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Novas evidências relacionam o risco de demência ao sistema glinfático, que elimina resíduos do cérebro

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Uma análise de dados do UK Biobank, do Reino Unido, mostrou que a movimentação prejudicada do líquido cefalorraquidiano1 (LCR) no sistema glinfático previu o risco de demência2.

Três indicadores da dinâmica do LCR (acoplamento entre o sinal3 BOLD [blood oxygen level-dependent] e o LCR [BOLD-LCR]; análise de imagem por tensor de difusão ao longo do espaço perivascular [DTI-ALPS]; e volume do plexo coroide4) foram associados à incidência5 de demência2 ao longo de cerca de 5 anos, relataram Hugh Markus, MD, da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e seus co-autores.

O volume do plexo coroide4 e a DTI-ALPS mediaram as associações entre hiperintensidades da substância branca e diabetes6 com a demência2, escreveram os pesquisadores na revista Alzheimer7's & Dementia.

“Já sabemos da importância dos fatores de risco cardiovascular quando se trata de demência2, e nossas descobertas reforçam ainda mais essa ligação”, disse Markus em um comunicado.

“Pelo menos um quarto de todo o risco de demência2 é atribuído a fatores de risco comuns, como pressão arterial8 e tabagismo”, continuou Markus. “Se esses fatores comprometem a função glinfática, podemos intervir. Tratar a hipertensão9 ou incentivar as pessoas a parar de fumar seria uma maneira viável de ajudar o sistema glinfático a funcionar melhor.”

Leia sobre "Líquor10 - o que pode revelar sua análise", "Demência2" e "Mal de Alzheimer7".

O sistema glinfático foi identificado em 2012 como uma rede de espaços perivasculares que ajuda a eliminar resíduos metabólicos através do líquido cefalorraquidiano1 e do fluido intersticial11, principalmente durante o sono profundo.

A dinâmica do LCR foi prejudicada em modelos animais tanto da doença de Alzheimer12 quanto da demência2 vascular13. Em camundongos, a disfunção na dinâmica do LCR precedeu os depósitos de amiloide, sugerindo que ela pode ter um papel nos estágios iniciais da doença de Alzheimer12.

Em humanos, diversas medidas de ressonância magnética14 (RM) (volume do espaço perivascular, DTI-ALPS, acoplamento BOLD-LCR e volume do plexo coroide4) são propostas como biomarcadores para a dinâmica do LCR. A DTI-ALPS mede a difusão de moléculas de água ao longo dos espaços perivasculares; o acoplamento BOLD-LCR reflete a velocidade do fluxo do LCR para o cérebro15.

O objetivo do estudo foi examinar as associações entre esses indicadores da dinâmica do LCR baseados em ressonância magnética14 e a incidência5 de demência2, e se a disfunção do LCR medeia as ligações entre o risco cardiovascular e a demência2.

Markus e seus co-autores avaliaram dados de 44.384 pessoas em um subestudo de imagem do UK Biobank do Reino Unido. Pessoas com histórico de demência2 de Alzheimer7, demência2 vascular13, demência2 frontotemporal e outros distúrbios relacionados ao cérebro15 foram excluídas. Os pesquisadores utilizaram métodos automatizados para quantificar a DTI-ALPS e o acoplamento BOLD-LCR.

A mediana de idade da coorte16 foi de 65 anos e 47,9% eram homens. Avaliou-se os fatores de risco cardiovascular e suas associações com a dinâmica do LCR e a demência2 com base em registros de médicos de clínica geral, mortalidade17 e internações hospitalares. A análise de mediação avaliou a disfunção do LCR nas relações entre risco cardiovascular e demência2.

Ao longo de uma mediana de 5,3 anos de acompanhamento, ocorreram 133 casos (0,3%) de demência2 incidente18.

O volume do espaço perivascular não previu demência2. Uma DTI-ALPS mais elevada (HR 0,866, IC 95% 0,797-0,942, P = 0,001) foi associada a um menor risco de demência2 incidente18. Um maior volume do plexo coroide4 (HR 1,185, IC 95% 1,088-1,291, P <0,001) e um baixo acoplamento BOLD-LCR (HR 0,875, IC 95% 0,806-0,951, P=0,001) foram preditores de demência2.

