Microrganismos da mãe podem impulsionar o desenvolvimento cerebral de bebês nascidos de cesariana
A transferência do fluido vaginal de uma mãe para um bebê nascido por cesariana, consequentemente transferindo suas bactérias vaginais, parece beneficiar o desenvolvimento inicial do recém-nascido, que se mostrou estar mais avançado aos 6 meses.
As descobertas são baseadas nos resultados de um pequeno estudo, no entanto, e em mães relatando os marcos de seus filhos. Portanto, mais pesquisas são necessárias antes que essa prática possa ser recomendada. Os dados foram publicados na revista Cell Host & Microbe.
Entre os bebês1 nascidos de parto normal, seu microbioma2 intestinal inicial tende a ser rico em bactérias da vagina3 de suas mães, enquanto o dos nascidos por cesariana é frequentemente dominado por bactérias da pele4 de suas mães, do meio ambiente e possivelmente do leite materno.
A chamada semeadura vaginal, expondo os recém-nascidos nascidos por cesariana ao fluido vaginal de suas mães, tem sido associada a esses recém-nascidos desenvolvendo um microbioma2 intestinal semelhante aos nascidos por via vaginal. No entanto, a segurança da prática e se ela tem algum efeito positivo não é clara.
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Para saber mais, José Clemente, da Escola de Medicina Icahn, em Mount Sinai, em Nova York, e seus colegas analisaram 68 gestantes que estavam programadas para uma cesariana. Duas horas antes do procedimento, uma gaze estéril dobrada e umedecida com soro5 fisiológico6 foi inserida na vagina3 das mulheres até cerca de 30 minutos antes da cirurgia.
Depois que os bebês1 nasceram, 32 tiveram a gaze esfregada no rosto, tórax7, membros, genitais, ânus8 e costas9, enquanto 36 bebês1 foram esfregados nessas áreas com gaze embebida em soro5 fisiológico6. Os pesquisadores também analisaram 33 gestantes que deram à luz seus bebês1 por via vaginal, com esses bebês1 não sendo esfregados com gaze.
Todas as mães responderam a um questionário que avaliava o neurodesenvolvimento de seus filhos – avaliado pela capacidade de emitir sons simples e engatinhar, por exemplo – aos 3 e 6 meses. Amostras fecais também foram coletadas várias vezes até 6 semanas de idade.
Aos 3 e 6 meses, os bebês1 de cesariana expostos à gaze embebida na vagina3 obtiveram melhores resultados no questionário do que aqueles expostos à gaze salina, com uma análise estatística sugerindo que esse não foi um achado casual. Suas pontuações também foram comparáveis as dos bebês1 nascidos por via vaginal.
Amostras fecais coletadas em 6 semanas mostraram que os microbiomas intestinais dos bebês1 no grupo de gaze vaginal eram mais ricos em bactérias comumente encontradas na vagina3, como Lactobacillus, em comparação com os do grupo de solução salina. Sua composição bacteriana geral também era mais madura do que a do último grupo e no mesmo nível daquela dos bebês1 nascidos por via vaginal.
“Neste estudo, mostramos que esse procedimento não apenas altera o microbioma2 de bebês1 de cesariana, mas também modifica um resultado de saúde”, diz Clemente. “Isso é altamente significativo porque abre caminho para reduzir o risco que os bebês1 de cesariana apresentam para certas condições por meio de uma intervenção microbiana muito simples”.
Nenhum problema de segurança foi relatado no estudo, com todas as mulheres sendo examinadas previamente para infecções10 sexualmente transmissíveis.
Estudos populacionais sugerem que condições como o TDAH são mais comuns em pessoas nascidas por cesariana, portanto, trabalhos adicionais podem verificar se a semeadura vaginal afeta isso.
“Este é um estudo importante, pois não apenas destaca a segurança da semeadura vaginal, mas também mostra pela primeira vez que as diferenças de neurodesenvolvimento em bebês1 nascidos por cesariana em relação a bebês1 nascidos de parto normal podem ser parcialmente corrigidas com a semeadura”, diz Maria Dominguez Bello, da Rutgers University, em Nova Jersey. No entanto, o questionário envolvia a mãe de cada bebê relatando o desenvolvimento de seu filho, o que pode ser menos preciso do que uma avaliação por meio de exames de imagens, avaliações médicas ou exames de sangue11, diz ela.
A equipe planeja repetir o estudo com um grupo maior de participantes e investigar como certas bactérias intestinais podem afetar o neurodesenvolvimento de um bebê.
Efeitos da transferência da microbiota12 vaginal no neurodesenvolvimento e no microbioma2 de bebês1 nascidos por cesariana
Destaques
- Este estudo randomizado13 controlado triplo-cego mostra que a transferência da microbiota12 vaginal (TMV) pode ser segura para bebês1 nascidos por cesariana.
- A TMV está associada a um melhor neurodesenvolvimento em bebês1 nascidos por cesariana.
- A TMV pode restaurar o microbioma2 intestinal para se assemelhar ao de bebês1 nascidos de parto vaginal.
- A TMV regula os níveis de certos metabólitos14 intestinais e vias metabólicas.
Resumo
Os microbiomas de bebês1 nascidos por cesariana diferem dos de bebês1 nascidos por via vaginal, e estão associados a riscos aumentados de doenças. A transferência da microbiota12 vaginal (TMV) para recém-nascidos pode reverter os distúrbios do microbioma2 relacionados à cesariana.
Neste estudo, avaliou-se o efeito da TMV expondo recém-nascidos a fluidos vaginais maternos e avaliando o neurodesenvolvimento, bem como a microbiota12 fecal e o metaboloma15.
Sessenta e oito bebês1 nascidos de cesariana foram aleatoriamente designados para uma intervenção de TMV ou gaze salina imediatamente após o parto de maneira triplo-cega. Os eventos adversos não foram significativamente diferentes entre os dois grupos.
O neurodesenvolvimento infantil, conforme medido pela pontuação do Ages and Stages Questionnaire (ASQ-3) aos 6 meses, foi significativamente maior com TMV do que com solução salina.
A TMV acelerou significativamente a maturação da microbiota12 intestinal e regulou os níveis de certos metabólitos14 fecais e funções metabólicas, incluindo o metabolismo16 de carboidratos, energia e aminoácidos, dentro de 42 dias após o nascimento.
No geral, a TMV é provavelmente segura e pode normalizar parcialmente o neurodesenvolvimento e o microbioma2 fecal em bebês1 nascidos de cesariana.
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Fontes:
Cell Host & Microbe, publicação em 15 de junho de 2023.
New Scientist, notícia publicada em 15 de junho de 2023.