Os médicos estão no meio de uma grande reconsideração sobre as causas de ataques cardíacos e acidentes vasculares1 cerebrais – que estão entre as causas mais comuns de morte em todo o mundo.

Nova pesquisa, publicada no The Lancet, sugere que a inflamação2 pode ser tão importante quanto o colesterol3 como causa de ataques cardíacos, sugerindo que diferentes tratamentos devem ser considerados para prevenção.

Durante décadas, grande parte do foco tem sido o colesterol3: as estatinas, usadas para reduzir o colesterol3, são os medicamentos mais comumente prescritos para prevenir doenças cardiovasculares4 no Reino Unido. Mas um número crescente de pesquisadores diz que isso ignora outro fator importante: a inflamação2, que está ligada à atividade em segundo plano do sistema imunológico5.

Agora, a nova pesquisa mostrou que, em pessoas que tomam estatinas para reduzir o colesterol3, a inflamação2 é um fator de risco6 maior para ataques cardíacos ou AVCs do que se ainda tiverem níveis elevados de colesterol3. “Está claro que, se você não começar a lidar com a resposta inflamatória, nunca vencerá essa doença”, diz Paul Ridker, do Brigham and Women's Hospital, em Boston, que participou da pesquisa. “Não é mais uma hipótese; é um fato comprovado.”

A ideia de atacar o colesterol3 para tratar doenças cardiovasculares4 é principalmente o resultado de grandes estudos que descobriram que níveis mais altos de “colesterol ruim” se correlacionam com taxas mais altas de ataques cardíacos.

A outra pista era que o colesterol3 é um dos principais componentes das placas7 de gordura8 que podem se formar nas paredes das artérias9 e restringir o fluxo sanguíneo para os principais órgãos. Ataques cardíacos e AVCs geralmente acontecem porque essa placa10 se rompe, o que pode resultar no bloqueio de vasos sanguíneos11 menores a jusante12.

Uma vez que isso foi compreendido, as estatinas para baixar o colesterol3 se tornaram um dos medicamentos mais comuns em uso. Mais de 200 milhões de pessoas em todo o mundo estão tomando uma estatina – seja porque sobreviveram a um ataque cardíaco ou AVC ou porque correm o risco de ter um. Muitos grandes estudos descobriram que as estatinas são muito eficazes na redução de ataques cardíacos, reforçando a teoria do colesterol3 nas doenças cardíacas.

Então, onde entra a inflamação2? A ideia revisada é que essas placas7 não são apenas bloqueios inertes, mas estão vivas com a atividade das células13 imunológicas. Estudos em animais mostraram que as placas7 mais inflamadas têm maior probabilidade de estourar e lançar fragmentos14 mortais na corrente sanguínea. E evidências recentes sugerem que as estatinas podem funcionar atenuando a inflamação2 bem como diminuindo o colesterol3.

Apesar da crescente evidência da importância da inflamação2, até agora isso não se traduziu em novas formas de prevenir ou tratar doenças cardiovasculares4. Mas isso pode estar prestes a mudar.

Leia sobre "Doenças cardiovasculares4", "O que é inflamação2" e "Entendendo o colesterol3 do organismo".

Na nova pesquisa, a equipe de Ridker analisou dados de três grandes estudos, cada um testando uma terapia diferente destinada a reduzir ataques cardíacos e AVCs em pessoas que tomavam estatinas.

Os resultados dessas terapias não são o que é relevante aqui. No início dos testes, o sangue15 dos participantes foi submetido a uma bateria de testes, inclusive para colesterol3 e um composto que é uma marca registrada da inflamação2, chamada proteína C-reativa (PCR16).

Todos os três estudos descobriram que a PCR16 alta estava ligada a mais mortes por doenças cardiovasculares4 do que o colesterol3 alto. As pessoas no quartil de participantes com a maior PCR16 tiveram um risco 268% maior do que aquelas no quartil com a menor PCR16. Em comparação, ter colesterol3 alto aumentou o risco apenas em 27%.

