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Planos de Saúde: estudo mostra doenças e procedimentos mais excluídos pelas operadoras

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A negação de atendimento ao tratamento de câncer1, doenças do coração2 e Aids são os principais motivos de ações judiciais movidas pelos usuários contra os planos de saúde3 privados no Estado de São Paulo. Dentre os procedimentos médicos mais excluídos pelas empresas e objeto de reclamações na Justiça paulista destacam-se os transplantes; radioterapia4 e quimioterapia5 para tratamento do câncer1; e o fornecimento de órteses6 e próteses, como os stents usados em cirurgias cardíacas.

Os resultados constam da pesquisa "Os planos de saúde3 nos tribunais: uma análise das ações judiciais movidas por clientes de planos de saúde3, relacionadas à negação de coberturas assistenciais no Estado de São Paulo", tema da dissertação de mestrado defendida no último dia 18 de abril, pelo sanitarista Mário Scheffer, na Faculdade de Medicina da USP. O trabalho foi orientado pelo Prof. Dr. Paulo Elias, do Departamento de Medicina Preventiva, e rendeu a Scheffer o titulo de mestre em Ciências.

O estudo consistiu na análise de 735 decisões judiciais relacionadas a exclusões de coberturas e negações de atendimento por parte dos planos de saúde3, julgadas em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, entre janeiro de 1999 e dezembro de 2004. As exclusões de coberturas pelos planos de saúde3 dependem da época da contratação dos planos. O marco divisor é a lei 9656/98, a chamada Lei dos Planos de Saúde3, que entrou em vigor em janeiro de 1999. Segundo Scheffer, a própria Lei dos Planos de Saúde3 estipula longos prazos de carências (exemplo: dois anos para doenças preexistentes) e permite a comercialização de planos segmentados, com coberturas diferenciadas (há planos só ambulatoriais e só hospitalares, por exemplo). Além disso, a Agência Nacional de Saúde3 Suplementar (ANS) editou resoluções que também tratam da limitação de coberturas.

A pesquisa foi realizada no Estado de São Paulo, que conta com 896 operadoras de planos de saúde3 em atividade; atinge 15,2 milhões de usuários (40% do total do país); tem alto grau de cobertura (38% da população do estado e 55% da capital têm planos de saúde3); e movimentou, em 2004, R$ 15,2 bilhões, quase a metade do que os planos de saúde3 movimentaram no país: R$ 31,4 bilhões.

Principais resultados

- Dentre os grupos de doenças (Classificação Internacional de Doenças - CID 10) citados nos acórdãos, em um total de 478 menções, prevalecem as neoplasias7 (20,3%), doenças do aparelho circulatório8 (16,3%) e doenças infecciosas (11,1%).

- As 10 doenças mais citadas foram câncer1 (97 menções), doenças cardiovasculares9 (78), Aids (30), meningite10 (21), acidentes e causas externas (20), cirrose11 hepática12 (16), insuficiência renal13 (14), hérnia14 (14), diabetes15 (12) e doenças congênitas16 (12). Os dois grupos de doenças mais citados – câncer1 e cardiopatias – referem-se às duas principais causas de morte no Estado de São Paulo.

- A negação de cobertura de casos relacionados à urgência17 e emergência18 está presente em 109 (14,8%) acórdãos analisados. Os casos de urgência17 estão relacionados, principalmente, a doenças cardiovasculares9, câncer1 e acidentes.

- Nas 51 decisões analisadas que mencionaram a negação de cobertura de transplantes, dentre aqueles que são especificados, os mais citados são os transplantes de fígado19 e de medula20. Chama a atenção que a atual regulamentação também desobriga a cobertura desses procedimentos: apenas são obrigatórios os transplantes de rins21 e córneas.

- Dentre as decisões judiciais analisadas, 31 (4,2%) mencionaram a negação de cobertura de órteses6 e próteses, sendo mais mencionados os stents, marca-passos e cateteres.

- Além de excluir aquelas doenças cujos tratamentos são mais onerosos, também são excluídas aquelas que, na visão22 das operadoras, deviam ser obrigação exclusiva do sistema público. Dois exemplos são o tratamento da Aids e as hemodiálises, que são absorvidos, em sua quase totalidade pelo SUS sem a participação dos planos.

- Argumentos usados pelas operadoras para sua defesa em juízo foram existência de cláusula excludente no contrato; caso de doença preexistente; o médico/hospital não é credenciado; não há relação de consumo, pois trata-se de associação/plano coletivo; a garantia de saúde3 irrestrita é dever do Estado e não do plano de saúde3; o procedimento não está incluído na tabela AMB vigente; a finalidade do procedimento é meramente estética; o usuário está inadimplente no pagamento da mensalidade; o procedimento não está incluído no Rol de Alta Complexidade da ANS.

