JAMA: exposição a betabloqueadores na gravidez e o risco de anomalias cardíacas fetais
Os β-bloqueadores são a classe de medicamentos mais comumente utilizada no tratamento de doenças cardíacas em mulheres grávidas. Apesar do uso comum desta classe de medicação, os dados que suportam a sua segurança são limitados. Os β-bloqueadores atravessam a placenta e potencialmente podem causar alterações fisiológicas1 no feto2. A exposição ao β-bloqueador demonstrou causar bradicardia3 e hipoglicemia4 no recém-nascido. Uma metanálise recente relatou associação entre a exposição ao β-bloqueador e defeitos cardiovasculares fetais congênitos5, suscitando uma preocupação quanto aos potenciais efeitos teratogênicos6. Este estudo, publicado online pelo JAMA Internal of Medicine, examina o risco de malformações7 cardíacas fetais em associação com a exposição materna aos β-bloqueadores.
Este é um estudo de coorte8 populacional retrospectivo9 que incluiu nascimentos da região do Kaiser Permanente Southern California (KPSC), entre 1º de janeiro de 2003 e 31 de dezembro de 2014. Apenas gestações de feto2 único foram incluídas. As grávidas expostas a β-bloqueadores durante a gravidez10 foram identificadas utilizando dados de dispensação de medicamentos. As comorbidades11 maternas e as anomalias congênitas12 fetais foram identificadas através da busca de registros médicos eletrônicos usando os códigos CID-9-CM. O peso fetal ao nascimento foi obtido a partir de certificados de nascimento da Califórnia. Análises de regressão logística foram utilizadas para estimar odds ratios (ORs) com intervalos de confiança (ICs) de 95%. Modelos de regressão logística multivariada foram construídos incluindo fatores que foram mostrados em outros estudos por afetarem as anomalias congênitas12 fetais.
O protocolo de pesquisa utilizado neste estudo foi revisto e aprovado pelo conselho de revisão institucional do Kaiser Permanente.
A necessidade de consentimento informado por escrito foi dispensada devido à natureza retrospectiva do estudo.
Em uma coorte13 de 379.238 gestações, 4.847 (1,3%) foram expostas aos β-bloqueadores. Dentre este grupo, 2.628 (0,7%) foram expostas a β-bloqueadores durante o primeiro trimestre da gestação.
Os 4 betabloqueadores mais comumente prescritos foram labetalol (n=3.357), atenolol (n=638), propranolol (n=489) e metoprolol (n=324). As mulheres expostas a β-bloqueadores eram mais velhas e apresentavam maiores índices de massa corporal. Os diagnósticos de hipertensão14, pré-eclâmpsia15, eclâmpsia16, hiperlipidemia17, diabetes18, insuficiência cardíaca19 e história de arritmia20 foram mais comuns entre as pacientes expostas a β-bloqueadores. A idade gestacional no parto foi menor no grupo exposto a β-bloqueador (média de [DP] semanas, grupo β-bloqueador 37,4 [3,0] vs 38,9 [1,9] no grupo não exposto).
Nas análises não ajustadas, a exposição ao β-bloqueador materno foi associada a probabilidades significativamente aumentadas de anomalias cardíacas congênitas12 fetais. No entanto, após ajuste para idade materna, índice de massa corporal21 materno e comorbidades11 maternas, não houve mais associação entre a exposição ao β-bloqueador e anomalias cardíacas congênitas12 fetais. Esses resultados sugerem que as associações vistas na análise não ajustada e em outros estudos foram causadas por fatores de confusão ao invés de por efeitos conferidos pela própria exposição ao β-bloqueador.
Uma limitação do estudo é que a exposição aos β-bloqueadores foi baseada na informação de dispensação de medicamentos e não foi possível determinar se as grávidas tomaram realmente a medicação (ou seja, erros de classificação devido ao não cumprimento). Por outro lado, uma vez que a dispensação de medicamentos foi a informação utilizada, houve possibilidade de evitar qualquer lembrança de viés que possa estar associada com estudos utilizando inquéritos para determinar a exposição à medicação.
Embora estes resultados não descartem definitivamente a possibilidade de defeitos congênitos22 fetais em associação com ao uso de β-bloqueadores, eles proporcionam tranquilidade quanto ao uso desta classe de medicação para o tratamento de condições cardíacas em grávidas.
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Fonte: JAMA Internal Medicine, publicação online, de 17 de abril de 2017