Primeiro nascimento vivo após transplante de útero de uma doadora falecida para receptora com infertilidade por fator uterino
O transplante de útero1 de doadores vivos tornou-se uma realidade para tratar a infertilidade2 após uma bem sucedida série sueca de 2014, inspirando centros de transplante de útero1 e programas em todo o mundo. No entanto, nenhum caso de nascidos vivos via útero1 de doador falecido tinha tido sucesso conhecido até o momento desta descrição de caso no periódico The Lancet. Daí as dúvidas sobre sua viabilidade, incluindo se o útero1 permanece viável após isquemia3 prolongada.
Em setembro de 2016, uma mulher de 32 anos com ausência uterina congênita4 (síndrome5 de Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser [MRKH]) foi submetida a transplante uterino no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, no Brasil, recebendo o útero1 de uma doadora falecida por hemorragia6 subaracnóidea. A doadora tinha 45 anos e havia tido três partos vaginais anteriores. A receptora teve um ciclo de fertilização7 in vitro 4 meses antes do transplante, que resultou em oito blastocistos criopreservados.
Saiba mais sobre "Infertilidade2 e esterilidade8", "Fertilização7 in vitro" e "Transplante de órgãos".
A receptora apresentou recuperação pós-operatória satisfatória e recebeu alta após 8 dias de observação no hospital. A imunossupressão9 foi induzida com prednisolona e timoglobulina e continuada via tacrolimus e micofenalato mofetil (MMF), até 5 meses após o transplante, quando a azatioprina substituiu o MMF.
A primeira menstruação10 ocorreu 37 dias após o transplante e regularmente (a cada 26-32 dias) a partir de então. A gravidez11 ocorreu após a primeira transferência única de embriões 7 meses após o transplante. Nenhuma anormalidade da forma de onda da velocidade do fluxo sanguíneo foi detectada pela ultrassonografia12 por Doppler das artérias13 uterinas, artérias13 umbilicais fetais ou artérias13 cerebrais médias, nem qualquer deficiência no crescimento fetal durante a gravidez11. Nenhum episódio de rejeição ocorreu após o transplante ou durante a gestação.
A cesárea ocorreu em 15 de dezembro de 2017, próximo a 36 semanas de gestação. O bebê do sexo feminino pesava 2550 gramas ao nascimento, adequada para a idade gestacional, com Apgar de 9 em 1 minuto, 10 em 5 minutos e 10 em 10 minutos e, assim como a mãe, permaneceu saudável e desenvolveu-se normalmente 7 meses após o parto. O útero1 foi removido no mesmo procedimento cirúrgico que o parto e a terapia imunossupressora foi suspensa.
Os pesquisadores brasileiros descreveram, até onde se tem conhecimento, o primeiro caso mundial de nascidos vivos após transplante de útero1 de um doador falecido em uma paciente com síndrome5 de MRKH. Os resultados estabelecem a prova de conceito14 para o tratamento da infertilidade2 uterina por transplante de uma doadora falecida, abrindo esperanças para uma gravidez11 saudável para todas as mulheres com infertilidade2 por fator uterino, sem necessidade de doadores vivos ou cirurgias de doadores vivos.
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e o Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, no Brasil, financiaram o estudo.
Leia também sobre "Teste de Apgar", "Infertilidade2 feminina" e "Doação de órgãos".
Fonte: The Lancet, em 4 de dezembro de 2018