Análises adicionais mostraram que diversos fatores de risco cardiovascular estavam associados à disfunção glinfática, em parte por causarem doença dos pequenos vasos cerebrais.

O estudo demonstrou, portanto, que a dinâmica prejudicada do LCR pode levar à demência2 e mediar parcialmente as associações entre risco cardiovascular e demência2.

“Já temos evidências de que a doença dos pequenos vasos cerebrais acelera doenças como o Alzheimer7, e agora temos uma explicação provável para isso”, disse o co-autor Hui Hong, MD, do Segundo Hospital Afiliado da Universidade de Zhejiang, em Hangzhou, China. “A disfunção do sistema glinfático provavelmente prejudica nossa capacidade de eliminar do cérebro15 a amiloide e a proteína tau que causam a doença de Alzheimer12.”

A análise apresentou algumas limitações, observaram os pesquisadores. O tamanho da amostra foi muito pequeno para analisar a dinâmica do LCR por subtipo de demência2. O estudo não pôde determinar o quão bem os fatores de risco cardiovascular foram controlados e se isso influenciou os resultados, reconheceram Markus e seus colegas.

O período limitado de acompanhamento também pode ter restringido a capacidade de identificar relações entre a dinâmica do LCR e condições de desenvolvimento lento, como a demência2.

Veja também sobre "Doenças cardiovasculares19" e "Doenças cerebrovasculares".

 

Fontes:
Alzheimer’s & Dementia, publicação em 23 de outubro de 2025.
MedPage Today, notícia publicada em 29 de outubro de 2025.

 

NEWS.MED.BR, 2025. Novas evidências relacionam o risco de demência ao sistema glinfático, que elimina resíduos do cérebro. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1497335/novas-evidencias-relacionam-o-risco-de-demencia-ao-sistema-glinfatico-que-elimina-residuos-do-cerebro.htm>. Acesso em: 19 nov. 2025.

