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O risco de insuficiência cardíaca em homens pode aumentar com a idade devido à perda do cromossomo Y

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Dados de um novo estudo, publicado na revista Science, apontam que o cromossomo1 Y, envolvido na determinação do sexo, desaparece misteriosamente das células2 imunológicas de alguns homens à medida que envelhecem – e isso pode ser fatal, contribuindo para que os homens tenham uma taxa mais alta de doenças cardíacas do que as mulheres.

Os riscos para a saúde3 da perda do cromossomo1 Y há muito são suspeitos, mas evidências de animais e pessoas agora adicionam mais suporte à ideia – e podem sugerir um tratamento para os danos causados ao coração4.

O DNA é empacotado em cromossomos5, com as células2 da maioria dos homens carregando um X e um Y, e as da maioria das mulheres carregando dois Xs – embora algumas pessoas tenham outras combinações, como XXY ou XYY.

Foi descoberto há várias décadas que, em algumas pessoas nascidas com cromossomos5 XY, uma proporção das células2 imunes não tem o cromossomo1 Y, um fenômeno que se torna mais comum com o aumento da idade. Por exemplo, 40% dos homens de 70 anos não têm Y em pelo menos algumas das células2 imunes encontradas em seu sangue6.

As razões para isso não são claras, mas pode ser porque o cromossomo1 Y é pequeno e carrega relativamente poucos genes além daqueles envolvidos na determinação do sexo e na produção de esperma7, de modo que as células-tronco8 que produzem células2 imunes podem sobreviver se perderem seu Y ao replicarem seu DNA. Se elas perderem quaisquer outros cromossomos5, no entanto, as células2 teriam maior probabilidade de morrer.

A perda desse cromossomo1 Y nas células2 do sistema imunológico9 se correlaciona com taxas mais altas de problemas de saúde3, incluindo doenças cardíacas, câncer10 e doença de Alzheimer11. Mas não ficou claro se a perda do Y causa essas condições ou se a replicação defeituosa do DNA está por trás da perda de Y e dos problemas de saúde3, diz Lars Forsberg da Universidade de Uppsala, na Suécia.

Leia sobre "Doenças cardiovasculares12" e "Genética - conceitos básicos".

Para descobrir, Forsberg e seus colegas usaram a técnica de edição de genes CRISPR para remover o cromossomo1 Y de cerca de dois terços das células2 imunes de camundongos machos para imitar o fenômeno.

Esses camundongos desenvolveram problemas cardíacos quando atingiram cerca de 1 ano de idade, precipitados por cicatrizes13 no músculo cardíaco14. “Mostramos causalidade”, diz Forsberg. “Podemos ver que perder o cromossomo1 Y no sangue6 causa doenças no coração4.”

Os pesquisadores também analisaram como a perda do cromossomo1 Y afetou os homens em um grande estudo médico em andamento chamado UK Biobank, que acompanha a saúde3 dos participantes ao longo do tempo. Eles descobriram que quanto mais células2 imunes sem um Y que os homens tinham no momento de sua inscrição, maior o risco de morrer de qualquer tipo de doença cardíaca nos 12 anos seguintes.

Por exemplo, homens que perderam o cromossomo1 Y em mais de 40% de suas células2 imunológicas tiveram um risco 31% maior de morrer de qualquer doença circulatória durante o período do estudo. A cicatrização do músculo cardíaco14 pode contribuir para alguns tipos comuns de doenças cardíacas, como insuficiência cardíaca15, diz Forsberg.

Trabalhos posteriores nos camundongos descobriram pistas sobre como as células2 imunológicas causam cicatrizes13 no coração4. Quando os animais foram dissecados, descobriu-se que as células2 imunes sem um cromossomo1 Y se infiltraram no músculo cardíaco14, desencadeando a liberação de uma molécula de sinalização inflamatória chamada fator de crescimento transformante beta.

Tratar os camundongos com um anticorpo16 que bloqueia esse fator de crescimento reduziu os efeitos nocivos da perda do cromossomo1 Y – embora seja muito cedo para concluir que a mesma abordagem beneficiaria homens que estão perdendo seus cromossomos5 Y, diz Forsberg. Ele é co-fundador de uma empresa de biotecnologia chamada Cray Innovation, que está desenvolvendo um exame de sangue6 para dizer às pessoas se elas têm perda do cromossomo1 Y em suas células2 imunológicas.