- A exclusão de atendimento sob alegação de doença preexistente apareceu em 174 (23,6%) das decisões judiciais estudadas. Chama a atenção que a exclusão de preexistentes, muito comuns nos contratos antigos, foi perpetuada pela lei 9656/98 que manteve este conceito e estipulou dois anos de carência.

- A Justiça foi favorável à concessão de cobertura, na segunda instância, em 73,5% das ações julgadas, praticamente confirmando a proporção verificada na primeira instância, na qual 74,5% foram favoráveis aos usuários. Em 3,7% dos acórdãos, o juiz concedeu parte da cobertura solicitada e, em 20,4%, foi negada a cobertura, com decisão favorável ao plano de saúde3. Em algumas situações, como câncer1 (79,4% dos casos) e transplantes (78,8% dos casos), as decisões foram ainda mais favoráveis em segunda instância.

- Dentre as decisões avaliadas, 87,6% referem-se a contratos individuais, enquanto 10,9% são contratos coletivos. Os planos coletivos (mais de 70% do mercado) são levados com menos freqüência aos tribunais por serem considerados como benefícios dos empregados.

- A medicina de grupo é o segmento de operadoras de planos de saúde3 mais citado nos acórdãos analisados (54,4%), seguido das seguradoras (30,2%), cooperativas/Unimeds (9,8%), filantropia (2,6%), autogestão (0,9%) e outros (2,1%).

- Dentre as operadoras mais citadas nas decisões judiciais estão Amil (10,9%), Sul América (10,5%), Golden Cross (9,4%), Bradesco (8,9%), Centro Trasmontano (6,5%), Marítima (4,5%), Classes Laboriosas (4,1%), Blue Life (3,6%), Samcil (3,6%); Unimed São Paulo (já liquidada - 2,3%), Porto Seguro (2,2%); São Cristóvão (2,1%), Golden Shield (1,9%), Itaú Seguros (1,5%) e Omint (1,5%).

- Dos acórdãos analisados, a maioria (55,2%) não informa a data de contratação dos planos. Dentre aqueles que trazem essa informação, a maior parte é de contratos anteriores à Lei 9.656/98 (44,1% dos acórdãos). O grande número de contratos antigos no universo pesquisado explica-se, em parte, pela morosidade da Justiça, uma vez que foram estudadas decisões de segunda instância que tiveram início antes da vigência da atual legislação.

- Dentre as coberturas citadas nos acórdãos, a maioria (68%) não traz especificação de procedimentos. Mesmo nestes casos, é possível agrupar as coberturas em: assistência médica (36%), seguida de internações (27%), cirurgias (24%), internações em UTI (12%) e consultas médicas (1%).

- Os procedimentos de alta complexidade e alto custo são aqueles mais freqüentemente presentes nas decisões judiciais. Agrupando todos os procedimentos, os mais citados foram: transplantes (16%), procedimentos ligados ao tratamento de câncer1 (15%), órteses6 e próteses (9,5%), exames diagnósticos (8,3%), implantes (5,5%), hemodiálise23, (5,2%), oxigenoterapia (4,6%), fisioterapia24 (3,7%), assistência ao recém-nascido (3,7%), medicamentos de uso hospitalar (3,7%) e outros (24,8%).

- Dentre as coberturas com especificação de procedimentos (32%), os mais citados foram os procedimentos cirúrgicos e invasivos (39,9%), os procedimentos clínicos (27%), órteses6 e próteses (9,5%), procedimentos diagnósticos e terapêuticos (8,3%), insumos e medicamentos (8,3%), procedimentos gerais (7%).

- O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é a legislação mais citada nas argumentações das decisões judiciais: 62,7% do total de menções a legislações específicas. Em seguida vem o Código Civil (14,6%). A  Lei 9.656/98 fica em terceiro lugar (10%), seguida  da Constituição Federal (7,3%).

- O fato de a Lei dos Planos de Saúde3 (9.656/98) ser pouco citada nas decisões analisadas demonstra a limitação e o alcance desta legislação, que não vale para os planos antigos (boa parte ainda em vigor) e com limitações de cobertura mesmo nas regras atuais.

