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A variante de risco para Alzheimer APOE4 foi associada ao mau funcionamento da montagem da mielina

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Nenhuma variante genética é um fator de risco1 maior para a doença de Alzheimer2 do que uma chamada APOE4. Mas exatamente como o gene estimula o dano cerebral tem sido um mistério.

Agora, novos achados mostram que isso pode ser devido à diminuição da produção de uma substância gordurosa chamada mielina3 pelas células4 conhecidas como oligodendrócitos.

O estudo associou o APOE4 ao processamento defeituoso do colesterol5 no cérebro6, o que, por sua vez, leva a defeitos nas bainhas isolantes que envolvem as fibras nervosas e facilitam sua atividade elétrica. Os resultados preliminares indicam que essas alterações podem causar déficits de memória e aprendizado. E o trabalho sugere que medicamentos que restauram o processamento do colesterol5 no cérebro6 podem tratar a doença.

“Isso se encaixa na ideia de que o colesterol5 precisa estar no lugar certo”, diz Gregory Thatcher, biólogo químico da Universidade do Arizona em Tucson.

Leia sobre "Doenças degenerativas7", "Doenças desmielinizantes8" e "Distúrbio neurocognitivo".

Herdar uma única cópia do APOE4 aumenta o risco de desenvolver Alzheimer9 em cerca de 3 vezes; ter duas cópias aumenta as chances de 8 a 12 vezes. As interações entre a proteína codificada por APOE4 e placas10 pegajosas de amiloide – uma substância ligada à morte de células4 cerebrais – no cérebro6 explicam parcialmente a conexão. Mas essas interações não são toda a história.

Como o neurocientista Li-Huei Tsai, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em Cambridge, e seus colegas relataram no novo estudo, publicado na revista Nature, o APOE4 aciona células4 cerebrais produtoras de isolamento conhecidas como oligodendrócitos para acumular a molécula gordurosa colesterol5 – um tipo de lipídio – em todos os lugares errados.

Isso interfere na capacidade das células4 de cobrir as fibras nervosas em um invólucro protetor feito de um material rico em lipídios chamado mielina3. A sinalização elétrica no cérebro6 diminui e a cognição11 geralmente sofre.

A equipe de Tsai já havia vinculado alterações lipídicas a disfunções em outros tipos de células4, incluindo algumas que oferecem suporte estrutural aos neurônios12 e outras que fornecem proteção imunológica para o cérebro6. As descobertas mais recentes adicionam oligodendrócitos e sua função essencial de mielina3 à mistura.

“Todas as peças estão se juntando”, diz Julia TCW, neurocientista da Universidade de Boston, em Massachusetts.

No artigo, os pesquisadores descrevem como o APOE4 prejudica a mielinização através da desregulação do colesterol5 em oligodendrócitos.

Para obter informações mais abrangentes sobre o impacto do APOE4 no cérebro6 humano, eles realizaram perfis transcriptômicos de célula13 única de cérebros humanos post-mortem de portadores de APOE4 em comparação com não portadores.

Isso revelou que o APOE4 está associado a alterações generalizadas na expressão gênica em todos os tipos de células4 do cérebro6 humano. Consistente com a função biológica do APOE, o APOE4 alterou significativamente as vias de sinalização associadas à homeostase e ao transporte do colesterol5.

Confirmando essas descobertas com análise histológica14 e lipidômica do cérebro6 humano post-mortem, de células4 derivadas de células-tronco15 pluripotentes induzidas e de camundongos de substituição direcionada, mostrou-se que o colesterol5 é depositado de forma aberrante em oligodendrócitos – células4 mielinizantes responsáveis por isolar e promover a atividade elétrica dos neurônios12.

Foi demonstrado que a localização alterada do colesterol5 no cérebro6 de portadores de APOE4 coincide com a mielinização reduzida. A facilitação farmacológica do transporte de colesterol5 aumenta a mielinização axonal e melhora o aprendizado e a memória em camundongos portadores de APOE4.

Este estudo fornece um atlas16 de célula13 única que descreve os efeitos transcricionais do APOE4 no envelhecimento do cérebro6 humano e estabelece uma ligação funcional entre APOE4, colesterol5, mielinização e memória, oferecendo oportunidades terapêuticas para a doença de Alzheimer2.

