Gostou do artigo? Compartilhe!

Descoberta de uma nova função para uma proteína chave na doença de Parkinson traz implicações para tratamentos

A+ A- Alterar tamanho da letra
Avalie esta notícia

Uma das características da doença de Parkinson1 (DP) é o acúmulo no cérebro2 de uma proteína conhecida como alfa-sinucleína. Por mais de duas décadas, a alfa-sinucleína tem sido um ponto focal de atenção para pesquisadores, médicos e fabricantes de medicamentos interessados na DP. Mas a função da alfa-sinucleína não é bem compreendida.

Um novo estudo liderado por pesquisadores do Brigham and Women's Hospital, do Harvard Stem Cell Institute e do Broad Institute of MIT and Harvard lança uma nova luz sobre o papel da alfa-sinucleína, descobrindo uma nova função para a proteína com relevância para a DP e condições relacionadas. Os resultados foram publicados na revista Cell.

“Nosso estudo oferece novos insights sobre uma proteína que é conhecida por estar no centro do desenvolvimento da doença de Parkinson1 e distúrbios relacionados”, disse o autor correspondente Vikram Khurana, chefe da Divisão de Distúrbios do Movimento do Departamento de Neurologia do Brigham e da Harvard Medical School e pesquisador principal do Ann Romney Center for Neurologic Diseases no Brigham. “Esta é uma proteína que está sendo alvo da terapêutica3 atual, mas sua função tem sido elusiva. Tradicionalmente, acredita-se que a alfa-sinucleína desempenha um papel na ligação à membrana celular4 e no transporte de estruturas conhecidas como vesículas5. Mas nosso estudo sugere que a alfa-sinucleína está levando uma vida dupla”.

As pistas iniciais de Khurana e colegas vieram de modelos de levedura e mosca da fruta da toxicidade6 de alfa-sinucleína e foram fundamentadas por meio de estudos de células7 humanas, neurônios8 derivados de pacientes e genética humana.

Leia sobre "Doença ou Mal de Parkinson" e "Sinais9 precoces da doença de Parkinson1".

A equipe descobriu que a mesma parte da proteína alfa-sinucleína que interage com as vesículas5 também se liga a estruturas chamadas corpos de processamento (corpos-P), uma maquinaria na célula10 que regula a expressão de genes por meio de RNAs mensageiros (mRNAs).

Em neurônios8 derivados de células-tronco11 pluripotentes induzidas gerados a partir de pacientes com DP com mutações no gene da alfa-sinucleína, a estrutura fisiológica12 e a função dos corpos-P foram perdidas e os mRNAs foram regulados de forma anormal. O mesmo ocorreu em amostras de tecidos de cérebros post mortem de pacientes. Análises genéticas humanas apoiaram a relevância desses achados para a doença: pacientes que acumulam mutações nos genes dos corpos-P pareciam estar em maior risco de DP.

Os autores, incluindo cientistas da Plataforma de Proteômica13 do Broad Institute, descrevem a alfa-sinucleína como um “interruptor” que regula duas funções muito distintas: transporte de vesículas5 e expressão gênica. Em estados de doença, o equilíbrio é quebrado.

Os resultados têm implicações potenciais para o desenvolvimento de tratamentos para a DP. Os autores observam que é necessária mais clareza sobre quais componentes da maquinaria do corpo-P podem ser os melhores alvos para uma intervenção terapêutica3. Estudos genéticos em andamento visam identificar quais pacientes podem ser mais adequados para tal intervenção e quanto essa via recém-descoberta contribui para o risco da doença e progressão da doença em pacientes com DP em geral.

“Se quisermos desenvolver tratamentos direcionados à alfa-sinucleína, precisamos entender o que essa proteína faz e as possíveis consequências da redução de seu nível ou atividade”, disse o principal autor Erinc Hallacli, do Departamento de Neurologia e do Ann Romney Center for Neurologic Diseases no Brigham. “Este artigo fornece informações importantes para preencher nossas lacunas de conhecimento sobre essa proteína, o que pode ser benéfico para a tradução clínica”.

No artigo, os pesquisadores descreveram como a proteína alfa-sinucleína da doença de Parkinson1 é um modulador de corpos de processamento e estabilidade de mRNA.

A alfa-sinucleína (αS) é uma proteína conformacionalmente plástica que se liga reversivelmente às membranas celulares. Ela se agrega e está geneticamente ligada à doença de Parkinson1 (DP).

Neste estudo, mostrou-se que αS modula diretamente os corpos de processamento (corpos-P), organelas sem membrana que funcionam na renovação e armazenamento de mRNA. O terminal N da αS, mas não outras sinucleínas, dita a ligação mutuamente exclusiva às membranas celulares ou aos corpos-P no citosol.

