Imagens da retina podem prever o risco de doenças oculares e sistêmicas
Combinando imagens da retina1, genética e big data, médicos pesquisadores da Harvard Medical School, do Mass Eye and Ear, do Massachusetts General Hospital e do Broad Institute of MIT and Harvard descobriram que podem estimar a probabilidade de uma pessoa desenvolver problemas oculares e doenças sistêmicas no futuro.
Eles encontraram associações significativas entre o afinamento das diferentes camadas da retina1 e o aumento do risco de desenvolver doenças oculares, cardíacas, pulmonares, metabólicas e neuropsiquiátricas, e identificaram genes associados à espessura das camadas da retina1.
As descobertas foram publicadas na revista Science Translational Medicine.
Entre as muitas doenças, cada desvio padrão das camadas mais finas dos segmentos dos fotorreceptores2 foi significativamente associado a riscos de:
- Insuficiência cardíaca congestiva3 não hipertensiva: HR 1,25 (IC 95% 1,12-1,39)
- Obstrução crônica das vias aéreas incidente4: HR 1,31 (IC 95% 1,24-1,38)
- Infarto do miocárdio5: HR 1,17 (IC 95% 1,10-1,25)
- Enfisema6: HR 1,47 (IC 95% 1,30-1,65)
Notavelmente, aqueles com esclerose múltipla7 prevalente existente tinham camadas do complexo de células8 ganglionares significativamente mais finas (β = -1,12, IC 95% -1,37 a -0,87), assim como aqueles com lesão9 hepática10 alcoólica (β = -0,68, IC 95% -0,98 a -0,38).
Após ajustes para vários fatores de confusão, segmentos dos fotorreceptores2 mais finos no início do estudo foram associados à mortalidade11 durante um período de acompanhamento de 10 anos (HR 1,16, IC 95% 1,11-1,22), assim como camadas mais finas do complexo de células8 ganglionares no início do estudo (HR 1,12, IC 95% 1,07-1,18).
“Mostramos que as imagens da retina1 podem ser usadas para prever o risco futuro de doenças oculares e sistêmicas”, disse Seyedeh Maryam Zekavat, pesquisador clínico em oftalmologia da HMS no Mass Eye and Ear, e co-primeiro autor do estudo com Saman Doroodgar Jorshery, pesquisador de pós-doutorado da HMS no Mass General e no Broad Institute.
“Isso poderia potencialmente ajudar na prevenção de doenças – se soubermos, pela imagem da retina1 de alguém, que ele corre alto risco de desenvolver glaucoma12 ou doença cardiovascular no futuro, poderíamos encaminhá-lo para exames de acompanhamento ou tratamento preventivo”, disse ele.
Devido à sua posição atrás das estruturas transparentes do olho13, a retina1 é fácil de visualizar e gerar imagens de forma não invasiva, e os exames de imagem da retina1 já são um procedimento de rotina em oftalmologia.
O novo estudo revela possibilidades para a medicina preventiva e para uma conversa cruzada entre a oftalmologia e outras áreas da medicina.
Leia sobre "Retinografia14: o que é" e "Fundo de olho15 ou fundoscopia".
As descobertas não provam definitivamente que existe uma conexão direta entre as camadas mais finas da retina1 e as doenças. Além disso, a importância clínica dos resultados não é clara. No entanto, o estudo lança mais luz sobre as ligações entre a saúde16 da retina1 e a saúde16 sistêmica, um tópico17 que os cientistas têm tentado compreender melhor.
Estudos anteriores mostraram ligações entre a saúde16 da retina1 e condições de saúde16, como envelhecimento, doenças cardiometabólicas, como diabetes18 e hipertensão19, e doenças neurológicas, como demência20, acidente vascular cerebral21 e esclerose múltipla7.
“Percebemos recentemente que podemos obter muito mais informações das imagens da retina1 do que pensávamos ser possível”, disse a autora sênior22 Nazlee Zebardast, professora assistente de oftalmologia da HMS e diretora de imagens de glaucoma12 do Mass Eye and Ear.
“É realmente emocionante poder ver que essas imagens, obtidas sem a necessidade de nenhum tipo de procedimento invasivo, estão associadas a tantas condições sistêmicas, tanto a nível genético quanto a nível epidemiológico”, disse ela.