“Esta é a melhor evidência que vi de um efeito direto da perda do cromossomo1 Y em um processo fisiológico”, diz John Perry, da Universidade de Cambridge.

Em 2019, Perry e seus colegas publicaram um trabalho sugerindo que uma propensão à perda do cromossomo1 Y é causada por muitas variantes genéticas que aumentam a probabilidade de erros de DNA durante a divisão celular, o que pode ser o motivo pelo qual a perda do cromossomo1 Y está ligada ao câncer10.

A equipe de Forsberg planeja investigar se as pessoas nascidas com cromossomos5 XYY experimentam efeitos diferentes se perderem um de seus cromossomos5 Y.

No artigo publicado, os pesquisadores descrevem como a perda hematopoiética do cromossomo1 Y leva à fibrose17 cardíaca e mortalidade18 por insuficiência cardíaca15.

A perda de mosaico do cromossomo1 Y (mLOY) hematopoiética está associada ao aumento do risco de mortalidade18 e doenças relacionadas à idade em homens, mas as relações causais e mecanicistas ainda não foram estabelecidas.

Neste estudo, mostrou-se que camundongos machos reconstituídos com células da medula óssea19 sem o cromossomo1 Y apresentam mortalidade18 aumentada e patologias profibróticas relacionadas à idade, incluindo função cardíaca reduzida.

Macrófagos20 cardíacos sem o cromossomo1 Y exibiram polarização em direção a um fenótipo21 mais fibrótico, e o tratamento com um anticorpo16 neutralizante do fator de crescimento transformante β1 melhorou a disfunção cardíaca em camundongos com mLOY.

Um estudo prospectivo22 em humanos revelou que a mLOY no sangue6 está associada a um risco aumentado de doença cardiovascular e mortalidade18 associada à insuficiência cardíaca15.

Juntos, esses resultados indicam que a perda de mosaico do cromossomo1 Y hematopoiética contribui causalmente para fibrose17, disfunção cardíaca e mortalidade18 em homens.

Veja também sobre "Insuficiência cardíaca congestiva23" e "Conhecendo o sistema imunológico9".

 

Fontes:
Science, Vol. 377, Nº 6603, em 14 de julho de 2022.
New Scientist, notícia publicada em 14 de julho de 2022.

 

NEWS.MED.BR, 2022. O risco de insuficiência cardíaca em homens pode aumentar com a idade devido à perda do cromossomo Y. Disponível em: <https://www.news.med.br/p/medical-journal/1420940/o-risco-de-insuficiencia-cardiaca-em-homens-pode-aumentar-com-a-idade-devido-a-perda-do-cromossomo-y.htm>. Acesso em: 29 mar. 2024.