Saber que a inflamação2 faz parte do processo da doença é de pouca utilidade, a menos que possamos fazer algo a respeito. Mas nos últimos anos, vários medicamentos projetados para fazer exatamente isso foram testados.

Um dos mais promissores é um composto derivado de plantas chamado colchicina, que já é usado para atenuar a inflamação2 em pessoas com gota17. Dois estudos randomizados recentes mostraram que a colchicina também reduz os AVCs e ataques cardíacos em cerca de 30%, uma quantidade semelhante às estatinas.

A colchicina não é licenciada para prevenir doenças cardiovasculares4 a não ser no Canadá, embora em 2021 tenha sido considerada uma opção nas diretrizes da Sociedade Europeia de Cardiologia. Se fosse recomendada por um órgão semelhante no Reino Unido, os médicos poderiam prescrevê-la “off-label”, diz Nilesh Samani, da Universidade de Leicester, Reino Unido, que não participou do estudo mais recente.

Uma ressalva é que as pessoas que tiveram um ataque cardíaco ou AVC podem já estar tomando muitos comprimidos, e quanto mais medicamentos alguém toma, maior a probabilidade de interagirem entre si e causarem efeitos indesejados – sem mencionar a inconveniência de vários medicamentos.

No entanto, há cada vez mais evidências de que, para prevenir doenças cardíacas e AVCs, os médicos precisam dar a mesma importância ao combate à inflamação2 e ao colesterol3. “Não é um ou outro – são os dois”, diz Jean-Claude Tardif, do Montreal Heart Institute, no Canadá, que esteve envolvido em um dos testes com colchicina.

“Muitas vezes na ciência, é uma série de etapas incrementais que eventualmente levam a uma mudança radical. Este artigo trouxe isso à tona.”

No artigo os pesquisadores investigaram a inflamação2 e o colesterol3 como preditores de eventos cardiovasculares em pacientes recebendo terapia com estatina.

Eles contextualizam que a inflamação2 e a hiperlipidemia18 contribuem conjuntamente para a doença aterotrombótica. No entanto, quando as pessoas são tratadas com terapia intensiva19 com estatina, as contribuições relativas da inflamação2 e da hiperlipidemia18 para o risco de eventos cardiovasculares futuros podem mudar, o que tem implicações na escolha da terapêutica20 cardiovascular adjuvante.

O objetivo do estudo, portanto, foi avaliar a importância relativa da proteína C-reativa (PCR16) de alta sensibilidade e do colesterol3 de lipoproteína de baixa densidade (C-LDL21) como determinantes de risco para eventos cardiovasculares adversos maiores, morte cardiovascular e morte por todas as causas entre pacientes recebendo estatinas.

Foi feita uma análise colaborativa de pacientes com – ou com alto risco de – doença aterosclerótica, que estavam recebendo estatinas contemporâneas e eram participantes dos ensaios multinacionais PROMINENT, REDUCE-IT ou STRENGTH.

Quartis de aumento da PCR16 de alta sensibilidade basal (um biomarcador de risco inflamatório residual) e de aumento do C-LDL21 basal (um biomarcador de risco de colesterol3 residual) foram avaliados como preditores de futuros eventos cardiovasculares adversos maiores, morte cardiovascular e morte por todas as causas.

As razões de risco (HRs) para eventos cardiovasculares e mortes foram calculadas em quartis de PCR16 de alta sensibilidade e C-LDL21 em análises ajustadas para idade, sexo, IMC22, tabagismo, pressão arterial23, história prévia de doença cardiovascular e atribuição randomizada de grupo de tratamento.

31.245 pacientes foram incluídos na análise dos estudos PROMINENT (n = 9.988), REDUCE-IT (n = 8.179) e STRENGTH (n = 13.078). Os intervalos observados para PCR16 de alta sensibilidade e C-LDL21 na linha de base, e as relações de cada biomarcador com as taxas de eventos cardiovasculares subsequentes, foram quase idênticos nos três ensaios.