Para identificar associações entre a saúde16 da retina1 e o risco de doenças, e para identificar genes associados à saúde16 da retina1, os pesquisadores analisaram dados de 44.823 participantes do UK Biobank que foram submetidos a tomografia de coerência óptica (TCO) da retina1, genotipagem e medições iniciais de saúde16 em 2010, e foram então acompanhados quanto ao desenvolvimento de doenças durante uma média de 10 anos.
Ao contrário de estudos anteriores que procuraram genes associados à saúde16 geral da retina1, este estudo aprofundou-se no papel das diferentes camadas celulares que constituem a retina1.
“Cada camada da retina1 é composta por diferentes tipos de células8 com diversas estruturas e funções, e mostramos que as espessuras dessas diferentes camadas estão associadas a diferentes condições”, diz Zebardast.
O estudo também fornece informações sobre os genes e vias biológicas que determinam a saúde16 da retina1, que poderiam ser aproveitadas para desenvolver terapias futuras, dizem os pesquisadores. Ao todo, a equipe identificou 259 loci genéticos associados à espessura da retina1.
Um insight deste trabalho é a descoberta de que múltiplas condições sistêmicas de saúde16, incluindo problemas cardíacos, metabólicos, pulmonares e renais, estão ligadas ao adelgaçamento dos segmentos dos fotorreceptores2 da retina1, embora sejam necessárias mais pesquisas para confirmar a causalidade.
Estudos futuros também devem ter como objetivo replicar os métodos do estudo em populações mais diversas e em diferentes faixas etárias, uma vez que os participantes do UK Biobank eram predominantemente brancos e tinham entre 40 e 70 anos de idade no início do estudo.
No artigo publicado, os pesquisadores relatam que a retina1 humana é um tecido23 multicamadas que oferece uma janela única para a saúde16 sistêmica. A tomografia de coerência óptica (TCO) é amplamente utilizada em cuidados oftalmológicos e permite a captura rápida e não invasiva da anatomia da retina1 com detalhes extraordinários.
Neste estudo, realizou-se análises genotípicas e fenotípicas24 das espessuras das camadas retinianas usando imagens maculares de TCO de 44.823 participantes do UK Biobank. Realizou-se análises de associação de fenótipos cruzados de camadas a partir da TCO (OCT-XWAS), associando espessuras retinianas com 1.866 condições incidentes25 (mediana de acompanhamento de 10 anos) e 88 características quantitativas e biomarcadores sanguíneos.
Foram realizados estudos de associação genômica ampla (GWASs), identificando marcadores genéticos herdados que influenciam a espessura das camadas retinianas e replicou-se essas associações entre o LIFE-Adult Study (N = 6313).
Por último, realizou-se uma análise comparativa das associações de todo o fenoma26 e todo o genoma para identificar possíveis ligações causais entre as espessuras das camadas retinianas e as condições oculares e sistêmicas.
Associações independentes com mortalidade11 incidente4 foram detectadas para segmentos dos fotorreceptores2 (SFs) mais finos e, separadamente, camadas do complexo de células8 ganglionares.
Associações fenotípicas24 foram detectadas entre camadas retinianas mais finas e condições oculares, neuropsiquiátricas, cardiometabólicas e pulmonares.
Um GWAS de espessuras das camadas retinianas produziu 259 loci únicos. A consistência entre associações epidemiológicas e genéticas sugeriu ligações entre uma camada mais fina de fibras nervosas da retina1 com glaucoma12, SF mais fino com degeneração macular27 relacionada à idade, e função cardiometabólica e pulmonar deficiente com SF mais fino.
Em conclusão, identificou-se múltiplos loci genéticos herdados e condições cardiometabólicas-pulmonares sistêmicas adquiridas associadas a camadas retinianas mais finas e identificou-se camadas retinianas em que o afinamento é preditivo de futuras condições oculares e sistêmicas.
Veja também sobre "Sinais28 e sintomas29 oftálmicos que precisam de avaliação médica" e "Genética - conceitos básicos".
Fontes:
Science Translational Medicine, Vol. 16, Nº 731, em 24 de janeiro de 2024.
Harvard Medical School, notícia publicada em 01 de fevereiro de 2024.
MedPage Today, notícia publicada em 26 de janeiro de 2024.