Complementos

1 Cromossomo: Cromossomos (Kroma=cor, soma=corpo) são filamentos espiralados de cromatina, existente no suco nuclear de todas as células, composto por DNA e proteínas, sendo observável à microscopia de luz durante a divisão celular.
2 Células: Unidades (ou subunidades) funcionais e estruturais fundamentais dos organismos vivos. São compostas de CITOPLASMA (com várias ORGANELAS) e limitadas por uma MEMBRANA CELULAR.
3 Saúde: 1. Estado de equilíbrio dinâmico entre o organismo e o seu ambiente, o qual mantém as características estruturais e funcionais do organismo dentro dos limites normais para sua forma de vida e para a sua fase do ciclo vital. 2. Estado de boa disposição física e psíquica; bem-estar. 3. Brinde, saudação que se faz bebendo à saúde de alguém. 4. Força física; robustez, vigor, energia.
4 Coração: Órgão muscular, oco, que mantém a circulação sangüínea.
5 Cromossomos: Cromossomos (Kroma=cor, soma=corpo) são filamentos espiralados de cromatina, existente no suco nuclear de todas as células, composto por DNA e proteínas, sendo observável à microscopia de luz durante a divisão celular.
6 Sangue: O sangue é uma substância líquida que circula pelas artérias e veias do organismo. Em um adulto sadio, cerca de 45% do volume de seu sangue é composto por células (a maioria glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). O sangue é vermelho brilhante, quando oxigenado nos pulmões (nos alvéolos pulmonares). Ele adquire uma tonalidade mais azulada, quando perde seu oxigênio, através das veias e dos pequenos vasos denominados capilares.
7 Esperma: Esperma ou sêmen. Líquido denso, gelatinoso, branco acinzentado e opaco, que contém espermatozoides e que serve para conduzi-los até o óvulo. O esperma é o líquido da ejaculação. Ele é composto de plasma seminal e espermatozoides. Este plasma contém nutrientes que alimentam e protegem os espermatozoides.
8 Células-tronco: São células primárias encontradas em todos os organismos multicelulares que retêm a habilidade de se renovar por meio da divisão celular mitótica e podem se diferenciar em uma vasta gama de tipos de células especializadas.
9 Sistema imunológico: Sistema de defesa do organismo contra infecções e outros ataques de micro-organismos que enfraquecem o nosso corpo.
10 Câncer: Crescimento anormal de um tecido celular capaz de invadir outros órgãos localmente ou à distância (metástases).
11 Doença de Alzheimer: É uma doença progressiva, de causa e tratamentos ainda desconhecidos que acomete preferencialmente as pessoas idosas. É uma forma de demência. No início há pequenos esquecimentos, vistos pelos familiares como parte do processo normal de envelhecimento, que se vão agravando gradualmente. Os pacientes tornam-se confusos e por vezes agressivos, passando a apresentar alterações da personalidade, com distúrbios de conduta e acabam por não reconhecer os próprios familiares e até a si mesmos quando colocados frente a um espelho. Tornam-se cada vez mais dependentes de terceiros, iniciam-se as dificuldades de locomoção, a comunicação inviabiliza-se e passam a necessitar de cuidados e supervisão integral, até mesmo para as atividades elementares como alimentação, higiene, vestuário, etc..
12 Doenças cardiovasculares: Doença do coração e vasos sangüíneos (artérias, veias e capilares).
13 Cicatrizes: Formação de um novo tecido durante o processo de cicatrização de um ferimento.
14 Músculo Cardíaco: Tecido muscular do CORAÇÃO. Composto de células musculares estriadas e involuntárias (MIÓCITOS CARDÍACOS) conectadas, que formam a bomba contrátil geradora do fluxo sangüíneo.
15 Insuficiência Cardíaca: É uma condição na qual a quantidade de sangue bombeada pelo coração a cada minuto (débito cardíaco) é insuficiente para suprir as demandas normais de oxigênio e de nutrientes do organismo. Refere-se à diminuição da capacidade do coração suportar a carga de trabalho.
16 Anticorpo: Proteína circulante liberada pelos linfócitos em reação à presença no organismo de uma substância estranha (antígeno).
17 Fibrose: 1. Aumento das fibras de um tecido. 2. Formação ou desenvolvimento de tecido conjuntivo em determinado órgão ou tecido como parte de um processo de cicatrização ou de degenerescência fibroide.
18 Mortalidade: A taxa de mortalidade ou coeficiente de mortalidade é um dado demográfico do número de óbitos, geralmente para cada mil habitantes em uma dada região, em um determinado período de tempo.
19 Células da Medula Óssea: Células contidas na medula óssea, incluindo células adiposas (ver ADIPÓCITOS), CÉLULAS ESTROMAIS, MEGACARIÓCITOS e os precurssores imediatos da maioria das células sangüíneas.
20 Macrófagos: É uma célula grande, derivada do monócito do sangue. Ela tem a função de englobar e destruir, por fagocitose, corpos estranhos e volumosos.
21 Fenótipo: Características apresentadas por um indivíduo sejam elas morfológicas, fisiológicas ou comportamentais. Também fazem parte do fenótipo as características microscópicas e de natureza bioquímica, que necessitam de testes especiais para a sua identificação, como, por exemplo, o tipo sanguíneo do indivíduo.
22 Prospectivo: 1. Relativo ao futuro. 2. Suposto, possível; esperado. 3. Relativo à preparação e/ou à previsão do futuro quanto à economia, à tecnologia, ao plano social etc. 4. Em geologia, é relativo à prospecção.
23 Insuficiência Cardíaca Congestiva: É uma incapacidade do coração para efetuar as suas funções de forma adequada como conseqüência de enfermidades do próprio coração ou de outros órgãos. O músculo cardíaco vai diminuindo sua força para bombear o sangue para todo o organismo.
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