Gostou do artigo? Compartilhe!

"Drogas da inteligência", ou smart drugs, não tornam as pessoas melhores em um teste de resolução de problemas

A+ A- Alterar tamanho da letra
Avalie esta notícia

Algumas pessoas tentam obter um impulso mental tomando medicamentos desenvolvidos para tratar o TDAH ou para combater os distúrbios do sono, mesmo que não tenham essas condições. Mas isso pode não ser uma jogada tão inteligente, já que as drogas pioraram o desempenho de pessoas que não tinham essas condições em uma tarefa complexa de resolução de problemas. Os achados são de um estudo publicado na revista Science Advances.

Os medicamentos envolvidos incluem dois estimulantes: metilfenidato, frequentemente vendido sob a marca Ritalina, e dextroanfetamina. Ambos são frequentemente prescritos para melhorar a concentração e a atenção em pessoas com TDAH. Acredita-se que eles funcionem aumentando os níveis da dopamina1, uma substância química do cérebro2, já que os sistemas de sinalização de dopamina1 podem não funcionar tão bem em pessoas com TDAH.

Outro medicamento, chamado modafinil, é usado para ajudar pessoas com fadiga3 excessiva causada pela narcolepsia. O modafinil também aumenta a sinalização de dopamina1.

Leia sobre "Concentração mental - o que pode melhorar a sua concentração".

O uso desses medicamentos por pessoas sem essas condições vem crescendo nas faculdades e nos locais de trabalho, na hora de estudar para uma prova ou perto de um prazo. As pessoas podem comprá-los como “drogas da inteligência” ou “drogas inteligentes” online ou daqueles que foram prescritos legitimamente. “É realmente comum entre os alunos das faculdades dos Estados Unidos”, diz Peter Bossaerts, da Universidade de Cambridge.

Estudos anteriores mostraram que, quando pessoas sem TDAH tomam estimulantes como esses, seu desempenho em tarefas diretas de memória e concentração é tão bom quanto o daquelas pessoas que tomam pílulas de placebo4. Isso sugere que qualquer benefício sentido pelos participantes do estudo pode decorrer do efeito placebo4.

Bossaerts e seus colegas queriam testar os medicamentos de uma maneira mais próxima da solução de problemas do mundo real. Eles usaram um teste online chamado problema da mochila, no qual as pessoas devem escolher entre vários itens de diferentes pesos e valores para encher uma bolsa, tornando o conteúdo total o mais valioso possível sem ultrapassar um limite de peso. Eles podem experimentar diferentes combinações antes de enviar sua resposta.

Os pesquisadores pediram a 40 pessoas que fizessem várias versões da tarefa depois de tomar um dos três medicamentos ou um comprimido de placebo4. Os participantes visitaram o laboratório quatro vezes, com intervalos semanais, para serem testados após cada medicamento e placebo4.

Ao tomar qualquer um dos medicamentos, as pessoas se esforçam mais na tarefa, em termos do número de opções diferentes que experimentam antes de enviar suas respostas e quanto tempo gastam na tarefa. Mas seu desempenho foi pior, medido pelo valor total dos itens na sacola, em comparação com o placebo4.

As pessoas provavelmente pensariam que os medicamentos as estão ajudando, mas não estão, diz Bossaerts. “Eles estão gastando mais tempo na tarefa, eles movem muito mais os itens, então eles se veem mais ocupados”, diz ele.

Rachel Fargason, da Universidade do Alabama em Birmingham, diz que faz sentido que os estimulantes possam ser úteis para pessoas com TDAH, mas não para aqueles que não têm a condição. “Você pode ter excesso dopamina1 – há uma dose ideal”, diz ela. “Este estudo realmente demonstra isso lindamente.”

Stephen Faraone, da SUNY Upstate Medical University, no estado de Nova York, diz que as pessoas que tomam estimulantes podem não perceber que as drogas reduzem seu desempenho porque parece que estão trabalhando mais. “Os medicamentos manterão as pessoas acordadas e aumentarão a motivação”, diz ele. “Eles podem confundir motivação com algo que está funcionando.”

