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O autismo diagnosticado precocemente na infância tem um perfil genético e de desenvolvimento diferente do autismo diagnosticado posteriormente

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Novos dados sobre autismo desafiam suposições antigas. Com base nas descobertas, especialistas apontam que, se falamos em uma epidemia de autismo, a pergunta imediata deve ser: que tipo de autismo?

Uma ampla análise de múltiplas coortes, publicada na revista Nature, mostrou que o autismo diagnosticado na primeira infância apresentou um perfil genético e de desenvolvimento distinto em comparação com o autismo diagnosticado posteriormente.

Varun Warrier, PhD, da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e colegas relatam que a trajetória associada ao diagnóstico1 precoce de autismo apresentou menores habilidades sociais e de comunicação na primeira infância. Já a trajetória associada ao diagnóstico1 tardio de autismo (tipicamente após os 9-11 anos) apresentou mais dificuldades socioemocionais e comportamentais na adolescência.

Variantes genéticas comuns foram responsáveis por aproximadamente 11% da variância na idade no diagnóstico1 de autismo, semelhante a fatores demográficos e clínicos individuais, que normalmente explicam menos de 15% da variância, disseram os pesquisadores.

O grupo com diagnóstico1 precoce apresentou baixa correlação genética com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e condições de saúde2 mental. O grupo com diagnóstico1 tardio apresentou correlação genética mais forte com TDAH e condições de saúde2 mental, incluindo transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e depressão.

Os resultados desafiam uma suposição antiga de que o autismo tem uma causa subjacente unificada. No modelo unitário, espera-se que as variantes genéticas sejam as mesmas, independentemente da idade no momento do diagnóstico1. Este estudo, no entanto, constatou que cada grupo tinha seu próprio perfil poligênico e que a correlação genética entre os dois grupos era pequena (rg = 0,38).

Leia sobre "Transtornos do espectro autista", "Transtornos do Desenvolvimento" e "Desenvolvimento infantil".

O termo “autismo” provavelmente descreve múltiplas condições, observou Warrier. “Pela primeira vez, descobrimos que o autismo diagnosticado precocemente e tardiamente apresenta diferentes perfis biológicos e de desenvolvimento subjacentes”, afirmou ele em um comunicado.

Algumas influências genéticas predispõem as pessoas a apresentar traços de autismo desde muito jovens e podem ser identificadas mais facilmente, levando a um diagnóstico1 mais precoce, destacou Warrier.

“Para outras, as influências genéticas podem alterar quais características do autismo surgem e quando. Algumas dessas crianças podem ter características que não são percebidas pelos pais ou cuidadores até que causem sofrimento significativo no final da infância ou adolescência”, explicou.

“Um próximo passo importante será compreender a complexa interação entre genética e fatores sociais que levam a piores resultados de saúde2 mental entre indivíduos autistas diagnosticados posteriormente”, disse Warrier.

As descobertas lançam luz sobre o papel dos genes no autismo. Um estudo recente do CDC dos Estados Unidos identificou que 1 em cada 31 crianças que tinham 8 anos em 2022 apresentava transtorno do espectro autista, em parte devido à maior conscientização, vigilância mais rigorosa e critérios diagnósticos mais amplos.

As principais características do transtorno do espectro autista incluem dificuldades persistentes na comunicação e nas interações sociais, juntamente com comportamentos, interesses ou atividades restritos e repetitivos, observou Elliot Tucker-Drob, PhD, da Universidade do Texas em Austin, EUA.

“Os critérios diagnósticos clínicos geralmente exigem que esses sintomas3 sejam observados na primeira infância”, escreveu Tucker-Drob em um editorial que acompanhou a publicação do estudo. “No entanto, a idade em que uma pessoa é diagnosticada com autismo pela primeira vez varia consideravelmente, desde os primeiros anos de vida até a adolescência e a idade adulta, mesmo em indivíduos que foram rastreados na primeira infância.”

