Gostou do artigo? Compartilhe!

Alzheimer pode ser causado por acúmulo de gordura nas células cerebrais

A+ A- Alterar tamanho da letra
Avalie esta notícia

Uma nova compreensão da doença de Alzheimer1 sugere que a causa raiz envolve um acúmulo de gotículas de gordura2 nas células3 cerebrais.

De acordo com um estudo, publicado na revista Nature, o maior fator de risco4 genético para a doença de Alzheimer1 parece levar ao acúmulo de gotículas de gordura2 nas células3 imunológicas do cérebro5, destacando uma possível causa da doença que tem sido negligenciada.

Visar essas gotículas poderia levar a tratamentos mais eficazes do que a estratégia atual de medicamentos que têm como alvo as proteínas6, diz Michael Haney, da Universidade da Pensilvânia. “Isso abre um novo caminho para o desenvolvimento terapêutico”, diz ele.

Leia sobre "A importância das gorduras para o organismo" e "Genética - conceitos básicos".

A explicação mais comum para a doença de Alzheimer1 é que ela é causada pelo acúmulo de uma proteína chamada beta-amiloide nas placas7 entre as células nervosas8. Outro suspeito é o acúmulo de emaranhados feitos de uma proteína diferente, chamada tau, armazenada dentro das células nervosas8.

As discussões sobre qual dessas duas proteínas6 é a principal culpada já duram décadas. A hipótese da amiloide está atualmente na liderança, uma vez que alguns tratamentos com anticorpos9 que livram o cérebro5 dela demonstraram recentemente uma eficácia modesta no abrandamento da perda de memória em pessoas com Alzheimer10.

Mas este debate ignora o fato de que gotículas de gordura2 também podem ser vistas nos cérebros de pessoas que morreram da doença, diz Haney. Essas gotículas foram descritas pela primeira vez por Alois Alzheimer10, um médico alemão que deu o seu nome à doença no início do século XX, quando notou placas7 amiloides, emaranhados de tau e gotículas de gordura2 presentes no cérebro5 de pessoas que tinham Alzheimer10. Mas durante décadas a gordura2 foi quase sempre esquecida.

No último estudo, Haney estava investigando o maior fator de risco4 genético para a doença de Alzheimer1: um gene chamado APOE. A proteína que ele codifica ajuda a transportar gordura2 para dentro e para fora das células3.

As pessoas têm diferentes variantes deste gene, chamadas APOE2, 3 e 4. Destas, a APOE2 traz o menor risco de desenvolver Alzheimer10, enquanto a APOE4 traz o maior – embora até agora não estivesse claro o porquê.

Para esclarecer melhor, Haney e seus colegas realizaram uma série de experimentos enquanto ele trabalhava na Universidade de Stanford, na Califórnia. Primeiro, a equipe usou uma técnica relativamente recente chamada sequenciamento de RNA de célula11 única para identificar quais proteínas6 estavam sendo produzidas em células3 individuais. Eles aplicaram isso a amostras de tecidos de pessoas que morreram de doença de Alzheimer1, que tinham duas cópias da variante APOE4 ou duas cópias da APOE3.

Isso mostrou que a principal diferença nas pessoas com APOE4 é que as células3 imunológicas no cérebro5 tinham níveis mais elevados de uma determinada enzima12, cujo efeito era aumentar as gotículas de gordura2 nessas células3.

Numa experiência adicional, a equipe cresceu esse tipo de célula11 imunológica cerebral – chamada micróglia – numa placa13, utilizando células3 de pessoas vivas com variante APOE4 ou APOE3. A aplicação de proteína amiloide nas células3 fazia com que acumulassem gordura2, principalmente se tivessem a variante APOE4.

A equipe concluiu que, no Alzheimer10, o acúmulo de amiloide desencadeia o acúmulo de gordura2. Isso leva ao acúmulo de tau dentro dos neurônios14, o que causa a morte celular e, portanto, leva aos sintomas15 de perda de memória e confusão.

Estudos anteriores descobriram que outros genes que aumentam o risco de Alzheimer10, mas em menor grau do que o APOE4, tendem a estar envolvidos no metabolismo16 da gordura2 ou no sistema imunológico17, o que apoia ainda mais a sua hipótese, diz Haney.

Irundika Dias, da Universidade de Aston, em Birmingham, Reino Unido, que não esteve envolvida no trabalho, diz que estudos anteriores sugeriram que o metabolismo16 da gordura2 em outros tipos de células3 cerebrais também poderia estar desempenhando um papel. “A coisa comum que liga todas essas descobertas é o envolvimento do metabolismo16 lipídico (de gordura2)”, diz ela. “Mas este é um artigo muito interessante.”