Complementos

1 Líquido cefalorraquidiano: Líquido cefalorraquidiano (LCR), também conhecido como líquor ou fluido cérebro espinhal, é definido como um fluido corporal estéril, incolor, encontrado no espaço subaracnoideo no cérebro e na medula espinhal (entre as meninges aracnoide e pia-máter). Caracteriza-se por ser uma solução salina pura, com baixo teor de proteínas e células, atuando como um amortecedor para o córtex cerebral e a medula espinhal. Possui também a função de fornecer nutrientes para o tecido nervoso e remover resíduos metabólicos do mesmo. É sintetizado pelos plexos coroidais, epitélio ventricular e espaço subaracnoideo em uma taxa de aproximadamente 20 mL/hora. Em recém-nascidos, este líquido é encontrado em um volume que varia entre 10 a 60 mL, enquanto que no adulto fica entre 100 a 150 mL.
2 Demência: Deterioração irreversível e crônica das funções intelectuais de uma pessoa.
3 Sinal: 1. É uma alteração percebida ou medida por outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, sem o relato ou comunicação do paciente. Por exemplo, uma ferida. 2. Som ou gesto que indica algo, indício. 3. Dinheiro que se dá para garantir um contrato.
4 Plexo coroide: É uma estrutura anatômica encontrada nos ventrículos do sistema nervoso onde é produzida a maior parte do líquido cefalorraquidiano ou líquor. É resultado de invaginação do teto do epêndima para a cavidade ventricular.
5 Incidência: Medida da freqüência em que uma doença ocorre. Número de casos novos de uma doença em um certo grupo de pessoas por um certo período de tempo.
6 Diabetes: Nome que designa um grupo de doenças caracterizadas por diurese excessiva. A mais frequente é o Diabetes mellitus, ainda que existam outras variantes (Diabetes insipidus) de doença nas quais o transtorno primário é a incapacidade dos rins de concentrar a urina.
7 Alzheimer: Doença degenerativa crônica que produz uma deterioração insidiosa e progressiva das funções intelectuais superiores. É uma das causas mais freqüentes de demência. Geralmente começa a partir dos 50 anos de idade e tem incidência similar entre homens e mulheres.
8 Pressão arterial: A relação que define a pressão arterial é o produto do fluxo sanguíneo pela resistência. Considerando-se a circulação como um todo, o fluxo total é denominado débito cardíaco, enquanto a resistência é denominada de resistência vascular periférica total.
9 Hipertensão: Condição presente quando o sangue flui através dos vasos com força maior que a normal. Também chamada de pressão alta. Hipertensão pode causar esforço cardíaco, dano aos vasos sangüíneos e aumento do risco de um ataque cardíaco, derrame ou acidente vascular cerebral, além de problemas renais e morte.
10 Líquor: Líquido cefalorraquidiano (LCR), também conhecido como líquor ou fluido cérebro espinhal, é definido como um fluido corporal estéril, incolor, encontrado no espaço subaracnoideo no cérebro e na medula espinhal (entre as meninges aracnoide e pia-máter). Caracteriza-se por ser uma solução salina pura, com baixo teor de proteínas e células, atuando como um amortecedor para o córtex cerebral e a medula espinhal. Possui também a função de fornecer nutrientes para o tecido nervoso e remover resíduos metabólicos do mesmo. É sintetizado pelos plexos coroidais, epitélio ventricular e espaço subaracnoideo em uma taxa de aproximadamente 20 mL/hora. Em recém-nascidos, este líquido é encontrado em um volume que varia entre 10 a 60 mL, enquanto que no adulto fica entre 100 a 150 mL.
11 Intersticial: Relativo a ou situado em interstícios, que são pequenos espaços entre as partes de um todo ou entre duas coisas contíguas (por exemplo, entre moléculas, células, etc.). Na anatomia geral, diz-se de tecido de sustentação localizado nos interstícios de um órgão, especialmente de vasos sanguíneos e tecido conjuntivo.
12 Doença de Alzheimer: É uma doença progressiva, de causa e tratamentos ainda desconhecidos que acomete preferencialmente as pessoas idosas. É uma forma de demência. No início há pequenos esquecimentos, vistos pelos familiares como parte do processo normal de envelhecimento, que se vão agravando gradualmente. Os pacientes tornam-se confusos e por vezes agressivos, passando a apresentar alterações da personalidade, com distúrbios de conduta e acabam por não reconhecer os próprios familiares e até a si mesmos quando colocados frente a um espelho. Tornam-se cada vez mais dependentes de terceiros, iniciam-se as dificuldades de locomoção, a comunicação inviabiliza-se e passam a necessitar de cuidados e supervisão integral, até mesmo para as atividades elementares como alimentação, higiene, vestuário, etc..
13 Vascular: Relativo aos vasos sanguíneos do organismo.
14 Ressonância magnética: Exame que fornece imagens em alta definição dos órgãos internos do corpo através da utilização de um campo magnético.
15 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
16 Coorte: Grupo de indivíduos que têm algo em comum ao serem reunidos e que são observados por um determinado período de tempo para que se possa avaliar o que ocorre com eles. É importante que todos os indivíduos sejam observados por todo o período de seguimento, já que informações de uma coorte incompleta podem distorcer o verdadeiro estado das coisas. Por outro lado, o período de tempo em que os indivíduos serão observados deve ser significativo na história natural da doença em questão, para que haja tempo suficiente do risco se manifestar.
17 Mortalidade: A taxa de mortalidade ou coeficiente de mortalidade é um dado demográfico do número de óbitos, geralmente para cada mil habitantes em uma dada região, em um determinado período de tempo.
18 Incidente: 1. Que incide, que sobrevém ou que tem caráter secundário; incidental. 2. Acontecimento imprevisível que modifica o desenrolar normal de uma ação. 3. Dificuldade passageira que não modifica o desenrolar de uma operação, de uma linha de conduta.
19 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
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