O fabricante da Ritalina, Novartis, não respondeu aos pedidos de comentário até o momento da publicação. Todos os três medicamentos são fabricados por várias empresas.

No artigo publicado, os pesquisadores relatam que drogas “inteligentes” aumentam o nível, mas diminuem a qualidade do esforço cognitivo5.

Segundo eles, a eficácia dos intensificadores cognitivos6 farmacêuticos em tarefas complexas do dia a dia ainda precisa ser estabelecida. Nesse contexto, usando o problema de otimização da mochila como uma representação estilizada da dificuldade em tarefas encontradas na vida diária, descobriu-se que o metilfenidato, a dextroanfetamina e o modafinil fazem com que o valor da mochila obtido na tarefa diminua significativamente em comparação ao placebo4, mesmo se a chance de encontrar a solução ótima (~50%) não é reduzida significativamente.

O esforço (tempo de decisão e número de passos para encontrar uma solução) aumenta significativamente, mas a produtividade (qualidade do esforço) diminui significativamente.

Ao mesmo tempo, as diferenças de produtividade entre os participantes diminuem, e até se invertem, na medida em que os executores acima da média terminam abaixo da média e vice-versa. O último pode ser atribuído ao aumento da aleatoriedade das estratégias de solução.

Essas descobertas sugerem que as “drogas da inteligência” aumentam a motivação, mas uma redução na qualidade do esforço, crucial para resolver problemas complexos, anula esse efeito.

Veja também sobre "Neurotransmissores - quais são e como agem".

 

Fontes:
Science Advances, Vol. 9, Nº 24, em 14 de junho de 2023.
New Scientist, notícia publicada em 14 de junho de 2023.

 

NEWS.MED.BR, 2023. "Drogas da inteligência", ou smart drugs, não tornam as pessoas melhores em um teste de resolução de problemas. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1439790/quot-drogas-da-inteligencia-quot-ou-smart-drugs-nao-tornam-as-pessoas-melhores-em-um-teste-de-resolucao-de-problemas.htm>. Acesso em: 27 abr. 2024.

Complementos

1 Dopamina: É um mediador químico presente nas glândulas suprarrenais, indispensável para a atividade normal do cérebro.
2 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
3 Fadiga: 1. Sensação de enfraquecimento resultante de esforço físico. 2. Trabalho cansativo. 3. Redução gradual da resistência de um material ou da sensibilidade de um equipamento devido ao uso continuado.
4 Placebo: Preparação neutra quanto a efeitos farmacológicos, ministrada em substituição a um medicamento, com a finalidade de suscitar ou controlar as reações, geralmente de natureza psicológica, que acompanham tal procedimento terapêutico.
5 Cognitivo: 1. Relativo ao conhecimento, à cognição. 2. Relativo ao processo mental de percepção, memória, juízo e/ou raciocínio. 3. Diz-se de estados e processos relativos à identificação de um saber dedutível e à resolução de tarefas e problemas determinados. 4. Diz-se dos princípios classificatórios derivados de constatações, percepções e/ou ações que norteiam a passagem das representações simbólicas à experiência, e também da organização hierárquica e da utilização no pensamento e linguagem daqueles mesmos princípios.
6 Cognitivos: 1. Relativo ao conhecimento, à cognição. 2. Relativo ao processo mental de percepção, memória, juízo e/ou raciocínio. 3. Diz-se de estados e processos relativos à identificação de um saber dedutível e à resolução de tarefas e problemas determinados. 4. Diz-se dos princípios classificatórios derivados de constatações, percepções e/ou ações que norteiam a passagem das representações simbólicas à experiência, e também da organização hierárquica e da utilização no pensamento e linguagem daqueles mesmos princípios.
Gostou do artigo? Compartilhe!