O risco inflamatório residual foi significativamente associado a eventos cardiovasculares adversos maiores incidentes24 (maior quartil de PCR16 de alta sensibilidade versus menor quartil de PCR16 de alta sensibilidade, HR ajustada 1,31, IC 95% 1,20-1,43; p <0,0001), mortalidade25 cardiovascular (2,68, 2,22-3,23; p <0,0001) e mortalidade25 por todas as causas (2,42, 2,12-2,77; p <0,0001).

Por outro lado, a relação de risco de colesterol3 residual foi neutra para eventos cardiovasculares adversos maiores (maior quartil de C-LDL21 vs menor quartil de C-LDL21, HR ajustada 1,07, IC 95% 0,98-1,17; p = 0,11) e de baixa magnitude para morte cardiovascular (1,27, 1,07-1,50; p = 0,0086) e morte por todas as causas (1,16, 1,03-1,32; p = 0,025).

O estudo concluiu que, entre os pacientes que receberam estatinas contemporâneas, a inflamação2 avaliada pela PCR16 de alta sensibilidade foi um preditor mais forte de risco de eventos cardiovasculares futuros e morte do que o colesterol3 avaliado pelo C-LDL21.

Esses dados têm implicações para a seleção de tratamentos adjuvantes além da terapia com estatina e sugerem que o uso combinado de terapias agressivas de redução de lipídios e inibição da inflamação2 pode ser necessário para reduzir ainda mais o risco aterosclerótico.

Veja também sobre "Proteína C reativa", "Como reduzir os níveis de LDL colesterol26" e "Estatinas: prós e contras".

 

Fontes:
The Lancet, publicação em 06 de março de 2023.
New Scientist, notícia publicada em 09 de março de 2023.

 

NEWS.MED.BR, 2023. Uma causa comum e tratável de ataques cardíacos está sendo negligenciada. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1435335/uma-causa-comum-e-tratavel-de-ataques-cardiacos-esta-sendo-negligenciada.htm>. Acesso em: 14 nov. 2024.