- Quando o CDC é utilizado nas argumentações favoráveis à concessão de cobertura, os aspectos mais citados são: em caso de dúvida na interpretação do contrato a decisão deve ser favorável ao consumidor; as cláusulas restritivas deveriam estar expressas em destaque; a restrição atribui vantagem exagerada para a operadora; é abusiva cláusula que estipula limite de tempo de internação e valores; a operadora não provou má-fé ou desconhecimento da doença por parte do usuário; as limitações são abusivas, quando se trata de urgência17 e emergência18; e a operadora não prestou bom serviço. Nos casos em que o CDC é usado em decisões favoráveis às operadoras, o principal argumento é de que não há relação de consumo quando se trata de planos coletivos.

- Quanto à Lei 9.656/98, quando é mencionada favoravelmente à concessão de cobertura, o principal argumento utilizado é a ausência de prova de má-fé, uma vez que o usuário não fez exame pré-admissional. Os juízes também alegam, com base na Lei dos Planos de Saúde3, que o procedimento deve ser coberto, que o consumidor tem direito à informação adequada, e que a cobertura de urgência17 e emergência18 tem que ser obrigatória. A Lei 9.656/98 ainda serviu de fundamento para decisões favoráveis às operadoras, quando, por exemplo, a legislação permite a exclusão de determinada cobertura.

- Algumas decisões favoráveis à cobertura utilizam argumentos médicos, sendo os dois principais: a intervenção cirúrgica não é para fim estético; os planos devem cobrir os progressos da medicina e a incorporação de novas tecnologias.

- Há decisões baseadas unicamente no contrato firmado entre usuário e operadora, em que o juiz decide a partir das disposições contratuais. Nestes casos, o juiz afirma que o contrato não exclui a cobertura. O argumento do contrato é usado também nas decisões favoráveis aos planos de saúde3. Nestes casos, as principais argumentações são: as limitações/exclusões estão expressas no contrato; o médico ou hospital não são credenciados pelo plano de saúde3 e, portanto, o plano não deve conceder a cobertura. Prevalece nestes julgados o princípio de que o contrato faz a lei entre as partes.

Fonte: Assessoria de Imprensa da FMUSP
NEWS.MED.BR, 2006. Planos de Saúde: estudo mostra doenças e procedimentos mais excluídos pelas operadoras. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/saude/1273/planos-de-saude-estudo-mostra-doencas-e-procedimentos-mais-excluidos-pelas-operadoras.htm>. Acesso em: 19 abr. 2024.

