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Variante genética que parece proteger contra o HIV pode levar a novos medicamentos

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Uma forma diferente de um gene chamado CHD1L encontrado em pessoas com ascendência africana tem sido associada a níveis mais baixos de HIV1 em pessoas infectadas com o vírus2, oferecendo-lhes uma proteção considerável contra o HIV1. A descoberta, publicada na revista Nature, pode abrir portas para melhores tratamentos.

Exclusiva para pessoas com ascendência africana, pensa-se que até 13 por cento dessas pessoas tenham esta variante genética. Entre pessoas com HIV1, as cargas virais naquelas com esta versão do gene são 20 vezes mais baixas do que as de pessoas que também têm ascendência africana, mas não possuem a variante. Como resultado, os primeiros têm uma progressão mais lenta do HIV1 e um risco reduzido de transmissão do vírus2, diz Harriet Groom, da Universidade de Cambridge.

Esta é a primeira vez em três décadas que é encontrada uma variante genética relacionada com o HIV1, diz Groom. É também de particular importância, uma vez que é específica para pessoas com laços genéticos com a África, onde se encontram a maioria dos casos de HIV1 no mundo, diz ela. Os avanços no tratamento reduziram a propagação do HIV1 desde que foi descoberto, no entanto, o vírus2 sofre mutações facilmente e evita os efeitos dos medicamentos, diz Groom.

A maior parte da investigação genética sobre o HIV1 centrou-se em pessoas de ascendência europeia, o que levou à descoberta de variantes associadas a uma carga viral reduzida há cerca de 30 anos. Estas variantes, encontradas em dois genes conhecidos como HLA e CCR5, são responsáveis por cerca de 15 por cento das diferenças nas cargas virais do HIV1 entre pessoas de ascendência europeia.

Agora, Paul McLaren, do Laboratório Nacional de Microbiologia do Canadá, e os seus colegas compararam o DNA de 2.682 homens e mulheres de ascendência africana, a maioria dos quais eram afro-americanos. Todos eram positivos para HIV1-1, a forma mais comum do vírus2.

Leia sobre "Infecção3 pelo HIV1" e "Mutações genéticas".

Os investigadores descobriram que as cargas virais dos participantes estavam de alguma forma associadas a variantes do gene HLA, mas não ao gene CCR5. No entanto, ao contrário das pessoas de ascendência europeia, também encontraram uma variante relevante num gene diferente, conhecido como CHD1L. Este gene está numa região do cromossomo4 1 que é conhecida por codificar proteínas5 envolvidas na reparação do DNA, diz Groom. Todos os humanos possuem esse gene, mas apenas pessoas de ascendência africana carregam a variante recém-descoberta.

Para confirmar as suas descobertas, os investigadores procuraram a variante CHD1L em mais 1.197 pessoas de ascendência africana que viviam com HIV1-1 em vários países. Eles descobriram que aqueles que têm a variante – cerca de 4 a 13 por cento das pessoas desta ascendência – têm cargas virais significativamente mais baixas quando infectados com o HIV1-1, diz Groom.

Querendo compreender como a variante afeta as cargas de HIV1, Andrew Lever, da Universidade de Cambridge, e os seus colegas, incluindo Groom, desativaram-na experimentalmente em células6 imunes humanas geneticamente modificadas em laboratório, antes de as expor ao HIV1-1.

Ao longo de muitos ensaios, a equipe descobriu que o vírus2 se replicava muito mais num tipo de célula7 imune – macrófagos8 – quando a variante estava desativada do que quando não estava. Surpreendentemente, no entanto, esse não foi o caso de outro tipo de célula7 imune, as células6 T, embora se pense que é aqui que normalmente ocorre a maior parte da replicação do HIV1, diz Groom. Mais investigações poderiam esclarecer o papel dos macrófagos8 na replicação do HIV1, diz ela.

Combinadas, as conclusões poderão, ao longo do tempo, levar a uma gestão e tratamento mais direcionados do HIV1 em pessoas de ascendência africana, diz Groom.

Variação genética humana específica da África perto de CHD1L associa-se à carga de HIV1-1

O HIV1-1 continua a ser uma crise de saúde9 global, realçando a necessidade de identificar novos alvos para terapias.