Complementos

1 Vasculares: Relativo aos vasos sanguíneos do organismo.
2 Inflamação: Conjunto de processos que se desenvolvem em um tecido em resposta a uma agressão externa. Incluem fenômenos vasculares como vasodilatação, edema, desencadeamento da resposta imunológica, ativação do sistema de coagulação, etc.Quando se produz em um tecido superficial (pele, tecido celular subcutâneo) pode apresentar tumefação, aumento da temperatura local, coloração avermelhada e dor (tétrade de Celso, o cientista que primeiro descreveu as características clínicas da inflamação).
3 Colesterol: Tipo de gordura produzida pelo fígado e encontrada no sangue, músculos, fígado e outros tecidos. O colesterol é usado pelo corpo para a produção de hormônios esteróides (testosterona, estrógeno, cortisol e progesterona). O excesso de colesterol pode causar depósito de gordura nos vasos sangüíneos. Seus componentes são: HDL-Colesterol: tem efeito protetor para as artérias, é considerado o bom colesterol. LDL-Colesterol: relacionado às doenças cardiovasculares, é o mau colesterol. VLDL-Colesterol: representa os triglicérides (um quinto destes).
4 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
5 Sistema imunológico: Sistema de defesa do organismo contra infecções e outros ataques de micro-organismos que enfraquecem o nosso corpo.
6 Fator de risco: Qualquer coisa que aumente a chance de uma pessoa desenvolver uma doença.
7 Placas: 1. Lesões achatadas, semelhantes à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
8 Gordura: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Os alimentos que fornecem gordura são: manteiga, margarina, óleos, nozes, carnes vermelhas, peixes, frango e alguns derivados do leite. O excesso de calorias é estocado no organismo na forma de gordura, fornecendo uma reserva de energia ao organismo.
9 Artérias: Os vasos que transportam sangue para fora do coração.
10 Placa: 1. Lesão achatada, semelhante à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
11 Vasos Sanguíneos: Qualquer vaso tubular que transporta o sangue (artérias, arteríolas, capilares, vênulas e veias).
12 Jusante: 1. Vazante da maré; baixa-mar. 2. O sentido da correnteza em um curso de água (da nascente para a foz). Em medicina, é usado para se referir ao sentido do fluxo sanguíneo normal.
13 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
14 Fragmentos: 1. Pedaço de coisa que se quebrou, cortou, rasgou etc. É parte de um todo; fração. 2. No sentido figurado, é o resto de uma obra literária ou artística cuja maior parte se perdeu ou foi destruída. Ou um trecho extraído de uma obra.
15 Sangue: O sangue é uma substância líquida que circula pelas artérias e veias do organismo. Em um adulto sadio, cerca de 45% do volume de seu sangue é composto por células (a maioria glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). O sangue é vermelho brilhante, quando oxigenado nos pulmões (nos alvéolos pulmonares). Ele adquire uma tonalidade mais azulada, quando perde seu oxigênio, através das veias e dos pequenos vasos denominados capilares.
16 PCR: Reação em cadeia da polimerase (em inglês Polymerase Chain Reaction - PCR) é um método de amplificação de DNA (ácido desoxirribonucleico).
17 Gota: 1. Distúrbio metabólico produzido pelo aumento na concentração de ácido úrico no sangue. Manifesta-se pela formação de cálculos renais, inflamação articular e depósito de cristais de ácido úrico no tecido celular subcutâneo. A inflamação articular é muito dolorosa e ataca em crises. 2. Pingo de qualquer líquido.
18 Hiperlipidemia: Condição em que os níveis de gorduras e colesterol estão mais altos que o normal.
19 Terapia intensiva: Tratamento para diabetes no qual os níveis de glicose são mantidos o mais próximo do normal possível através de injeções freqüentes ou uso de bomba de insulina, planejamento das refeições, ajuste em medicamentos hipoglicemiantes e exercícios baseados nos resultados de testes de glicose além de contatos freqüentes entre o diabético e o profissional de saúde.
20 Terapêutica: Terapia, tratamento de doentes.
21 LDL: Lipoproteína de baixa densidade, encarregada de transportar colesterol através do sangue. Devido à sua tendência em depositar o colesterol nas paredes arteriais e a produzir aterosclerose, tem sido denominada “mau colesterol“.
22 IMC: Medida usada para avaliar se uma pessoa está abaixo do peso, com peso normal, com sobrepeso ou obesa. É a medida mais usada na prática para saber se você é considerado obeso ou não. Também conhecido como IMC. É calculado dividindo-se o peso corporal em quilogramas pelo quadrado da altura em metros. Existe uma tabela da Organização Mundial de Saúde que classifica as medidas de acordo com o resultado encontrado.
23 Pressão arterial: A relação que define a pressão arterial é o produto do fluxo sanguíneo pela resistência. Considerando-se a circulação como um todo, o fluxo total é denominado débito cardíaco, enquanto a resistência é denominada de resistência vascular periférica total.
24 Incidentes: 1. Que incide, que sobrevém ou que tem caráter secundário; incidental. 2. Acontecimento imprevisível que modifica o desenrolar normal de uma ação. 3. Dificuldade passageira que não modifica o desenrolar de uma operação, de uma linha de conduta.
25 Mortalidade: A taxa de mortalidade ou coeficiente de mortalidade é um dado demográfico do número de óbitos, geralmente para cada mil habitantes em uma dada região, em um determinado período de tempo.
26 LDL colesterol: Do inglês low-density lipoprotein cholesterol, colesterol de baixa densidade ou colesterol ruim.
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