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Novo estudo investigou como os óvulos humanos permanecem frescos por décadas

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Nos seres humanos, os óvulos precisam sobreviver por cerca de cinco décadas, muito mais do que a maioria dos outros tipos de células1, e podem atingir essa vida útil excepcionalmente longa desacelerando seus processos celulares naturais.

Um estudo publicado no periódico científico The EMBO Journal mostra que os óvulos humanos parecem eliminar seus resíduos mais lentamente do que outras células1, o que pode ajudá-los a evitar o desgaste e explicar por que vivem mais.

Toda mulher nasce com um número finito de óvulos, ou ovócitos, que precisam sobreviver por cerca de cinco décadas. Para as células1, esse é um tempo anormalmente longo. Embora algumas células1 humanas, como as do cérebro2 e dos olhos3, possam viver tanto quanto você, a maioria tem uma vida útil muito mais curta, em parte porque os processos naturais que permitem seu funcionamento também as danificam com o tempo.

As células1 precisam reciclar suas proteínas4 como uma forma de manutenção necessária, mas isso tem um custo. A energia consumida nesse processo pode gerar moléculas chamadas espécies reativas de oxigênio, ou EROs, que causam danos aleatórios na célula5. “Esse dano acontece em segundo plano o tempo todo”, diz Elvan Böke, do Centro de Regulação Genômica da Espanha. “Quanto mais EROs houver, maior será o dano.”

Leia sobre "Alguns conceitos ligados à reprodução6 humana", "Infertilidade7 feminina" e "Climatério8 e menopausa9: como são".

Mas óvulos saudáveis parecem evitar esse problema. Para descobrir o porquê, Böke e seus colegas estudaram óvulos humanos coletados sob um microscópio. As células1 foram colocadas em um líquido com corantes fluorescentes, que se ligam a componentes celulares ácidos, chamados lisossomos, que se comportam como “usinas de reciclagem”, diz Gabriele Zaffagnini, da Universidade de Colônia, na Alemanha.

O corante brilhante revelou que os lisossomos de descarte de resíduos em óvulos humanos eram menos ativos do que os mesmos componentes em outros tipos de células1 humanas ou aqueles em óvulos de mamíferos menores, como camundongos. Zaffagnini e seus colegas afirmam que isso pode ser uma forma de autopreservação.

Desacelerar seu mecanismo de descarte de resíduos pode ser apenas uma das muitas maneiras pelas quais os óvulos humanos alcançam sua vida útil relativamente longa, diz Zaffagnini. Böke especula que, para evitar danos, os ovócitos humanos “travam tudo”. Se todos os processos celulares ocorrerem mais lentamente em óvulos humanos, diz ela, isso poderia resultar em níveis mais baixos de EROs prejudiciais e, portanto, menos risco de danos.

Como atrasar o processo de reciclagem de proteínas4 parece ajudar os óvulos a manterem sua saúde10, não fazê-lo pode explicar o que torna alguns ovócitos doentes. “Na minha opinião, isso pode ser uma pista sobre por que os ovócitos humanos realmente se tornam disfuncionais11 após um certo tempo”, diz Emre Seli, da Faculdade de Medicina de Yale. “Pode ser uma transição para uma avaliação avançada de tudo o que dá errado nos ovócitos humanos”, afirma.

Avaliar a saúde10 dos óvulos dessa forma pode, eventualmente, aprimorar os tratamentos de fertilidade. “Sabemos que a degradação de proteínas4 é essencial para a sobrevivência12 celular, portanto, afeta 100% a fertilidade”, diz Böke. Ela observa que o estudo se concentrou em óvulos saudáveis, e que o trabalho para comparar essas células1 com óvulos de pessoas afetadas por complicações de fertilidade está em andamento. “Se houver alto teor de EROs na célula5, os resultados da fertilização13 in vitro são ruins”, afirma.

Os óvulos humanos ainda não são bem compreendidos, pois são difíceis de estudar. “Eles são difíceis de trabalhar, porque a limitação da amostra é um problema”, diz Böke. Seli afirma que esse obstáculo é uma das “múltiplas camadas” do problema, que também incluem regulamentações que restringem o estudo de óvulos e a falta de financiamento.

Se esses obstáculos puderem ser superados, diz Zaffagnini, pode haver resultados “realmente surpreendentes”. “Vale muito a pena”, afirma.

Veja também sobre "Ciclo menstrual", "Indutores da ovulação14" e "Ovulação14: entenda o fenômeno da arborização".

No artigo publicado, os pesquisadores relatam o panorama proteostático de ovócitos humanos saudáveis.

Eles contextualizam que os ovócitos, células germinativas15 femininas que se desenvolvem em óvulos, estão entre as células1 com maior longevidade no corpo animal. Estudos recentes com ovócitos de camundongos destacam adaptações únicas na homeostase proteica (proteostase) dentro dessas células1. No entanto, os mecanismos de proteostase em ovócitos humanos permanecem praticamente inexplorados.

Apresentou-se então o primeiro estudo em larga escala da atividade proteostática em ovócitos humanos utilizando mais de 100 ovócitos recém-doados de 21 mulheres saudáveis com idades entre 19 e 34 anos. Analisou-se a atividade e a distribuição de lisossomos, proteassomas e mitocôndrias16 em ovócitos imaturos e maduros.

Notavelmente, os ovócitos humanos apresentam atividade proteolítica quase duas vezes menor do que as células somáticas17 circundantes, com reduções adicionais à medida que os ovócitos amadurecem. A maturação dos ovócitos também está associada à exocitose18 lisossomal e à diminuição do potencial de membrana mitocondrial.