Complementos

1 Câncer: Crescimento anormal de um tecido celular capaz de invadir outros órgãos localmente ou à distância (metástases).
2 Coração: Órgão muscular, oco, que mantém a circulação sangüínea.
3 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
4 Radioterapia: Método que utiliza diversos tipos de radiação ionizante para tratamento de doenças oncológicas.
5 Quimioterapia: Método que utiliza compostos químicos, chamados quimioterápicos, no tratamento de doenças causadas por agentes biológicos. Quando aplicada ao câncer, a quimioterapia é chamada de quimioterapia antineoplásica ou quimioterapia antiblástica.
6 Órteses: Quaisquer aparelhos externos usados para imobilizar ou auxiliar os movimentos dos membros ou da coluna vertebral.
7 Neoplasias: Termo que denomina um conjunto de doenças caracterizadas pelo crescimento anormal e em certas situações pela invasão de órgãos à distância (metástases). As neoplasias mais frequentes são as de mama, cólon, pele e pulmões.
8 Aparelho circulatório: O aparelho circulatório ou cardiovascular é formado por um circuito fechado de tubos (artérias, veias e capilares) dentro dos quais circula o sangue e por um órgão central, o coração, que atua como bomba. Ele move o sangue através dos vasos sanguíneos e distribui substâncias por todo o organismo.
9 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
10 Meningite: Inflamação das meninges, aguda ou crônica, quase sempre de origem infecciosa, com ou sem reação purulenta do líquido cefalorraquidiano. As meninges são três membranas superpostas (dura-máter, aracnoide e pia-máter) que envolvem o encéfalo e a medula espinhal.
11 Cirrose: Substituição do tecido normal de um órgão (freqüentemente do fígado) por um tecido cicatricial fibroso. Deve-se a uma agressão persistente, infecciosa, tóxica ou metabólica, que produz perda progressiva das células funcionalmente ativas. Leva progressivamente à perda funcional do órgão.
12 Hepática: Relativa a ou que forma, constitui ou faz parte do fígado.
13 Insuficiência renal: Condição crônica na qual o corpo retém líquido e excretas pois os rins não são mais capazes de trabalhar apropriadamente. Uma pessoa com insuficiência renal necessita de diálise ou transplante renal.
14 Hérnia: É uma massa circunscrita formada por um órgão (ou parte de um órgão) que sai por um orifício, natural ou acidental, da cavidade que o contém. Por extensão de sentido, excrescência, saliência.
15 Diabetes: Nome que designa um grupo de doenças caracterizadas por diurese excessiva. A mais frequente é o Diabetes mellitus, ainda que existam outras variantes (Diabetes insipidus) de doença nas quais o transtorno primário é a incapacidade dos rins de concentrar a urina.
16 Congênitas: 1. Em biologia, o que é característico do indivíduo desde o nascimento ou antes do nascimento; conato. 2. Que se manifesta espontaneamente; inato, natural, infuso. 3. Que combina bem com; apropriado, adequado. 4. Em termos jurídicos, é o que foi adquirido durante a vida fetal ou embrionária; nascido com o indivíduo. Por exemplo, um defeito congênito.
17 Urgência: 1. Necessidade que requer solução imediata; pressa. 2. Situação crítica ou muito grave que tem prioridade sobre outras; emergência.
18 Emergência: 1. Ato ou efeito de emergir. 2. Situação grave, perigosa, momento crítico ou fortuito. 3. Setor de uma instituição hospitalar onde são atendidos pacientes que requerem tratamento imediato; pronto-socorro. 4. Eclosão. 5. Qualquer excrescência especializada ou parcial em um ramo ou outro órgão, formada por tecido epidérmico (ou da camada cortical) e um ou mais estratos de tecido subepidérmico, e que pode originar nectários, acúleos, etc. ou não se desenvolver em um órgão definido.
19 Fígado: Órgão que transforma alimento em energia, remove álcool e toxinas do sangue e fabrica bile. A bile, produzida pelo fígado, é importante na digestão, especialmente das gorduras. Após secretada pelas células hepáticas ela é recolhida por canalículos progressivamente maiores que a levam para dois canais que se juntam na saída do fígado e a conduzem intermitentemente até o duodeno, que é a primeira porção do intestino delgado. Com esse canal biliar comum, chamado ducto hepático, comunica-se a vesícula biliar através de um canal sinuoso, chamado ducto cístico. Quando recebe esse canal de drenagem da vesícula biliar, o canal hepático comum muda de nome para colédoco. Este, ao entrar na parede do duodeno, tem um músculo circular, designado esfíncter de Oddi, que controla o seu esvaziamento para o intestino.
20 Medula: Tecido mole que preenche as cavidades dos ossos. A medula óssea apresenta-se de dois tipos, amarela e vermelha. A medula amarela é encontrada em cavidades grandes de ossos grandes e consiste em sua grande maioria de células adiposas e umas poucas células sangüíneas primitivas. A medula vermelha é um tecido hematopoiético e é o sítio de produção de eritrócitos e leucócitos granulares. A medula óssea é constituída de um rede, em forma de treliça, de tecido conjuntivo, contendo fibras ramificadas e preenchida por células medulares.
21 Rins: Órgãos em forma de feijão que filtram o sangue e formam a urina. Os rins são localizados na região posterior do abdômen, um de cada lado da coluna vertebral.
22 Visão: 1. Ato ou efeito de ver. 2. Percepção do mundo exterior pelos órgãos da vista; sentido da vista. 3. Algo visto, percebido. 4. Imagem ou representação que aparece aos olhos ou ao espírito, causada por delírio, ilusão, sonho; fantasma, visagem. 5. No sentido figurado, concepção ou representação, em espírito, de situações, questões etc.; interpretação, ponto de vista. 6. Percepção de fatos futuros ou distantes, como profecia ou advertência divina.
23 Hemodiálise: Tipo de diálise que vai promover a retirada das substâncias tóxicas, água e sais minerais do organismo através da passagem do sangue por um filtro. A hemodiálise, em geral, é realizada 3 vezes por semana, em sessões com duração média de 3 a 4 horas, com o auxílio de uma máquina, dentro de clínicas especializadas neste tratamento. Para que o sangue passe pela máquina, é necessária a colocação de um catéter ou a confecção de uma fístula, que é um procedimento realizado mais comumente nas veias do braço, para permitir que estas fiquem mais calibrosas e, desta forma, forneçam o fluxo de sangue adequado para ser filtrado.
24 Fisioterapia: Especialidade paramédica que emprega agentes físicos (água doce ou salgada, sol, calor, eletricidade, etc.), massagens e exercícios no tratamento de doenças.
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