Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina é concedido a trabalhos sobre o sistema imunológico: pesquisas descobriram as células T reguladoras
Mary E. Brunkow, Fred Ramsdell e Shimon Sakaguchi receberam o Prêmio Nobel de Fisiologia1 ou Medicina em 2025 por suas descobertas sobre a tolerância imune periférica, o sistema que explica como o sistema imunológico2 impede que células3 imunes autorreativas ataquem tecidos e órgãos.
Segundo o comitê do prêmio, suas pesquisas contribuíram para avanços médicos em tratamentos contra o câncer4 e doenças autoimunes5, e podem auxiliar em transplantes de órgãos.
“Este é um prêmio que eu estava esperando”, disse o Dr. Alexander Marson, diretor do Gladstone-UCSF Institute of Genomic Immunology, em São Francisco, Califórnia, nos EUA. Encontrar “uma população de células3 T que havia sido ignorada e que mantém o sistema imunológico2 em equilíbrio” foi central, disse ele, para a compreensão de doenças autoimunes5 e cânceres.
Os três pesquisadores dividirão um prêmio de 11 milhões de coroas suecas, ou cerca de US$ 1,17 milhão.
Por que eles receberam o prêmio?
No centro da pesquisa dos cientistas estavam suas descobertas sobre as células3 T, os glóbulos brancos que combatem infecções6 no corpo. Eles identificaram uma classe de células3, as células3 T reguladoras, e os genes que as controlam.
Ao fazer isso, responderam a perguntas biológicas intrigantes: como o sistema imunológico2 sabe que deve evitar atacar as células3 saudáveis do próprio corpo? E se, por engano, algumas células3 do sistema imunológico2 não captam a mensagem, como essas células3 são impedidas de causar estragos?
O comitê classificou o trabalho deles como “fundamental” para a compreensão do funcionamento do sistema imunológico2 do corpo.
Em uma entrevista após o anúncio do prêmio, Rickard Sandberg, professor do departamento de biologia celular e molecular do Instituto Karolinska, na Suécia, e membro do comitê do prêmio, disse que a pesquisa havia fornecido uma “nova abordagem” sobre como abordar doenças autoimunes5, tratamentos e transplantes de órgãos.
Há mais de 200 ensaios clínicos7 em andamento que se baseiam nas pesquisas desses cientistas, disse ele.
Leia sobre: "Conhecendo o sistema imunológico2" e "Células3 do sistema imunológico2: funções, classificações e origem".
Como eles fizeram essa descoberta?
O Dr. Sakaguchi, agora um renomado professor da Universidade de Osaka, no Japão, desvendou um mistério médico envolvendo o timo8, um pequeno órgão localizado atrás do esterno9. Ele separa as células3 imunológicas que podem atacar os tecidos e órgãos do próprio corpo e as impede de entrar na corrente sanguínea.
Ele estudou o órgão pela primeira vez como estudante na década de 1970 e, em seguida, realizou pesquisas nos Estados Unidos na década de 1980. Seus colegas haviam feito um experimento que não fazia sentido. Nos primeiros dias após o nascimento de um camundongo, o timo8 supostamente treina o sistema imunológico2, impedindo que as células3 T que poderiam atacar o corpo entrem na corrente sanguínea.
Neste experimento, pesquisadores removeram o timo8 de camundongos três dias após o nascimento dos animais.
Em teoria, o órgão deveria ter cumprido sua função durante esses três dias. As células3 T nocivas nunca deveriam ter tido a chance de chegar aos tecidos e órgãos do corpo. Em vez disso, aconteceu o oposto, o sistema imunológico2 enlouqueceu, atacando os órgãos.
Mas por quê?
Após mais de uma década de trabalho, o Dr. Sakaguchi descobriu que o timo8 não impedia que todas as células3 nocivas escapassem para a circulação10. Portanto, embora a maioria dessas células3 estivesse bloqueada nos camundongos, o suficiente conseguiu escapar e atacar os próprios tecidos do corpo.