Propõe-se que a atividade reduzida de organelas preserva componentes celulares essenciais para o desenvolvimento embrionário inicial durante a maturação prolongada de ovócitos humanos.

Essas descobertas destacam a biologia distinta dos ovócitos humanos e a necessidade de investigar a biologia reprodutiva específica de humanos para enfrentar os desafios da fertilidade feminina.

 

Fontes:
The EMBO Journal, publicação em 16 de julho de 2025.
New Scientist, notícia publicada em 16 de julho de 2025.

 

NEWS.MED.BR, 2025. Novo estudo investigou como os óvulos humanos permanecem frescos por décadas. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1492975/novo-estudo-investigou-como-os-ovulos-humanos-permanecem-frescos-por-decadas.htm>. Acesso em: 14 ago. 2025.

Complementos

1 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
2 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
3 Olhos:
4 Proteínas: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Alimentos que fornecem proteína incluem carne vermelha, frango, peixe, queijos, leite, derivados do leite, ovos.
5 Célula: Unidade funcional básica de todo tecido, capaz de se duplicar (porém algumas células muito especializadas, como os neurônios, não conseguem se duplicar), trocar substâncias com o meio externo à célula, etc. Possui subestruturas (organelas) distintas como núcleo, parede celular, membrana celular, mitocôndrias, etc. que são as responsáveis pela sobrevivência da mesma.
6 Reprodução: 1. Função pela qual se perpetua a espécie dos seres vivos. 2. Ato ou efeito de reproduzir (-se). 3. Imitação de quadro, fotografia, gravura, etc.
7 Infertilidade: Capacidade diminuída ou ausente de gerar uma prole. O termo não implica a completa inabilidade para ter filhos e não deve ser confundido com esterilidade. Os clínicos introduziram elementos físicos e temporais na definição. Infertilidade é, portanto, freqüentemente diagnosticada quando, após um ano de relações sexuais não protegidas, não ocorre a concepção.
8 Climatério: Conjunto de mudanças adaptativas que são produzidas na mulher como conseqüência do declínio da função ovariana na menopausa. Consiste em aumento de peso, “calores” freqüentes, alterações da distribuição dos pêlos corporais, dispareunia.
9 Menopausa: Estado fisiológico caracterizado pela interrupção dos ciclos menstruais normais, acompanhada de alterações hormonais em mulheres após os 45 anos.
10 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
11 Disfuncionais: 1. Funcionamento anormal ou prejudicado. 2. Em patologia, distúrbio da função de um órgão.
12 Sobrevivência: 1. Ato ou efeito de sobreviver, de continuar a viver ou a existir. 2. Característica, condição ou virtude daquele ou daquilo que subsiste a um outro. Condição ou qualidade de quem ainda vive após a morte de outra pessoa. 3. Sequência ininterrupta de algo; o que subsiste de (alguma coisa remota no tempo); continuidade, persistência, duração.
13 Fertilização: Contato entre espermatozóide e ovo, determinando sua união.
14 Ovulação: Ovocitação, oocitação ou ovulação nos seres humanos, bem como na maioria dos mamíferos, é o processo que libera o ovócito II em metáfase II do ovário. (Em outras espécies em vez desta célula é liberado o óvulo.) Nos dias anteriores à ovocitação, o folículo secundário cresce rapidamente, sob a influência do FSH e do LH. Ao mesmo tempo que há o desenvolvimento final do folículo, há um aumento abrupto de LH, fazendo com que o ovócito I no seu interior complete a meiose I, e o folículo passe ao estágio de pré-ovocitação. A meiose II também é iniciada, mas é interrompida em metáfase II aproximadamente 3 horas antes da ovocitação, caracterizando a formação do ovócito II. A elevada concentração de LH provoca a digestão das fibras colágenas em torno do folículo, e os níveis mais altos de prostaglandinas causam contrações na parede ovariana, que provocam a extrusão do ovócito II.
15 Células Germinativas: São as células responsáveis pela reprodução sexuada e contêm metade do número total de cromossomos de uma espécie. Os espermatozoides (homem) e os ovócitos (mulher) são células germinativas.
16 Mitocôndrias: Organelas semi-autônomas que se auto-reproduzem, encontradas na maioria do citoplasma de todas as células, mas não de todos os eucariotos. Cada mitocôndria é envolvida por uma membrana dupla limitante. A membrana interna é altamente invaginada e suas projeções são denominadas cristas. As mitocôndrias são os locais das reações de fosforilação oxidativa, que resultam na formação de ATP. Elas contêm RIBOSSOMOS característicos, RNA DE TRANSFERÊNCIA, AMINOACIL-T RNA SINTASES e fatores de alongação e terminação. A mitocôndria depende dos genes contidos no núcleo das células no qual se encontram muitos RNAs mensageiros essenciais (RNA MENSAGEIRO). Acredita-se que a mitocôndria tenha se originado a partir de bactérias aeróbicas que estabeleceram uma relação simbiótica com os protoeucariotos primitivos.
17 Células somáticas: As células somáticas são quaisquer células dos organismos multicelulares que não estejam diretamente envolvidas na reprodução, tais como as células epiteliais. São células cujo núcleo se divide apenas por mitose, ao contrário das células germinativas, que podem sofrer meiose, para formar os gametas.
18 Exocitose: Processo ativo no qual o material intracelular é transportado, através de vesículas, para o meio extracelular.
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