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Primeiro tratamento pré-natal para atrofia muscular espinhal mostra-se promissor

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Destaques

• O primeiro tratamento pré-natal para atrofia1 muscular espinhal mostrou-se promissor em um único relato de caso.

• Risdiplam foi administrado à mãe durante a gravidez2 e à criança após o nascimento.

• Mais de 2 anos depois, a criança não apresenta características da doença.

A primeira terapia pré-natal para atrofia1 muscular espinhal (AME) mostrou resultados promissores, indicou um relato de caso.

Mais de 2 anos após o nascimento da criança, nenhuma característica identificável de AME foi observada, relataram Richard Finkel, MD, do St. Jude Children's Research Hospital em Memphis, Tennessee, EUA, e colegas em uma correspondência ao The New England Journal of Medicine.

A criança foi tratada no útero3 com risdiplam (Evrysdi), que é aprovado para tratar AME em pacientes pediátricos e adultos, e continua a receber o medicamento oral diariamente.

A AME é causada por níveis reduzidos de proteína do neurônio motor de sobrevivência4 (SMN) devido a deleções ou mutações do gene SMN1. Um gene quase idêntico, SMN2, produz baixos níveis de proteína SMN funcional.

Risdiplam é um modificador do splicing5 (maturação) do pré-mRNA de SMN2 projetado para aumentar e sustentar os níveis de proteína SMN central e perifericamente. É um dos três medicamentos aprovados para AME, os outros sendo nusinersen (Spinraza) e onasemnogene abeparvovec (Zolgensma).

No caso do St. Jude, a criança estava em risco de AME tipo 1, uma forma grave da doença, devido ao histórico familiar e foi testada para AME por meio de amniocentese6. Os testes não mostraram cópias de SMN1 e duas cópias de SMN2, o que é preditivo de AME tipo 1. Se não for tratada, a AME tipo 1 resulta em fraqueza muscular progressiva que leva à morte.

A triagem neonatal generalizada para AME está em vigor nos EUA desde 2018, e todos os 50 estados agora fazem a triagem. Embora a triagem neonatal tenha ajudado bebês7 com AME a serem tratados mais cedo e a ter melhores resultados motores, isso pode não ser suficiente para algumas crianças.

“Mesmo com a triagem neonatal e a identificação de bebês7 com AME logo após o nascimento, e com o início imediato de um dos três medicamentos aprovados pela FDA para AME, agora é aparente que uma proporção substancial desses bebês7 – principalmente aqueles com o genótipo8 preditivo de AME tipo 1 – ficam para trás em seu desenvolvimento motor e, em alguns casos, têm limitações na alimentação e no estado respiratório”, disse Finkel.

“Essa observação, juntamente com dados neuropatológicos para indicar que o processo neurodegenerativo na AME começa no útero3, gerou a ideia de iniciar o tratamento no útero”, disse ele.

“O objetivo geral neste primeiro estudo de caso foi demonstrar a viabilidade da terapia pré-natal com um desses medicamentos, gerar dados de segurança e reunir dados clínicos e de biomarcadores que podem dar uma dica de eficácia aprimorada quando comparados ao início do tratamento pós-natal”, acrescentou.

Leia sobre "Amiotrofia9 espinhal", "Doenças neuromusculares" e "Doenças congênitas10, genéticas e hereditárias: quais as diferenças".

Na correspondência publicada, os pesquisadores descrevem o uso de risdiplam para terapia pré-natal de atrofia1 muscular espinhal.

Eles relatam que o risdiplam, um medicamento de molécula pequena que modula o splicing5 do gene SMN2, aumenta o nível da proteína SMN (neurônio motor de sobrevivência4) em pessoas com atrofia1 muscular espinhal (AME) e melhora as manifestações da doença. Um feto11 em risco para a forma grave de AME – AME tipo 1 – devido a ter um irmão mais velho falecido com AME tipo 1 geneticamente confirmado, foi testado para AME por meio de amniocentese6. Os testes não mostraram cópias de SMN1 (confirmando o diagnóstico12 de AME) e duas cópias de SMN2 (que é preditivo de AME tipo 1).

Dados anteriores mostraram passagem transplacentária13 de material relacionado ao risdiplam e apoiaram a viabilidade do tratamento pré-natal. Relatou-se na correspondência o tratamento deste feto11 com risdiplam.

A Food and Drug Administration e o conselho de revisão institucional local aprovaram o plano investigacional de paciente único. Os pais forneceram consentimento informado por escrito em consulta com um defensor não afiliado. A farmacêutica F. Hoffmann–La Roche forneceu aconselhamento científico, aconselhou sobre a segurança da exposição pré-natal e forneceu risdiplam sem custo como um produto experimental sob um acordo de confidencialidade com o patrocinador (St. Jude Children’s Research Hospital).

