The Lancet Diabetes & Endocrinology: reflexões sobre a suplementação de vitamina D e seus benefícios não esqueléticos
Ensaios clínicos1 randomizados em andamento estão avaliando se realmente a suplementação2 de vitamina3 D pode reduzir o risco para várias doenças não-esqueléticas. Estes estudos têm envolvido grande número de participantes e vão custar milhões de dólares. O estudo VITAL, por exemplo, vai contar com a participação de mais de 20.000 indivíduos e tem um fundo de financiamento de cerca de 22 milhões de dólares. Este grande esforço de pacientes, pesquisadores e financiadores é louvável, uma vez que é quase certo que será suficiente para responder a uma pergunta que tem mantido há muito tempo a comunidade médica em dúvida.
A vitamina3 D primeiramente se tornou um sucesso quando sua importância na saúde4 óssea e na homeostase do cálcio foi comprovada há décadas. Desde então, as evidências epidemiológicas vêm apoiando o papel de proteção da vitamina3 D contra várias doenças não-esqueléticas, incluindo câncer5, doenças cardiovasculares6, doenças autoimunes7 e inflamatórias, demência8 e diabetes mellitus9; ela também parece poder reduzir a mortalidade10 por todas as causas. Muitos desses estudos mostram uma forte associação entre a baixa concentração de vitamina3 D e doenças. No entanto, os resultados de pequenos ensaios randomizados e controlados recentes são quase unânimes em concluir que a suplementação2 de vitamina3 D oferece proteção contra poucas ou mesmo nenhuma dessas doenças.
A vitamina3 D é um hormônio11 esteroide com efeitos pleiotrópicos e em tecidos específicos, devido à grande expressão do receptor nuclear de vitamina3 D em diferentes tecidos e os muitos genes que são alvo de suas ações. No sistema esquelético12, a vitamina3 D promove o desenvolvimento saudável e a remodelação do osso. Em outros tecidos, acredita-se que a vitamina3 D possa mediar efeitos potencialmente benéficos através de uma ampla variedade de mecanismos: algumas evidências sugerem que ela exerce uma atividade anticancerígena, limitando a hiperproliferação de certos tipos de células13, que promove a saúde4 metabólica pela regulação do metabolismo14 lipídico nos adipócitos15 e que limita a autoimunidade16 pela supressão de respostas imunes inadequadas.
Em uma revisão sistemática na revista The Lancet Diabetes17 & Endocrinology, Philippe Autier e colegas discutiram um grande número de estudos observacionais sugerindo que altas concentrações séricas de vitamina3 D podem ser protetoras. Por exemplo, os indivíduos com altas concentrações de vitamina3 D têm diminuído o risco de eventos cardiovasculares (até 58%), diabetes17 (até 38%), câncer5 colorretal (até 33%) e de todas as causas de mortalidade10 (até 29%). No entanto, eles também comparam estes resultados com os resultados de ensaios clínicos1 randomizados que revelam um quadro muito diferente: nenhuma redução de risco foi encontrada, mesmo em estudos envolvendo a suplementação2 adequada dos participantes com níveis baixos de vitamina3 D no início do estudo (menos de 50 nmol/L). Autier e colegas também fizeram uma nova meta-análise de 16 estudos que avaliaram os efeitos da suplementação2 de vitamina3 D nos níveis sanguíneos de hemoglobina glicosilada18 (HbA1c19), um biomarcador utilizado principalmente para monitoramento de distúrbios do metabolismo14 da glicose20. Embora o diabetes tipo 221 esteja associado a baixos níveis de vitamina3 D, os resultados mostram que a suplementação2 de vitamina3 D não reduz os níveis sanguíneos de HbA1c19 . Assim, parece cada vez mais provável que o baixo nível de vitamina3 D não é uma causa, mas uma consequência de problemas de saúde4.
Apesar das crescentes evidências indicando que é improvável que a vitamina3 D evite doenças não-esqueléticas, existe um forte apoio para a sua utilização a partir de muitos membros da comunidade de pesquisa, que é alimentado pela toxicidade22 relativamente baixa da vitamina3 D e pelas evidências de estudos observacionais prospectivos. Para aqueles que "acreditam", a falta de benefícios encontrada na maioria dos estudos concluídos até agora pode ser atribuída a questões como a suplementação2 inadequada, o teste em uma população com ausência de deficiência de vitamina3 D no início do estudo, a formulação incorreta da vitamina3 ou acompanhamento insuficiente dos participantes. No entanto, a vitamina3 D pode não ser segura em todos os casos. A suplementação2 em doses elevadas pode causar danos em pessoas com concentrações de vitamina3 D já elevadas, particularmente naqueles com problemas hepáticos, renais ou vasculares23. Esta é uma preocupação, dado o grande número de pessoas que tomam suplementos de vitamina3 D (mais de 50% dos adultos nos EUA fazem esta suplementação2).
Fonte: The Lancet Diabetes17 & Endocrinology, volume 2, número 1, de janeiro de 2014