Veja também sobre "Mal de Alzheimer9" e "Envelhecimento cerebral normal ou patológico".

 

Fontes:
Nature, publicação em 16 de novembro de 2022.
Nature, notícia publicada em 16 de novembro de 2022.

 

NEWS.MED.BR, 2022. A variante de risco para Alzheimer APOE4 foi associada ao mau funcionamento da montagem da mielina. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1430645/a-variante-de-risco-para-alzheimer-apoe4-foi-associada-ao-mau-funcionamento-da-montagem-da-mielina.htm>. Acesso em: 19 abr. 2024.

Complementos

1 Fator de risco: Qualquer coisa que aumente a chance de uma pessoa desenvolver uma doença.
2 Doença de Alzheimer: É uma doença progressiva, de causa e tratamentos ainda desconhecidos que acomete preferencialmente as pessoas idosas. É uma forma de demência. No início há pequenos esquecimentos, vistos pelos familiares como parte do processo normal de envelhecimento, que se vão agravando gradualmente. Os pacientes tornam-se confusos e por vezes agressivos, passando a apresentar alterações da personalidade, com distúrbios de conduta e acabam por não reconhecer os próprios familiares e até a si mesmos quando colocados frente a um espelho. Tornam-se cada vez mais dependentes de terceiros, iniciam-se as dificuldades de locomoção, a comunicação inviabiliza-se e passam a necessitar de cuidados e supervisão integral, até mesmo para as atividades elementares como alimentação, higiene, vestuário, etc..
3 Mielina: Bainha, rica em lipídeos e proteínas, que reveste os AXÔNIOS, tanto no sistema nervoso central como no periférico. É um isolante elétrico que permite a condução dos impulsos nervosos de modo mais rápido e energeticamente mais eficiente. É formada pelas membranas de células da glia (CÉLULAS DE SCHWANN no sistema nervoso periférico e OLIGODENDROGLIA no sistema nervoso central). A deterioração desta bainha nas DOENÇAS DESMIELINIZANTES é um sério problema clínico.
4 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
5 Colesterol: Tipo de gordura produzida pelo fígado e encontrada no sangue, músculos, fígado e outros tecidos. O colesterol é usado pelo corpo para a produção de hormônios esteróides (testosterona, estrógeno, cortisol e progesterona). O excesso de colesterol pode causar depósito de gordura nos vasos sangüíneos. Seus componentes são: HDL-Colesterol: tem efeito protetor para as artérias, é considerado o bom colesterol. LDL-Colesterol: relacionado às doenças cardiovasculares, é o mau colesterol. VLDL-Colesterol: representa os triglicérides (um quinto destes).
6 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
7 Degenerativas: Relativas a ou que provocam degeneração.
8 Desmielinizantes: Que remove ou destrói a bainha de mielina de nervo ou trato nervoso.
9 Alzheimer: Doença degenerativa crônica que produz uma deterioração insidiosa e progressiva das funções intelectuais superiores. É uma das causas mais freqüentes de demência. Geralmente começa a partir dos 50 anos de idade e tem incidência similar entre homens e mulheres.
10 Placas: 1. Lesões achatadas, semelhantes à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
11 Cognição: É o conjunto dos processos mentais usados no pensamento, percepção, classificação, reconhecimento e compreensão para o julgamento através do raciocínio para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas.
12 Neurônios: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO. Sinônimos: Células Nervosas
13 Célula: Unidade funcional básica de todo tecido, capaz de se duplicar (porém algumas células muito especializadas, como os neurônios, não conseguem se duplicar), trocar substâncias com o meio externo à célula, etc. Possui subestruturas (organelas) distintas como núcleo, parede celular, membrana celular, mitocôndrias, etc. que são as responsáveis pela sobrevivência da mesma.
14 Histológica: Relativo à histologia, ou seja, relativo à disciplina biomédica que estuda a estrutura microscópica, composição e função dos tecidos vivos.
15 Células-tronco: São células primárias encontradas em todos os organismos multicelulares que retêm a habilidade de se renovar por meio da divisão celular mitótica e podem se diferenciar em uma vasta gama de tipos de células especializadas.
16 Atlas:
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