A descoberta surge no momento em que uma pesquisa separada sugere que variantes prejudiciais do gene APOE estão por trás de mais de três quartos dos casos de Alzheimer10. Essa pesquisa, realizada por Dylan Williams, da University College London, e seus colegas, baseou-se num estudo populacional chamado UK Biobank, que registou a variante APOE que as pessoas tinham e acompanhou os seus registros de saúde18.

Em comparação com as pessoas que têm duas cópias da variante de menor risco, APOE2, aquelas com uma ou duas cópias das outras variantes tinham quase quatro vezes mais probabilidade de contrair a doença de Alzheimer1, relataram num artigo publicado online.

Isto significa que cerca de 75 por cento das pessoas que sofrem de Alzheimer10 não o fariam se pudéssemos de alguma forma intervir nesta via molecular, diz Williams. “Dado que estamos numa rara posição em que as diferenças nesta proteína parecem ser responsáveis pela grande maioria do fardo da doença, se concebermos medicamentos onde possamos de alguma forma mitigar19 esse risco, esperaríamos prevenir a maioria dos casos da doença”.

Veja também sobre "Mal de Alzheimer10", "Metabolismo16" e "Sistema imunológico17".

No artigo publicado por Haney, é descrito como o genótipo20 APOE4/4 está ligado a gotículas lipídicas prejudiciais na micróglia da doença de Alzheimer1.

Os pesquisadores relatam que vários fatores de risco genéticos para a doença de Alzheimer1 implicam genes envolvidos no metabolismo16 lipídico e muitos destes genes lipídicos são altamente expressos em células gliais21. No entanto, a relação entre o metabolismo16 lipídico na glia e a patologia22 da doença de Alzheimer1 permanece pouco compreendida.

Através do sequenciamento de RNA de célula11 única de tecido23 cerebral na doença de Alzheimer1, identificou-se um estado microglial definido pela expressão da enzima12 ACSL1 associada a gotículas lipídicas, com micróglia positiva para ACSL1 sendo mais abundante em pacientes com doença de Alzheimer1 com o genótipo20 APOE4/4.

Na micróglia derivada de células-tronco24 humanas pluripotentes induzidas, a Aβ fibrilar25 induz a expressão de ACSL1, a síntese de triglicerídeos e o acúmulo de gotículas lipídicas de maneira dependente de APOE.

Além disso, os meios condicionados da micróglia contendo gotículas lipídicas levam à fosforilação da Tau e à neurotoxicidade de maneira dependente de APOE.

Essas descobertas sugerem uma ligação entre fatores de risco genéticos para a doença de Alzheimer1 com o acúmulo de gotículas lipídicas microgliais e fatores neurotóxicos derivados da micróglia, potencialmente fornecendo estratégias terapêuticas para a doença de Alzheimer1.

 

Fontes:
Nature, publicação em 13 de março de 2024.
New Scientist, notícia publicada em 13 de março de 2024.

 

NEWS.MED.BR, 2024. Alzheimer pode ser causado por acúmulo de gordura nas células cerebrais. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1467692/alzheimer-pode-ser-causado-por-acumulo-de-gordura-nas-celulas-cerebrais.htm>. Acesso em: 27 abr. 2024.