Neste estudo, dados o fardo desproporcional do HIV1-1 e a acentuada diversidade do genoma humano na África, avaliou-se os determinantes genéticos do controle da carga viral de ponto de ajuste em 3.879 pessoas de ascendência africana que vivem com o HIV1-1, participando na colaboração internacional para a genômica do HIV1.

Identificou-se um sinal10 de associação anteriormente não descrito no cromossomo4 1, onde a variante de pico se associa a aproximadamente 0,3 cópias transformadas em log10 por ml de carga viral de ponto de ajuste inferior por cópia de alelo11 menor e é específica para populações de ascendência africana.

A variante principal associada é intergênica e situa-se entre um RNA longo não codificante intergênico (LINC00624) e o gene codificador CHD1L, que codifica uma helicase que está envolvida no reparo do DNA.

Ensaios de infecção3 em macrófagos8 derivados de células6 iPS e outras linhas celulares imortalizadas mostraram aumento da replicação do HIV1-1 em células6 com silenciamento do CHD1L e células6 com desativação do CHD1L.

Forneceu-se evidências de estudos genéticos populacionais de que a variação genética específica da África próxima ao CHD1L se associa à replicação do HIV1 in vivo.

Embora estudos experimentais sugiram que o CHD1L é capaz de limitar a infecção3 pelo HIV1 em alguns tipos de células6 in vitro, são necessárias investigações adicionais para compreender os mecanismos subjacentes às observações do estudo, incluindo quaisquer potenciais efeitos indiretos do CHD1L na propagação do HIV1 in vivo que os ensaios baseados em células6 não conseguem recapitular.

Veja também sobre "Genética - conceitos básicos", "Sistema imunológico12" e "O que é a AIDS".

 

Fontes:
Nature, publicação em 02 de agosto de 2023.
New Scientist, notícia publicada em 02 de agosto de 2023.

 

NEWS.MED.BR, 2023. Variante genética que parece proteger contra o HIV pode levar a novos medicamentos. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1443550/variante-genetica-que-parece-proteger-contra-o-hiv-pode-levar-a-novos-medicamentos.htm>. Acesso em: 27 abr. 2024.

Complementos

1 HIV: Abreviatura em inglês do vírus da imunodeficiência humana. É o agente causador da AIDS.
2 Vírus: Pequeno microorganismo capaz de infectar uma célula de um organismo superior e replicar-se utilizando os elementos celulares do hospedeiro. São capazes de causar múltiplas doenças, desde um resfriado comum até a AIDS.
3 Infecção: Doença produzida pela invasão de um germe (bactéria, vírus, fungo, etc.) em um organismo superior. Como conseqüência da mesma podem ser produzidas alterações na estrutura ou funcionamento dos tecidos comprometidos, ocasionando febre, queda do estado geral, e inúmeros sintomas que dependem do tipo de germe e da reação imunológica perante o mesmo.
4 Cromossomo: Cromossomos (Kroma=cor, soma=corpo) são filamentos espiralados de cromatina, existente no suco nuclear de todas as células, composto por DNA e proteínas, sendo observável à microscopia de luz durante a divisão celular.
5 Proteínas: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Alimentos que fornecem proteína incluem carne vermelha, frango, peixe, queijos, leite, derivados do leite, ovos.
6 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
7 Célula: Unidade funcional básica de todo tecido, capaz de se duplicar (porém algumas células muito especializadas, como os neurônios, não conseguem se duplicar), trocar substâncias com o meio externo à célula, etc. Possui subestruturas (organelas) distintas como núcleo, parede celular, membrana celular, mitocôndrias, etc. que são as responsáveis pela sobrevivência da mesma.
8 Macrófagos: É uma célula grande, derivada do monócito do sangue. Ela tem a função de englobar e destruir, por fagocitose, corpos estranhos e volumosos.
9 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
10 Sinal: 1. É uma alteração percebida ou medida por outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, sem o relato ou comunicação do paciente. Por exemplo, uma ferida. 2. Som ou gesto que indica algo, indício. 3. Dinheiro que se dá para garantir um contrato.
11 Alelo: 1. Que ocupa os mesmos loci (locais) nos cromossomos (diz-se de gene). 2. Em genética, é cada uma das formas que um gene pode apresentar e que determina características diferentes.
12 Sistema imunológico: Sistema de defesa do organismo contra infecções e outros ataques de micro-organismos que enfraquecem o nosso corpo.
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