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COVID grave pode causar marcadores de envelhecimento no cérebro

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A COVID-19 grave está associada a alterações no cérebro1 que refletem aquelas observadas na velhice, de acordo com uma análise de dezenas de amostras cerebrais post-mortem. Pesquisadores identificaram que os principais genes que estão ativos no cérebro1 de pessoas mais velhas também estão ativos no cérebro1 de pessoas que desenvolveram COVID-19 grave.

A análise revelou alterações cerebrais na atividade genética que foram mais extensas em pessoas com infecções2 graves por SARS-CoV-2 do que em pessoas não infectadas que estiveram em uma unidade de terapia intensiva3 (UTI) ou foram colocadas em ventiladores para ajudar na respiração – tratamentos usados em muitas pessoas com COVID-19 grave.

O estudo, publicado na Nature Aging, junta-se a um grupo de publicações que catalogam os efeitos da COVID-19 no cérebro1. “Isso abre uma infinidade de questões importantes, não apenas para entender a doença, mas para preparar a sociedade para quais podem ser as consequências da pandemia”, diz a neuropatologista Marianna Bugiani, do Amsterdam University Medical Centers. “E essas consequências podem não ser claras por anos.”

O estudo descreve como a COVID-19 grave está associada a assinaturas moleculares de envelhecimento no cérebro1 humano.

Leia sobre "Síndrome4 pós-Covid" e "Envelhecimento cerebral normal ou patológico".

Maria Mavrikaki, neurobióloga do Beth Israel Deaconess Medical Center em Boston, EUA, iniciou o estudo há cerca de dois anos, depois de ver uma pré-impressão, posteriormente publicada como um artigo, que descrevia o declínio cognitivo5 após a COVID-19. Ela decidiu fazer o acompanhamento para ver se conseguia encontrar alterações no cérebro1 que pudessem desencadear os efeitos.

Como a COVID-19 e o envelhecimento são acompanhados por declínio cognitivo5, ela e seus colegas levantaram a hipótese de que a COVID-19 pode levar a assinaturas moleculares semelhantes ao envelhecimento.

Eles então realizaram análise de transcritoma total do córtex frontal – uma região do cérebro1 intimamente ligada à cognição6 – de 21 pessoas que tiveram COVID-19 grave quando morreram e uma pessoa com infecção7 assintomática por SARS-CoV-2 no momento da morte. A equipe os comparou com amostras de 22 pessoas sem histórico conhecido de infecção7 por SARS-CoV-2. Outro grupo de controle compreendia nove pessoas que não tinham histórico conhecido de infecção7, mas passaram algum tempo em um ventilador mecânico ou em uma UTI – intervenções que podem causar efeitos colaterais8 graves.

A equipe descobriu que os genes associados à inflamação9 e ao estresse eram mais ativos nos cérebros das pessoas que tiveram COVID-19 grave do que nos cérebros das pessoas do grupo de controle. Por outro lado, os genes ligados à cognição6 e à formação de conexões entre as células10 cerebrais eram menos ativos.

Os cientistas também analisaram o tecido11 cerebral de outras 20 pessoas não infectadas: 10 com 38 anos ou menos no momento da morte e 10 com 71 anos ou mais. Uma comparação revelou que as pessoas do grupo mais velho tiveram alterações cerebrais semelhantes às observadas em pessoas com COVID-19 grave.

As descobertas indicam, portanto, que a COVID-19 está associada a assinaturas moleculares do envelhecimento cerebral e enfatizam o valor do acompanhamento neurológico em indivíduos recuperados.

O trabalho é preliminar e precisará ser confirmado por meio de abordagens complementares, diz Daniel Martins de Souza, chefe de proteômica12 da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo. Mas é um estudo informativo, diz ele, e essa pesquisa pode, em última análise, orientar o tratamento para pessoas que apresentam dificuldades cognitivas persistentes após a COVID-19.

Mavrikaki suspeita que os efeitos da COVID-19 na atividade genética são causados indiretamente, por inflamação9, e não por infiltração viral no cérebro1. Apoiando essa interpretação, ela e seus colegas descobriram que expor neurônios13 cultivados em laboratório a proteínas14 que promovem a inflamação9 afetou a atividade de um subconjunto dos genes relacionados ao envelhecimento.

Mas é possível que essa resposta também seja desencadeada por outras infecções2, diz ela. E o estudo não conseguiu controlar totalmente a obesidade15 ou outras condições que podem aumentar as chances de uma pessoa desenvolver COVID-19 grave e gerar um estado inflamatório que afeta a expressão gênica no cérebro1.

Outra questão fundamental é se as alterações na expressão gênica estão associadas apenas a casos graves de COVID-19, ou se doenças mais leves também podem causá-las, diz Bugiani. Em março, um estudo de centenas de imagens cerebrais coletadas pelo UK Biobank descobriu que mesmo doenças leves podem causar alterações no cérebro1, incluindo danos às regiões envolvidas no olfato e no paladar16.

Levará tempo para determinar se as mudanças observadas no estudo são transitórias ou estão aí para ficar, diz Bugiani. “A duração da pandemia17 já foi longa o suficiente para ver essas coisas, mas não o suficiente para estabelecer se são permanentes”, diz ela. “Ainda não sabemos quais serão suas reais consequências.”

Veja também sobre "O processo de envelhecimento" e "Os sintomas18 da Covid-19".

 

Fontes:
Nature Aging, publicação em 05 de dezembro de 2022.
Nature, notícia publicada em 05 de dezembro de 2022.