Complementos

1 Doença de Alzheimer: É uma doença progressiva, de causa e tratamentos ainda desconhecidos que acomete preferencialmente as pessoas idosas. É uma forma de demência. No início há pequenos esquecimentos, vistos pelos familiares como parte do processo normal de envelhecimento, que se vão agravando gradualmente. Os pacientes tornam-se confusos e por vezes agressivos, passando a apresentar alterações da personalidade, com distúrbios de conduta e acabam por não reconhecer os próprios familiares e até a si mesmos quando colocados frente a um espelho. Tornam-se cada vez mais dependentes de terceiros, iniciam-se as dificuldades de locomoção, a comunicação inviabiliza-se e passam a necessitar de cuidados e supervisão integral, até mesmo para as atividades elementares como alimentação, higiene, vestuário, etc..
2 Gordura: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Os alimentos que fornecem gordura são: manteiga, margarina, óleos, nozes, carnes vermelhas, peixes, frango e alguns derivados do leite. O excesso de calorias é estocado no organismo na forma de gordura, fornecendo uma reserva de energia ao organismo.
3 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
4 Fator de risco: Qualquer coisa que aumente a chance de uma pessoa desenvolver uma doença.
5 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
6 Proteínas: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Alimentos que fornecem proteína incluem carne vermelha, frango, peixe, queijos, leite, derivados do leite, ovos.
7 Placas: 1. Lesões achatadas, semelhantes à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
8 Células Nervosas: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO.
9 Anticorpos: Proteínas produzidas pelo organismo para se proteger de substâncias estranhas como bactérias ou vírus. As pessoas que têm diabetes tipo 1 produzem anticorpos que destroem as células beta produtoras de insulina do próprio organismo.
10 Alzheimer: Doença degenerativa crônica que produz uma deterioração insidiosa e progressiva das funções intelectuais superiores. É uma das causas mais freqüentes de demência. Geralmente começa a partir dos 50 anos de idade e tem incidência similar entre homens e mulheres.
11 Célula: Unidade funcional básica de todo tecido, capaz de se duplicar (porém algumas células muito especializadas, como os neurônios, não conseguem se duplicar), trocar substâncias com o meio externo à célula, etc. Possui subestruturas (organelas) distintas como núcleo, parede celular, membrana celular, mitocôndrias, etc. que são as responsáveis pela sobrevivência da mesma.
12 Enzima: Proteína produzida pelo organismo que gera uma reação química. Por exemplo, as enzimas produzidas pelo intestino que ajudam no processo digestivo.
13 Placa: 1. Lesão achatada, semelhante à pápula, mas com diâmetro superior a um centímetro. 2. Folha de material resistente (metal, vidro, plástico etc.), mais ou menos espessa. 3. Objeto com formato de tabuleta, geralmente de bronze, mármore ou granito, com inscrição comemorativa ou indicativa. 4. Chapa que serve de suporte a um aparelho de iluminação que se fixa em uma superfície vertical ou sobre uma peça de mobiliário, etc. 5. Placa de metal que, colocada na dianteira e na traseira de um veículo automotor, registra o número de licenciamento do veículo. 6. Chapa que, emitida pela administração pública, representa sinal oficial de concessão de certas licenças e autorizações. 7. Lâmina metálica, polida, usualmente como forma em processos de gravura. 8. Área ou zona que difere do resto de uma superfície, ordinariamente pela cor. 9. Mancha mais ou menos espessa na pele, como resultado de doença, escoriação, etc. 10. Em anatomia geral, estrutura ou órgão chato e em forma de placa, como uma escama ou lamela. 11. Em informática, suporte plano, retangular, de fibra de vidro, em que se gravam chips e outros componentes eletrônicos do computador. 12. Em odontologia, camada aderente de bactérias que se forma nos dentes.
14 Neurônios: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO. Sinônimos: Células Nervosas
15 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.
16 Metabolismo: É o conjunto de transformações que as substâncias químicas sofrem no interior dos organismos vivos. São essas reações que permitem a uma célula ou um sistema transformar os alimentos em energia, que será ultilizada pelas células para que as mesmas se multipliquem, cresçam e movimentem-se. O metabolismo divide-se em duas etapas: catabolismo e anabolismo.
17 Sistema imunológico: Sistema de defesa do organismo contra infecções e outros ataques de micro-organismos que enfraquecem o nosso corpo.
18 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
19 Mitigar: Tornar mais brando, mais suave, menos intenso (geralmente referindo-se à dor ou ao sofrimento); aliviar, suavizar, aplacar.
20 Genótipo: Composição genética de um indivíduo, ou seja, os genes que ele tem.
21 Células gliais:
22 Patologia: 1. Especialidade médica que estuda as doenças e as alterações que estas provocam no organismo. 2. Qualquer desvio anatômico e/ou fisiológico, em relação à normalidade, que constitua uma doença ou caracterize determinada doença. 3. Por extensão de sentido, é o desvio em relação ao que é próprio ou adequado ou em relação ao que é considerado como o estado normal de uma coisa inanimada ou imaterial.
23 Tecido: Conjunto de células de características semelhantes, organizadas em estruturas complexas para cumprir uma determinada função. Exemplo de tecido: o tecido ósseo encontra-se formado por osteócitos dispostos em uma matriz mineral para cumprir funções de sustentação.
24 Células-tronco: São células primárias encontradas em todos os organismos multicelulares que retêm a habilidade de se renovar por meio da divisão celular mitótica e podem se diferenciar em uma vasta gama de tipos de células especializadas.
25 Fibrilar: 1. Relativo a, constituído por ou disposto em fibrilas. 2. De conformação aproximadamente linear, insolúvel e de função estrutural ou de defesa (diz-se de proteína). 3. Apresentar fibrilação, ou seja, apresentar uma série de contrações rápidas e desordenadas das fibras musculares, sem, no entanto, contrair o músculo como um todo.
Gostou do artigo? Compartilhe!