Gotículas de lipídios de mamíferos são centros imunes inatos que integram o metabolismo celular e a defesa do hospedeiro
Células1 lançam uma bomba sobre patógenos
Os depósitos de gordura2 em nossas células1 também contêm proteínas3 do sistema imunológico4 para combater infecções5.
Gotículas de lipídios (GLs) se acumulam nas células1 para servir como organelas de armazenamento de lipídios. Elas também são uma fonte atraente de nutrientes para muitos patógenos. Bosch et al. mostram que várias proteínas3 envolvidas na imunidade6 inata formam complexos em GLs em resposta ao lipopolissacarídeo bacteriano. Após a ativação, as GLs tornaram-se fisicamente desacopladas da mitocôndria7, levando a uma mudança nas células1 da fosforilação oxidativa para a glicólise aeróbica.
Quando uma bactéria8 infecta uma célula9 animal, ela geralmente se alimenta das gotículas de lipídios. “É uma boa fonte de gordura2 dentro da célula”, diz Robert Parton, da University of Queensland, na Austrália.
Em uma série de experimentos em ratos e células1 humanas, a equipe de Parton descobriu que as gotículas de lipídios carregam uma série de proteínas3 que estão envolvidas na resposta imune. Quando bactérias perigosas entram na célula9, sinais10 químicos de alarme são liberados e ativam as proteínas3 imunológicas nas gotículas de lipídios – que matam qualquer bactéria8 que se aproxime da gotícula.
A célula9 pegou um de seus componentes mais vulneráveis e o transformou em uma arma, diz Parton. “É como uma armadilha de mel”, diz ele. “A célula9 está produzindo essas proteínas3, colocando-as nas gotículas de lipídios e, em seguida, matando as bactérias.”
Este trabalho destaca a capacidade das GLs de matar os patógenos diretamente e de estabelecer um ambiente metabólico favorável à defesa do hospedeiro. Isso pode informar futuras estratégias antimicrobianas na era da resistência aos antibióticos.
Saiba mais sobre "Bactérias", "A resistência aos antibióticos e as superbactérias" e "Diferenças entre inflamação11 e infecção12".
Confira abaixo detalhes do estudo publicado na revista Science.
Em todas as células eucarióticas13, as gotículas de lipídios (GLs) armazenam e fornecem lipídios essenciais para produzir moléculas de sinalização, blocos de construção de membrana e energia metabólica. A monocamada da GL também acomoda proteínas3 não obviamente relacionadas aos lipídios, como fatores de transcrição, componentes da cromatina14 e proteínas3 tóxicas.
Parasitas comuns (como tripanossomos e Plasmodium falciparum), bactérias (como micobactérias e Chlamydia) e vírus15 (como hepatite16 C e dengue17) induzem e visam as GLs durante seus ciclos de vida. A visão18 atual é que as GLs suportam a infecção12, fornecendo aos microrganismos substratos para um crescimento eficaz.
A defesa inata bem-sucedida é crítica para a sobrevivência19, e as espécies hospedeiras co-evoluíram com eficiência com os patógenos para desenvolver uma infinidade de respostas imunológicas. Múltiplos sinais10, incluindo estresse celular e padrões moleculares associados ao perigo, como lipopolissacarídeos (LPS), induzem a formação da GL. Assim, a localização e a dinâmica da GL podem ser potencialmente vantajosas para organizar uma defesa intracelular do hospedeiro. Nesse estudo, investigou-se a possibilidade de que as GLs de mamíferos tenham um papel direto e regulado na imunidade6 inata.
Mostrou-se que as GLs de mamíferos são dotadas de uma capacidade antimicrobiana mediada por proteínas3, que é regulada positivamente durante a sepse20 polimicrobiana e por LPS. A microscopia óptica e eletrônica demonstrou associação específica de GLs e bactérias em macrófagos21 humanos, sugerindo a existência de mecanismos de acoplagem que facilitam o engajamento de proteínas3 antibacterianas da GL com bactérias.
Um perfil de espectrometria de massa comparativo de proteínas3 diferencialmente associadas com GLs em resposta a LPS (LPS-GLs) revelou a profunda remodelação do proteoma da organela. Uma avaliação rigorosa identificou 689 proteínas3 reguladas diferencialmente em LPS-GLs (317 enriquecidas e 372 reduzidas). A análise através do software Ingenuity Pathway Analysis revelou um enriquecimento de componentes relacionados ao sistema imunológico4 inato e redução de proteínas3 residentes na GL relacionadas ao metabolismo22. Análises adicionais sugeriram que as GLs servem como centros imunes inatos, integrando as principais respostas imunes intra e extracelulares.
Entre os cinco membros da família perilipina de proteínas3 de superfície da GL (PLINs), PLIN5 foi a única regulada negativamente em LPS-GLs. A redução de PLIN5 promoveu a desconexão física e funcional de LPS-GLs e mitocôndrias23, com redução concomitante do metabolismo22 oxidativo e cetogênese. A reexpressão forçada de PLIN5 aumentou o número de contatos GL-mitocôndria7, reduzindo as interações GL-bactérias e comprometendo a capacidade antimicrobiana das células1.
Em contraste, PLIN2 foi o PLIN mais regulado em LPS-GLs. A análise de interação de genes revelou que várias proteínas3 imunes se nuclearam em torno do PLIN2 em resposta ao LPS. LPS-GLs acumularam várias proteínas3 induzíveis por interferon, como viperina, IGTP, IIGP1, TGTP1 e IFI47. Além disso, LPS-GLs também acumularam catelicidina (CAMP), um peptídeo antimicrobiano de amplo espectro com propriedades quimiotáticas. As células1 que superexpressam um CAMP associado à GL foram mais resistentes a diferentes espécies bacterianas, incluindo Escherichia coli, Staphylococcus aureus resistente à meticilina e Listeria monocytogenes.
Esses resultados demonstram que as GLs formam uma defesa intracelular de primeira linha. Elas agem como um interruptor molecular na imunidade6 inata, respondendo a sinais10 de perigo por meio da reprogramação do metabolismo22 celular e da provocação de mecanismos antimicrobianos mediados por proteínas3.
Mecanismos de tráfego e acoplamento de GL com membranas fagocíticas e parasitóforas, aqui observados e descritos para vários patógenos, podem facilitar a entrega de proteínas3 imunes localizadas na superfície da GL. GLs intracelulares podem fornecer às células1 infectadas vários benefícios biológicos, servindo como um local para atrair patógenos, bem como coordenar diferentes sistemas imunológicos que operam simultaneamente contra diferentes classes de patógenos. As GLs também podem sequestrar compostos citotóxicos24 (como peptídeos antimicrobianos), reduzindo os danos a outras organelas celulares.
Tendo em vista a ampla resistência aos antibióticos atuais, este estudo ajuda a decifrar os mecanismos moleculares envolvidos na defesa antimicrobiana que podem ser explorados para o desenvolvimento de novos agentes anti-infecciosos.
Leia sobre "Usos e abusos dos antibióticos", "Agentes infecciosos" e "Infecções5 oportunistas".
Fontes:
Science, publicação em 16 de outubro de 2020.
New Scientist, notícia publicada em 15 de outubro de 2020.