Mas, o timo8 teria resolvido o problema se não tivesse sido removido tão cedo. O sistema imunológico2, ele descobriu, tem um sistema de backup, um conjunto de células3 imunológicas que impedem ataques equivocados. Esse backup envolvia uma nova classe de células3 T, que ele chamou de células3 T reguladoras. Os camundongos cujos timos foram removidos após três dias não tiveram a chance de desenvolver as células3 T reguladoras.
Mas quais genes controlam esse sistema?
A resposta veio da Dra. Brunkow e do Dr. Ramsdell, que trabalhavam na então empresa de biotecnologia britânica nos arredores de Seattle, EUA, a Celltech Chiroscience. Eles decidiram estudar uma linhagem de camundongos que desenvolveu uma doença autoimune11 terrível. O ataque do sistema imunológico2 às suas próprias células3 foi tão severo que os camundongos viveram apenas algumas semanas.
Os camundongos não tinham um conjunto de instruções genéticas. Em um indivíduo saudável, essas instruções informam às células3 T do sistema imunológico2 para conter o ataque quando entram no sistema circulatório12 geral.
Após anos de trabalho árduo, os dois pesquisadores encontraram o gene, chamado FOXP3. Ele se assemelhava a outros que controlam outros genes. E, em 2001, eles relataram que uma doença autoimune11 rara em humanos, chamada IPEX, era a mesma doença em camundongos.
Sem o FOXP3, as células3 T reguladoras não se formam. O corpo não produz células3 T que informam outras células3 T que podem atacar as células3 do corpo para não responderem.
“Este é um grande reconhecimento da importância fundamental de distinguir o próprio do não próprio”, disse John Wherry, diretor do Centro Colton de Autoimunidade13 da Universidade da Pensilvânia, nos EUA.
Os cânceres bloqueiam os ataques do sistema imunológico2 atraindo um emaranhado de células3 T reguladoras. Com o gene FOXP3 identificado e seu papel compreendido, os pesquisadores podem desenvolver medicamentos para direcionar o sistema imunológico2 contra essas células3 cancerígenas.
Com as doenças autoimunes5, o problema é o oposto. As células3 T reguladoras estão ausentes ou defeituosas. Usando o FOXP3 como ponto de partida, os pesquisadores estão desenvolvendo medicamentos para ensinar o sistema imunológico2 a interromper seu ataque.
A Dra. Marcela Maus, diretora do programa de imunoterapia celular do Hospital Geral de Massachusetts, afirmou que o trabalho “tem um enorme potencial para abrir novos caminhos terapêuticos na medicina.”
“O Santo Graal tem sido conseguir manipular e controlar a imunidade14 versus a tolerância”, disse a Dra. Maus. “O trabalho desses laureados desbloqueou o lado da tolerância dessa equação.”
Com as descobertas, disse o Dr. Wherry, “grandes conjuntos de medicamentos estão chegando à clínica” para testes preliminares em câncer4 e autoimunidade13.
Quem são os laureados?
O Dr. Sakaguchi é especialista em imunologia pela Universidade de Osaka. Ele nasceu na cidade de Nagahama, a cerca de 96 quilômetros a nordeste de Kyoto. Quando criança, interessava-se por arte e filosofia, mas seu pai, um professor do ensino médio, o incentivou a seguir a carreira científica. Matriculou-se na Universidade de Kyoto, onde se interessou por imunologia. Na década de 1980, trabalhou como pesquisador na Universidade Johns Hopkins e na Universidade de Stanford, entre outras instituições, antes de retornar ao Japão.
A Dra. Brunkow ingressou no Instituto de Biologia de Sistemas em Seattle em 2009, onde estuda genômica e doenças autoimunes5. Ela obteve seu doutorado em biologia molecular pela Universidade de Princeton.
O Dr. Ramsdell é consultor científico da Sonoma Biotherapeutics, empresa sediada em São Francisco da qual foi co-fundador. Ele possui um doutorado em imunologia pela Universidade da Califórnia, em Los Angeles. Antes de ingressar na SonomaBio, ele foi executivo sênior15 em várias outras empresas de biotecnologia.
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Fonte: The New York Times, notícia publicada em 06 de outubro de 2025.