 

NEWS.MED.BR, 2022. COVID grave pode causar marcadores de envelhecimento no cérebro. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1430830/covid-grave-pode-causar-marcadores-de-envelhecimento-no-cerebro.htm>. Acesso em: 18 abr. 2024.

Complementos

1 Cérebro: Derivado do TELENCÉFALO, o cérebro é composto dos hemisférios direito e esquerdo. Cada hemisfério contém um córtex cerebral exterior e gânglios basais subcorticais. O cérebro inclui todas as partes dentro do crânio exceto MEDULA OBLONGA, PONTE e CEREBELO. As funções cerebrais incluem as atividades sensório-motora, emocional e intelectual.
2 Infecções: Doença produzida pela invasão de um germe (bactéria, vírus, fungo, etc.) em um organismo superior. Como conseqüência da mesma podem ser produzidas alterações na estrutura ou funcionamento dos tecidos comprometidos, ocasionando febre, queda do estado geral, e inúmeros sintomas que dependem do tipo de germe e da reação imunológica perante o mesmo.
3 Terapia intensiva: Tratamento para diabetes no qual os níveis de glicose são mantidos o mais próximo do normal possível através de injeções freqüentes ou uso de bomba de insulina, planejamento das refeições, ajuste em medicamentos hipoglicemiantes e exercícios baseados nos resultados de testes de glicose além de contatos freqüentes entre o diabético e o profissional de saúde.
4 Síndrome: Conjunto de sinais e sintomas que se encontram associados a uma entidade conhecida ou não.
5 Cognitivo: 1. Relativo ao conhecimento, à cognição. 2. Relativo ao processo mental de percepção, memória, juízo e/ou raciocínio. 3. Diz-se de estados e processos relativos à identificação de um saber dedutível e à resolução de tarefas e problemas determinados. 4. Diz-se dos princípios classificatórios derivados de constatações, percepções e/ou ações que norteiam a passagem das representações simbólicas à experiência, e também da organização hierárquica e da utilização no pensamento e linguagem daqueles mesmos princípios.
6 Cognição: É o conjunto dos processos mentais usados no pensamento, percepção, classificação, reconhecimento e compreensão para o julgamento através do raciocínio para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas.
7 Infecção: Doença produzida pela invasão de um germe (bactéria, vírus, fungo, etc.) em um organismo superior. Como conseqüência da mesma podem ser produzidas alterações na estrutura ou funcionamento dos tecidos comprometidos, ocasionando febre, queda do estado geral, e inúmeros sintomas que dependem do tipo de germe e da reação imunológica perante o mesmo.
8 Efeitos colaterais: 1. Ação não esperada de um medicamento. Ou seja, significa a ação sobre alguma parte do organismo diferente daquela que precisa ser tratada pelo medicamento. 2. Possível reação que pode ocorrer durante o uso do medicamento, podendo ser benéfica ou maléfica.
9 Inflamação: Conjunto de processos que se desenvolvem em um tecido em resposta a uma agressão externa. Incluem fenômenos vasculares como vasodilatação, edema, desencadeamento da resposta imunológica, ativação do sistema de coagulação, etc.Quando se produz em um tecido superficial (pele, tecido celular subcutâneo) pode apresentar tumefação, aumento da temperatura local, coloração avermelhada e dor (tétrade de Celso, o cientista que primeiro descreveu as características clínicas da inflamação).
10 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
11 Tecido: Conjunto de células de características semelhantes, organizadas em estruturas complexas para cumprir uma determinada função. Exemplo de tecido: o tecido ósseo encontra-se formado por osteócitos dispostos em uma matriz mineral para cumprir funções de sustentação.
12 Proteômica: Ciência que estuda o conjunto de proteínas e suas isoformas contidas em amostras biológicas, seja esta um organismo, um tecido, uma organela celular ou uma célula, sempre determinadas pelo genoma.
13 Neurônios: Unidades celulares básicas do tecido nervoso. Cada neurônio é formado por corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir impulsos no SISTEMA NERVOSO. Sinônimos: Células Nervosas
14 Proteínas: Um dos três principais nutrientes dos alimentos. Alimentos que fornecem proteína incluem carne vermelha, frango, peixe, queijos, leite, derivados do leite, ovos.
15 Obesidade: Condição em que há acúmulo de gorduras no organismo além do normal, mais severo que o sobrepeso. O índice de massa corporal é igual ou maior que 30.
16 Paladar: Paladar ou sabor. Em fisiologia, é a função sensorial que permite a percepção dos sabores pela língua e sua transmissão, através do nervo gustativo ao cérebro, onde são recebidos e analisados.
17 Pandemia: É uma epidemia de doença infecciosa que se espalha por um ou mais continentes ou por todo o mundo, causando inúmeras mortes. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a pandemia pode se iniciar com o aparecimento de uma nova doença na população, quando o agente infecta os humanos, causando doença séria ou quando o agente dissemina facilmente e sustentavelmente entre humanos. Epidemia global.
18 Sintomas: Alterações da percepção normal que uma pessoa tem de seu próprio corpo, do seu metabolismo, de suas sensações, podendo ou não ser um indício de doença. Os sintomas são as queixas relatadas pelo paciente mas que só ele consegue perceber. Sintomas são subjetivos, sujeitos à interpretação pessoal. A variabilidade descritiva dos sintomas varia em função da cultura do indivíduo, assim como da valorização que cada pessoa dá às suas próprias percepções.
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