O risdiplam foi administrado oralmente à mãe na dose de 5 mg por dia entre 32 semanas e 5 dias de gestação e o parto com 38 semanas e 6 dias de gestação. A mãe foi monitorada semanalmente para saúde14 obstétrica e efeitos colaterais15 relacionados a medicamentos, e o feto11 foi monitorado para crescimento, atividade e desenvolvimento anatômico por meio de ultrassonografia16. O risdiplam foi posteriormente administrado oralmente ao bebê 8 dias após o nascimento e tem sido continuado diariamente até o presente momento (30 meses de idade em fevereiro de 2025).

A concentração de risdiplam e os níveis de SMN e neurofilamento foram avaliados no sangue17 materno e infantil e no líquido amniótico18 no nascimento. Os níveis plasmáticos mínimos de risdiplam em estado estacionário na mãe foram de aproximadamente 14 ng por mililitro. Em comparação com as concentrações plasmáticas maternas, a concentração do fármaco19 no parto foi de 33% no líquido amniótico18 e 69% no sangue do cordão umbilical20.

O bebê parecia normal ao nascer, mas foi identificado pós-natalmente como portador de sopro cardíaco21 devido a um defeito do septo ventricular, que foi resolvido. O bebê também tem acuidade visual22 levemente reduzida com nistagmo23 de fixação transitório atribuído à hipoplasia24 do nervo óptico em ambos os olhos25 e tem hemiparesia26 direita leve associada à hipoplasia24 do mesencéfalo27 esquerdo. Atraso global do desenvolvimento sem regressão também esteve presente no bebê até o momento. Análise de microarray e sequenciamento de genoma de leitura longa não identificaram um segundo distúrbio genético, como variantes de HESX1, OTX2 e SOX2, que são genes associados à displasia28 septo-óptica e distúrbios neuroendócrinos.

Nenhuma característica de AME, como hipotonia29, fraqueza, arreflexia ou fasciculação30, apareceu até o momento. Estudos de função motora, ultrassonografia16 muscular e eletrofisiológicos foram realizados a cada 6 meses e mostraram desenvolvimento normal de nervos periféricos e músculos31 para a idade.

O risdiplam foi administrado a um feto11 com AME por meio de administração oral à mãe, com administração subsequente à criança até os 30 meses de idade, e o tratamento foi associado à ausência de manifestações de AME. Níveis aumentados de SMN e níveis reduzidos de neurofilamento dão suporte ao engajamento do alvo do agente e um efeito no desenvolvimento do neurônio motor.

As anormalidades congênitas10 foram consideradas pelos pesquisadores como tendo ocorrido no início do desenvolvimento fetal, antes da exposição ao risdiplam, e nenhuma causa foi identificada; essas alterações não foram observadas em animais que receberam risdiplam durante o desenvolvimento pré-natal e pós-natal.

Os resultados neste caso único não podem ser generalizados, mas podem dar suporte à consideração do tratamento pré-natal com risdiplam para AME identificada no útero3.

Veja também sobre "Gestação semana a semana" e "Exame genético".

 

Fontes:
The New England Journal of Medicine, publicação em 19 de fevereiro de 2025.
MedPage Today, notícia publicada em 19 de fevereiro de 2025.

 

NEWS.MED.BR, 2025. Primeiro tratamento pré-natal para atrofia muscular espinhal mostra-se promissor. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1482155/primeiro-tratamento-pre-natal-para-atrofia-muscular-espinhal-mostra-se-promissor.htm>. Acesso em: 27 fev. 2025.