A αS associa-se a várias proteínas14 de decapeamento nas proximidades da estrutura de interação do gene Edc4. À medida que αS se acumula patologicamente, a interação aberrante com o Edc4 ocorre às custas das interações fisiológicas15 do módulo de decapeamento.

A cinética16 de decaimento do mRNA dentro das vias relevantes para a DP é correspondentemente interrompida nos neurônios8 e no cérebro2 do paciente com DP.

A modulação genética dos componentes do corpo-P altera a toxicidade6 de αS, e a análise genética humana dá suporte à relevância dessas interações para a doença.

Além de revelar um aspecto inesperado da função e patologia17 da alfa-sinucleína, esses dados destacam a versatilidade de proteínas14 conformacionalmente plásticas com alta desordem intrínseca.

Veja também sobre "Conhecendo melhor as doenças degenerativas18".

 

Fontes:
Cell, Vol. 185, Nº 12, em 09 de junho de 2022.
Broad Institute, notícia publicada em 09 de junho de 2022.

 

NEWS.MED.BR, 2022. Descoberta de uma nova função para uma proteína chave na doença de Parkinson traz implicações para tratamentos. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1419420/descoberta-de-uma-nova-funcao-para-uma-proteina-chave-na-doenca-de-parkinson-traz-implicacoes-para-tratamentos.htm>. Acesso em: 28 mar. 2024.

Complementos

1 Doença de Parkinson: Doença degenerativa que afeta uma região específica do cérebro (gânglios da base), e caracteriza-se por tremores em repouso, rigidez ao realizar movimentos, falta de expressão facial e, em casos avançados, demência. Os sintomas podem ser aliviados por medicamentos adequados, mas ainda não se conhece, até o momento, uma cura definitiva.
2 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
3 Terapêutica: Terapia, tratamento de doentes.
4 Membrana Celular: Membrana seletivamente permeável (contendo lipídeos e proteínas) que envolve o citoplasma em células procarióticas e eucarióticas.
5 Vesículas: Lesões papulares preenchidas com líquido claro.
6 Toxicidade: Capacidade de uma substância produzir efeitos prejudiciais ao organismo vivo.
7 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
8 Neurônios: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO. Sinônimos: Células Nervosas
9 Sinais: São alterações percebidas ou medidas por outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, sem o relato ou comunicação do paciente. Por exemplo, uma ferida.
10 Célula: Unidade funcional básica de todo tecido, capaz de se duplicar (porém algumas células muito especializadas, como os neurônios, não conseguem se duplicar), trocar substâncias com o meio externo à célula, etc. Possui subestruturas (organelas) distintas como núcleo, parede celular, membrana celular, mitocôndrias, etc. que são as responsáveis pela sobrevivência da mesma.
11 Células-tronco: São células primárias encontradas em todos os organismos multicelulares que retêm a habilidade de se renovar por meio da divisão celular mitótica e podem se diferenciar em uma vasta gama de tipos de células especializadas.
12 Fisiológica: Relativo à fisiologia. A fisiologia é estudo das funções e do funcionamento normal dos seres vivos, especialmente dos processos físico-químicos que ocorrem nas células, tecidos, órgãos e sistemas dos seres vivos sadios.
13 Proteômica: Ciência que estuda o conjunto de proteínas e suas isoformas contidas em amostras biológicas, seja esta um organismo, um tecido, uma organela celular ou uma célula, sempre determinadas pelo genoma.
14 Proteínas: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Alimentos que fornecem proteína incluem carne vermelha, frango, peixe, queijos, leite, derivados do leite, ovos.
15 Fisiológicas: Relativo à fisiologia. A fisiologia é estudo das funções e do funcionamento normal dos seres vivos, especialmente dos processos físico-químicos que ocorrem nas células, tecidos, órgãos e sistemas dos seres vivos sadios.
16 Cinética: Ramo da física que trata da ação das forças nas mudanças de movimento dos corpos.
17 Patologia: 1. Especialidade médica que estuda as doenças e as alterações que estas provocam no organismo. 2. Qualquer desvio anatômico e/ou fisiológico, em relação à normalidade, que constitua uma doença ou caracterize determinada doença. 3. Por extensão de sentido, é o desvio em relação ao que é próprio ou adequado ou em relação ao que é considerado como o estado normal de uma coisa inanimada ou imaterial.
18 Degenerativas: Relativas a ou que provocam degeneração.
Gostou do artigo? Compartilhe!