Este estudo apresenta evidências de que o tempo de desenvolvimento do diagnóstico1 de autismo “não é simplesmente um artefato dos desafios de identificar casos mais leves em idades precoces, mas sim uma característica primária que distingue diferentes formas de autismo”, escreveu Tucker-Drob.

O tempo de desenvolvimento é “apenas um eixo possível ao longo do qual os subtipos de autismo podem ser diferenciados, e é possível, se não provável, que existam outros subtipos de autismo mecanicamente separáveis que ainda não foram identificados”, acrescentou.

Em sua análise, Warrier e colegas incorporaram dados comportamentais da infância e adolescência no Reino Unido e na Austrália, além de dados genéticos de mais de 45.000 pessoas em coortes da Europa e dos EUA.

O estudo tem implicações importantes sobre como o autismo é conceituado e fornece um modelo para explicar parte da diversidade encontrada no autismo, observaram os pesquisadores.

“Isso me dá esperança de que ainda mais subgrupos venham à tona e que cada um encontre um rótulo diagnóstico1 apropriado”, afirmou Uta Frith, PhD, da University College London.

“É hora de perceber que o ‘autismo’ se tornou um amontoado de diferentes condições”, continuou Frith. “Se se fala em uma ‘epidemia de autismo’, uma ‘causa do autismo’ ou um ‘tratamento para o autismo’, a pergunta imediata deve ser: que tipo de autismo?”

No artigo publicado, os pesquisadores relatam como os perfis poligênicos e de desenvolvimento do autismo diferem de acordo com a idade no diagnóstico1.

Eles contextualizam que, embora o autismo tenha sido historicamente conceituado como uma condição que surge na primeira infância, muitas pessoas autistas são diagnosticadas mais tarde na vida. Não se sabe se o autismo diagnosticado mais cedo e mais tarde tem diferentes trajetórias de desenvolvimento e perfis genéticos.

Usando dados longitudinais de quatro coortes de nascimento independentes, demonstrou-se que duas trajetórias socioemocionais e comportamentais diferentes estão associadas à idade no diagnóstico1.

Em coortes independentes de indivíduos autistas, variantes genéticas comuns são responsáveis por aproximadamente 11% da variância na idade no diagnóstico1 do autismo, semelhante à contribuição de fatores sociodemográficos e clínicos individuais, que normalmente explicam menos de 15% dessa variância.

Demonstrou-se ainda que a arquitetura poligênica do autismo pode ser dividida em dois fatores poligênicos do autismo modestamente correlacionados geneticamente (rg = 0,38, s.e. = 0,07). Um desses fatores está associado ao diagnóstico1 precoce de autismo e a menores habilidades sociais e de comunicação na primeira infância, mas apresenta correlação genética apenas moderada com o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e problemas de saúde2 mental.

Por outro lado, o segundo fator está associado ao diagnóstico1 tardio de autismo e ao aumento de dificuldades socioemocionais e comportamentais na adolescência, apresentando correlações genéticas positivas de moderadas a altas com o TDAH e problemas de saúde2 mental.

Esses achados indicam que o autismo diagnosticado precocemente e tardiamente apresenta trajetórias de desenvolvimento e perfis genéticos diferentes.

Esses achados têm implicações importantes para a forma como conceituamos o autismo e fornecem um modelo para explicar parte da diversidade encontrada no autismo.

Veja também sobre "TDAH: o que é", "Autismo: como reconhecer os sintomas3 precoces" e "Atrasos do desenvolvimento - como podem ser observados".

 

Fontes:
Nature, publicação em 01 de outubro de 2025.
MedPage Today, notícia publicada em 04 de outubro de 2025.

 

NEWS.MED.BR, 2025. O autismo diagnosticado precocemente na infância tem um perfil genético e de desenvolvimento diferente do autismo diagnosticado posteriormente. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1496590/o-autismo-diagnosticado-precocemente-na-infancia-tem-um-perfil-genetico-e-de-desenvolvimento-diferente-do-autismo-diagnosticado-posteriormente.htm>. Acesso em: 24 out. 2025.

Complementos

1 Diagnóstico: Determinação de uma doença a partir dos seus sinais e sintomas.
2 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
3 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.

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