Complementos

1 Atrofia: 1. Em biologia, é a falta de desenvolvimento de corpo, órgão, tecido ou membro. 2. Em patologia, é a diminuição de peso e volume de órgão, tecido ou membro por nutrição insuficiente das células ou imobilização. 3. No sentido figurado, é uma debilitação ou perda de alguma faculdade mental ou de um dos sentidos, por exemplo, da memória em idosos.
2 Gravidez: Condição de ter um embrião ou feto em desenvolvimento no trato reprodutivo feminino após a união de ovo e espermatozóide.
3 Útero: Orgão muscular oco (de paredes espessas), na pelve feminina. Constituído pelo fundo (corpo), local de IMPLANTAÇÃO DO EMBRIÃO e DESENVOLVIMENTO FETAL. Além do istmo (na extremidade perineal do fundo), encontra-se o COLO DO ÚTERO (pescoço), que se abre para a VAGINA. Além dos istmos (na extremidade abdominal superior do fundo), encontram-se as TUBAS UTERINAS.
4 Sobrevivência: 1. Ato ou efeito de sobreviver, de continuar a viver ou a existir. 2. Característica, condição ou virtude daquele ou daquilo que subsiste a um outro. Condição ou qualidade de quem ainda vive após a morte de outra pessoa. 3. Sequência ininterrupta de algo; o que subsiste de (alguma coisa remota no tempo); continuidade, persistência, duração.
5 Splicing: O “splicing“ só ocorre em células eucarióticas e consiste na remoção de fragmentos de um RNA recém-sintetizado, chamado de pré-RNA. Isso se passa no núcleo da célula (embora já haja indícios que possa se dar no citoplasma de neurônios). Esses pedaços removidos são chamados de íntrons. Os pedaços que persistem no RNA maduro são conhecidos como éxons.
6 Amniocentese: Consiste na obtenção do líquido amniótico que banha o feto através da punção da cavidade amniótica. Realizada entre 15 a 18 semanas de gravidez, para avaliar problemas genéticos do bebê.
7 Bebês: Lactentes. Inclui o período neonatal e se estende até 1 ano de idade (12 meses).
8 Genótipo: Composição genética de um indivíduo, ou seja, os genes que ele tem.
9 Amiotrofia: Tipo de neuropatia que resulta em dor, fraqueza e/ou debilidades musculares.
10 Congênitas: 1. Em biologia, o que é característico do indivíduo desde o nascimento ou antes do nascimento; conato. 2. Que se manifesta espontaneamente; inato, natural, infuso. 3. Que combina bem com; apropriado, adequado. 4. Em termos jurídicos, é o que foi adquirido durante a vida fetal ou embrionária; nascido com o indivíduo. Por exemplo, um defeito congênito.
11 Feto: Filhote por nascer de um mamífero vivíparo no período pós-embrionário, depois que as principais estruturas foram delineadas. Em humanos, do filhote por nascer vai do final da oitava semana após a CONCEPÇÃO até o NASCIMENTO, diferente do EMBRIÃO DE MAMÍFERO prematuro.
12 Diagnóstico: Determinação de uma doença a partir dos seus sinais e sintomas.
13 Transplacentária: Que atravessa a placenta ou que se processa através dela, por exemplo, as infecções transplacentárias.
14 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
15 Efeitos colaterais: 1. Ação não esperada de um medicamento. Ou seja, significa a ação sobre alguma parte do organismo diferente daquela que precisa ser tratada pelo medicamento. 2. Possível reação que pode ocorrer durante o uso do medicamento, podendo ser benéfica ou maléfica.
16 Ultrassonografia: Ultrassonografia ou ecografia é um exame complementar que usa o eco produzido pelo som para observar em tempo real as reflexões produzidas pelas estruturas internas do organismo (órgãos internos). Os aparelhos de ultrassonografia utilizam uma frequência variada, indo de 2 até 14 MHz, emitindo através de uma fonte de cristal que fica em contato com a pele e recebendo os ecos gerados, os quais são interpretados através de computação gráfica.
17 Sangue: O sangue é uma substância líquida que circula pelas artérias e veias do organismo. Em um adulto sadio, cerca de 45% do volume de seu sangue é composto por células (a maioria glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). O sangue é vermelho brilhante, quando oxigenado nos pulmões (nos alvéolos pulmonares). Ele adquire uma tonalidade mais azulada, quando perde seu oxigênio, através das veias e dos pequenos vasos denominados capilares.
18 Líquido amniótico: Fluido viscoso, incolor ou levemente esbranquiçado, que preenche a bolsa amniótica e envolve o embrião durante toda a gestação, protegendo-o contra infecções e choques mecânicos e térmicos.
19 Fármaco: Qualquer produto ou preparado farmacêutico; medicamento.
20 Sangue do Cordão Umbilical: Sangue do feto. A troca de nutrientes e de resíduos entre o sangue fetal e o materno ocorre através da PLACENTA. O sangue do cordão é o sangue contido nos vasos umbilicais (CORDÃO UMBILICAL) no momento do parto.
21 Sopro cardíaco: Som produzido pela alteração na turbulência dos fluxos cardíacos, devido a anormalidades nas válvulas e divisões cardíacas. Também pode ser auscultado em pessoas normais sem doença prévia (sopro benigno ou inocente).
22 Acuidade visual: Grau de aptidão do olho para discriminar os detalhes espaciais, ou seja, a capacidade de perceber a forma e o contorno dos objetos.
23 Nistagmo: Movimento involuntário, rápido e repetitivo do globo ocular. É normal dentro de certos limites diante da mudança de direção do olhar horizontal. Porém, pode expressar doenças neurológicas ou do sistema de equilíbrio.
24 Hipoplasia: Desenvolvimento defeituoso ou incompleto de tecido ou órgão, geralmente por diminuição do número de células, sendo menos grave que a aplasia.
25 Olhos:
26 Hemiparesia: Paralisia branda de uma das metades do corpo.
27 Mesencéfalo: O meio das três vesículas cerebrais primitivas no encéfalo embrionário. Sem outra subdivisão, o mesencéfalo se desenvolve em uma porção curta e estreita, unindo a PONTE e o DIENCÉFALO. O mesencéfalo contém duas partes principais Sinônimos: Cérebro Médio
28 Displasia: Desenvolvimento ou crescimento anormal de um tecido ou órgão.
29 Hipotonia: 1. Em biologia, é a condição da solução que apresenta menor concentração de solutos do que outra. 2. Em fisiologia, é a redução ou perda do tono muscular ou a redução da tensão em qualquer parte do corpo (por exemplo, no globo ocular, nas artérias, etc.)
30 Fasciculação: 1. Implantação, formação de fascículos. 2. Leve contração localizada de fascículos musculares inervados por um único filamento nervoso motor, visível como breves tremores na superfície da pele.
31 Músculos: Tecidos contráteis que produzem movimentos nos animais.
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